Aprovado no Senado Federal na última quarta-feira, 24, o novo marco legal do saneamento básico no Brasil, que teve como relator o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), abre um leque de possibilidades para a captação de investimentos no Ceará, principalmente na construção civil. Com empresas privadas podendo atuar no setor e a carência estrutural de diversos municípios, incluindo Fortaleza, a tendência é de que um grande aporte de recursos chegue ao Estado nos próximos anos, movimentando a economia local no pós-crise.
Segundo o Governo Federal, a estimativa é de que cerca de R$ 700 bilhões sejam investidos em todo o País até 2033, ano em que os contratos de saneamento devem cumprir metas de cobertura de 99% para o fornecimento de água potável e 90% para coleta e tratamento de esgoto. Boa parte desses recursos devem ser destinado à construção civil, conforme explica o vice-presidente da área de Obras Públicas do Sinduscon-CE, Augusto Souza.
“A expectativa é de que o novo marco gere em torno de R$ 80 bilhões de investimento por ano, no Brasil. No saneamento, o custo com a construção civil representa entre 30% e 40% do investimento total. Assim, teremos entre R$ 24 e R$ 32 bilhões por ano para o segmento. Um volume bem expressivo”, afirma Augusto.
Segundo ele, a chegada de parte desses recursos ao Ceará fará com que o mercado local volte a aquecer ainda mais rapidamente, até porque a valorização imobiliária gerada pelas obras de saneamento deve atrair clientes investidores. “Toda infraestrutura criada próxima de um empreendimento agrega valor ao projeto. Não é diferente com a rede de distribuição de água tratada e o esgotamento sanitário. São fatores que valorizam o empreendimento”, completa.
Opinião: Saneamento básico e investimentos privados no Ceará
Conforme estimativa da XP Investimentos, o Nordeste deve ser a segunda região do País que mais receberá investimentos em saneamento ao longo dos próximos anos, com a estimativa de R$ 97 bilhões, atrás apenas do Sudeste, que contará com R$ 158 bilhões. Atualmente, 74,2% da população nordestina possui acesso ao abastecimento de água tratada, enquanto apenas 28% contam com coleta de esgoto, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR).
Carência e oportunidade
De acordo com os dados mais recentes da Agência Reguladora do Estado do Ceará (Arce), em Fortaleza apenas 77,3% da população é atendida com água tratada, enquanto menos da metade (49,9%) conta com o esgotamento sanitário. Em outras grandes cidades da Região Metropolitana e do Interior, a situação não é diferente. Em Caucaia, segundo município mais populoso do Ceará, somente 31,8% da população possui acesso ao esgotamento sanitário, enquanto que em Juazeiro do Norte, na região do Cariri, esse percentual não chega nem em 24%.
“Existe muita coisa para se fazer. No Eusébio, temos apenas 8% de esgotamento sanitário; Pacajus, 2,8%. Tem muita coisa pra ser feita no Ceará”, reitera Augusto Souza. Segundo o vice-presidente do Sinduscon-CE, a falta da infraestrutura de saneamento impede a própria expansão da construção civil em determinadas áreas do Estado, o que pode ser revertido com a chegada de investimentos. “Nós temos que criar a infraestrutura dentro do local para tratar esse esgoto. Isso representa custo que onera a obra e, em alguns casos, inviabiliza o projeto”, diz.
Para Lauro Chaves Neto, consultor, professor da Uece e conselheiro federal de Economia, essa carência de infraestrutura sanitária registrada no Ceará, de um modo geral, gera a necessidade de que o setor privado atue com investimentos para garantir o desenvolvimento regional. Segundo ele, a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) e os grandes centros urbanos do Interior, como o de Sobral e do “Crajubar” (Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha), devem atrair investidores por conta da grande população e necessidade de aperfeiçoamento da rede local.
“Para a universalização do saneamento básico acontecer, é preciso um nível de investimento pesado e, para os próximos anos, a perspectiva de aporte público é pequena, já que os esforços para reduzir os impactos da crise estão exigindo muitos recursos do Governo. Assim, é necessário atrair investimentos privados”, diz Lauro.
Relator do Projeto de Lei 4.162/2019, que estabelece o novo marco do saneamento, o senador cearense Tasso Jereissati também reforçou que “a União, os Estados e Municípios não têm recursos suficientes para cobrir a necessidade de saneamento dos municípios e estados mais pobres do País”.
Para Lauro, o novo marco legal do saneamento também pode ser um aliado importante para o combate ao desemprego no Brasil e no Ceará, uma vez que, com um reaquecimento da construção civil e possíveis obras de infraestrutura, a tendência é de que o ritmo de contratações também avance. “O saneamento exige grandes canteiros e a construção é um setor altamente intensivo na mão de obra. Acredito que este marco, além de contribuir para a saúde, vai aquecer a geração de emprego e renda, tão necessária neste momento”, comenta.
Principais pontos do novo marco
. Fim de novos Contratos de Programa, que só podem ser celebrados entre entidades estatais
. Determinação de que os contratos em vigor sejam mantidos até março de 2022
. Contratos entre cidades e empresas de água e esgoto vão passar a ser de concessão, com abertura de licitação envolvendo empresas públicas e privadas
. Contratos devem cumprir metas até o final de 2033, com cobertura de 99% para o fornecimento de água potável e 90% para coleta e tratamento de esgoto
. Prorrogação dos prazos da política nacional de resíduos sólidos. O fim dos “lixões” deve ocorrer em 2021, para capitais e regiões metropolitanas, e 2024, para municípios com até 50 mil habitantes
. Caso uma empresa de saneamento estatal seja privatizada, não é necessário o consentimento dos municípios titulares