Ganhos de produtividade expressivos que, em alguns casos, podem chegar a surpreendentes 400% acima dos rendimentos obtidos em campo aberto. Ao mesmo tempo, níveis de qualidade do produto que saltam aos olhos após a colheita. Estes são apenas alguns dos benefícios alcançados com o cultivo protegido. Técnica por meio da qual a atividade agrícola é desenvolvida sob estruturas de proteção, mediante o uso de tecnologias como estufas, telas ou túneis plásticos, e que vem ganhando terreno no Ceará.
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As expectativas do setor diante das oportunidades e de mais investimentos possíveis serem gerados para o agronegócio são altas. A exemplo disso, o Estado conta com a implementação de um Centro de Tecnologia em Cultivo Protegido no Ceará, localizado no Cariri. O início da operação está previsto para o primeiro semestre de 2021. A iniciativa é do Governo do Estado, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho (Sedet).
“Acreditamos que com este Centro, gerando tecnologias adaptadas à região, difundindo-as aos produtores locais, teremos como resultado um aumento do valor bruto da produção agrícola e a melhoria da qualidade dos empregos no setor rural com a utilização sustentável de solo, água e energia”
Sílvio Carlos Ribeiro, secretário executivo do Agronegócio da Sedet
Ainda de acordo com ele, embora sediado no Cariri, o equipamento pretende propiciar novas tecnologias e estímulo a produtores em todo o Estado. “A começar pela região da Ibiapaba, que já possui empresas e estrutura adequada para o cultivo protegido, mas com grande potencial de ampliação”, afirma.
Para o engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Agroindústria Tropical, Fábio Miranda, qualquer cultura pode ser plantada em ambiente protegido, assim como o cultivo protegido permite ampliar o que se pode produzir em qualquer região.
“Por exemplo, é possível produzir durante o ano todo em regiões onde as baixas temperaturas ou a ocorrência de chuvas são impedimentos para a produção de algumas culturas em determinadas estações do ano. Também é possível produzir bem em locais onde as incidências de determinadas pragas ou doenças são impeditivas para o cultivo em campo aberto de determinadas culturas”
Fábio Miranda, engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Agroindústria Tropical
Atualmente, flores, plantas ornamentais, frutas e hortaliças hidropônicas são algumas das culturas que utilizam o cultivo protegido em solo cearense. “Principalmente nas regiões das serras. Para se ter uma ideia, na Serra da Ibiapaba, muitos produtores de tomate e pimentão utilizam telados para proteger as culturas de algumas pragas, reduzindo o uso de pesticidas. Também há vários produtores de mudas de hortaliças, melão e melancia, cuja produção é feita em estufas”, aponta o pesquisador da Embrapa.
Não é à toa que a chegada de um Centro de Tecnologia em Cultivo Protegido, visando a pesquisa e o avanço da prática no Estado, seja bem recebida pelos produtores. “Iniciativas como estas serão sempre importantes para nosso Estado. Mas o governo deve elaborar um projeto minucioso e levar em consideração a capacitação dos usuários para otimizar o máximo desta tecnologia. Assim poderemos nos destacar cada vez mais no cenário nacional”, afirma Paulo Selbach, diretor de Produção da Itaueira Agropecuária, localizada na Zona Rural de São Benedito, na Serra da Ibiapaba.
A Itaueira é uma das empresas cearenses que já vem apostando no cultivo protegido como alternativa para o agronegócio no Ceará, com destaque para a produção de pimentões coloridos em estufa.
Ganhos para o setor
De acordo com Fábio Miranda, da Embrapa, os produtos colhidos geralmente apresentam melhores aspecto e qualidade pós-colheita em virtude do controle sobre as condições do ambiente (temperatura, umidade do ar, vento) e do próprio cultivo (irrigação, nutrição, controle de pragas e doenças). Ganhos que, certamente, apontam os especialistas, refletem-se na competividade dos produtos do agronegócio cearense e na abertura de novos mercados tanto no cenário doméstico como internacional.
“A produtividade geralmente é bem maior, podendo, em alguns casos, chegar a ser 400% acima dos rendimentos obtidos em campo aberto”, ressalta Miranda. Ele ainda destaca que o Ceará apresenta excelente potencial para a adoção do cultivo protegido, a exemplo de várias regiões no mundo. “O Estado possui instalada uma indústria de estruturas de ambiente protegido (estufas e telados) em seu parque industrial”, pontua.
