Se há alguns anos alguém falasse em estudar pelo smartphone – e até mesmo por WhatsApp, como já vem acontecendo – certamente causaria estranheza. Porém, a tecnologia avança a passos muito largos. É um caminho sem volta. Utilizá-la para ampliar o acesso, melhorar a qualidade e agregar valor a qualquer setor é algo fundamental e, […]

Edtechs: o que são e como estão transformando a educação

Por: Anchieta Dantas Jr. | Em:
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Se há alguns anos alguém falasse em estudar pelo smartphone – e até mesmo por WhatsApp, como já vem acontecendo – certamente causaria estranheza. Porém, a tecnologia avança a passos muito largos. É um caminho sem volta. Utilizá-la para ampliar o acesso, melhorar a qualidade e agregar valor a qualquer setor é algo fundamental e, mais do que nunca, necessário. Na educação não teria como ser diferente. O Brasil possui diversas dificuldades na área e várias oportunidades. Nesse cenário, as novas formas de ensino promovidas pelas edtechs, startups voltadas para desenvolver soluções inovadoras no setor educacional, têm tido grande impacto.


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Segundo o Mapeamento Edtech 2020, investigação sobre as startups de tecnologia educacional no Brasil, conduzido pela Associação Brasileira de Startups (ABStartups), esse mercado segue em franco crescimento. Temos, hoje, 449 edtechs ativas no Brasil – 70,6% delas oferecendo soluções para o ensino básico (infantil, fundamental e médio). O Ceará, de acordo com o mesmo levantamento, detém 2,2% das edtechs nacionais, o segundo maior índice do Nordeste, só perdendo para Pernambuco (3,1%). Além do que, está entre os dez maiores estados brasileiros desenvolvedores de soluções tecnológicas para a educação, na nona colocação.

Número de edtechs ativas no Brasil

“As edtechs reinventam processos educacionais e trazem a transformação digital ao aprendizado”, destaca Strauss Nassar sócio e mentor da Cordel Ventures, investidora cearense de startups. De acordo com ele, as edtechs representam a maior fatia dentre todos os segmentos de startups no país, com 8,39% dos negócios.

“Existem diversas possibilidades e grandes mercados com escalabilidade entre as soluções de edtechs. Por exemplo: produção de conteúdo, coleta de dados, gestão de informações, realidade virtual e aumentada, simulados, avaliações, entre outras categorias. Além disso, esse mercado cresce exponencialmente. De acordo com o relatório EdTechXGlobal, representou até 2020 um faturamento de US$ 252 bilhões no mundo todo”

Strauss Nassar, sócio e mentor da Cordel Ventures

Mas afinal, por qual razão há tanto interesse e, consequentemente, investimento no setor? Para Mário Alves, do Rapadura Valley, ecossistema cearense de startups, e consultor da Indigital.lab, consultoria em transformação digital, “o setor educacional é tido como uma das bases necessárias para o desenvolvimento da sociedade e agora está sendo visado por ter ficado muitos anos ‘intocado’ da adoção de novas tecnologias”.

“As startups que estão entrando no setor agora ainda possuem altíssimo potencial de crescimento, especialmente as que conseguirem aliar larga escala e preço baixo. É um dos setores mais fortes, acompanhado do setor de saúde”

Mário Alves, sócio e consultor da Indigital.lab

“Não vamos mais conseguir nos desprender do ensino digital. Mesmo com a volta às aulas presenciais, passada a pandemia, deveremos ter um formato híbrido de ensino. A interação com o conteúdo digital vai ser essencial. Por meio das soluções proporcionadas pelas edtechs, os alunos conseguem aprender mais rápido, avançar e se aprofundar no conteúdo como nunca visto”

Matheus Leitão, um dos diretores do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Ceará (Sinepe Ceará).

O impacto da tecnologia sobre a educação é tanto, que não é à toa que o setor público também esteja de olhos bem abertos para essa nova realidade.

“O Governo do Ceará vem cada vez mais olhando para o uso dessas tecnologias de forma que se apliquem na educação básica, no ensino profissional ou superior. Cada vez mais, vem traçando estratégias para tornar as escolas e universidades ambientes mais conectados, com mais acesso físico e tecnológico, como também investindo em gestores e professores mais preparados para esse mundo digital e todos os benefícios que são proporcionados. E isso se faz necessário para que se possa cada vez mais incorporar os benefícios trazidos pelas edtechs”

Gabriella Purcaru, coordenadora de empreendedorismo e inovação da Secretaria da Ciência, Tecnologia e Educação Superior do Ceará (Secitece)

Na sua avaliação, a pandemia da Covid-19 só potencializou o crescimento das edtechs, diminuindo barreiras e quebrando paradigmas. “A inserção da tecnologia como meio de facilitar o aprendizado não só aumenta o alcance como a qualidade do ensino trazendo impactos positivos para melhoria da educação como: processos mais interativos e lúdicos, que aumentam o interesse do estudante, a exemplo da gamificação”, fala.

No entanto, pontua Mário Alves, do Rapadura Valley, o impacto positivo sobre o setor educacional deverá ser sentido mais no médio e longo prazo. “Iniciativas digitais nessa área vieram para ficar e as novas gerações tendem a ser mais digitalizadas, demandando também que a educação acompanhe esse passo. Isso já está diferenciando as escolas e vai seguir sendo um ponto importante no futuro próximo”, afirma.

Conforme disse, a educação tem presença transversal na sociedade e deve seguir evoluindo. “Nos últimos anos já vemos o crescimento na oferta de Ensino a Distância (EAD) e deveremos ver esse mesmo movimento para tecnologias como realidade virtual e realidade aumentada, com oferta de gráficos e materiais digitais de melhor qualidade”, emenda.

Potencial do Estado

Segundo Gabriella Purcaru, da Secitece, o Ceará vem crescendo e demostrando seu potencial no ecossistema empreendedor. “Em 2019 foi reconhecido pela ABStartups como comunidade revelação e teve o reconhecimento da Agenda Edu, uma startup do