Ao mesmo tempo, Miranda chama a atenção para as oportunidades que a tecnologia abre para o desenvolvimento e produção de culturas com alto poder de geração de emprego e renda, como é o caso da floricultura e da horticultura, que passam pela utilização do cultivo protegido. “Esses cultivos permitem maximizar, ainda, a eficiência do uso da água, em termos do retorno econômico e geração de empregos por metro cúbico de água utilizada na irrigação, o que é importantíssimo para um estado com limitações hídricas como é o Ceará”, afirma.
Pode-se ainda medir a eficiência ou não de se produzir em ambiente protegido pelo nível de tecnologia empregada.
“Qualquer produto pode ser cultivado de forma protegida, de acordo com a sua necessidade e nível tecnológico, pois as estufas podem ser simplesmente uma ferramenta de baixa tecnologia ou ter dispositivos que vão desde a abertura zenital automática até o controle de clima interno”, fala. “Os maiores ganhos vêm da produtividade, controle fitossanitário, uso e reuso dos recursos hídricos, entre outros fatores”, acrescenta.
Paulo Selbach, diretor de Produção da Itaueira Agropecuária
Do Cariri para todo o Ceará
Assim como a Ibiapaba, que já possui tradição do cultivo em ambiente protegido, a região do Cariri é vista pelo Governo do Ceará com grande potencial para a atividade, razão pela qual foi escolhida para a implementação de um Centro de Tecnologia em Cultivo Protegido, assim como a sua difusão para todo o Estado.
De acordo com o secretário executivo do Agronegócio da Sedet, Sílvio Carlos Ribeiro, as culturas participantes do projeto ainda serão definidas com o início do equipamento, que prevê parcerias com instituições da Holanda, Israel, Espanha e México.
No que se refere à Holanda, ele e demais representantes do Ceará estiveram, no fim de 2019, na Universidade de Wageningen, que possui um centro de pesquisa que trabalha o cultivo em ambiente protegido adaptando as tecnologias para diversos países como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e outros. “Encontrando condições totalmente adversas à produção de alimentos e com muita inovação, estes países vêm obtendo bons resultados transformando a agricultura local”, fala.
Ainda em 2019, recorda Ribeiro, o Ceará recebeu a visita de técnicos da Espanha, da região de Almería, que possui a maior área de cultivos protegidos da Europa. “Resumindo, diversos contatos já foram feitos e estamos definindo as ações e as melhores opções. A Sedet será a responsável e terá uma equipe específica para tratar desse projeto. Além da agricultura, o centro também trabalhará a aquicultura em ambiente protegido, com a tilapicultura e a carcinicultura. É uma agricultura moderna e é isso que buscamos para o Estado do Ceará”, conta.
Conforme disse, o Centro de Tecnologia em Cultivo Protegido do Cariri deverá ter espaço para empresas demonstrarem suas tecnologias por meio de um showroom de produtos e processos. “Os agricultores poderão participar de capacitações, treinamentos, conhecer novas tecnologias e novos produtos em dias de campo ao produtor e ter o suporte por meio de assessoramento e consultorias de técnicos deste centro”, adianta.
Cultivo protegido no mundo
“A primeira estufa que se tem notícia vem do século XIX, na Inglaterra, onde os lordes construíram um exemplar de vidro para produzir produtos tropicais para seu consumo no período de inverno”, relata o produtor Paulo Selbach. E industrialmente, a primeira estufa veio a público por volta de 1930, nos Estados Unidos, para a produção de hortaliças a nível comercial. “Logo depois os holandeses começaram a adotar as estufas também de vidro para produzir comercialmente legumes e vegetais”, fala.
Traçando um panorama do que acontece hoje no mundo, destaca Selbach, “a China tem em torno de 190 mil hectares em cultura protegida, enquanto a Espanha tem 100 mil, a Holanda 70 mil e a Turquia 50 mil. No Brasil pressupõe-se cerca de 20 mil hectares de estufas de baixa tecnologia”.
Segundo o engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Agroindústria Tropical, Fábio Miranda, o cultivo protegido torna-se mais desenvolvido em regiões de clima frio (Europa, América do Norte, Ásia e Oriente Médio), principalmente por permitir o cultivo de hortaliças nos meses de inverno e de produtos de alta qualidade. “Um exemplo impressionante do uso massivo do cultivo protegido de hortaliças é a região de Almeria na Espanha, onde são cultivados mais de 20.000 hectares em estufas, que abastecem o mercado europeu com tomate, pimentão, pepino, entre outros produtos, principalmente nos meses de inverno”, afirma.
De acordo com ele, o maior destaque no Brasil ainda é o uso do cultivo protegido nas regiões Sul e Sudeste. “Um exemplo de sucesso econômico do cultivo protegido no nosso país é a produção de flores e plantas ornamentais na região de Holambra, em São Paulo”, diz.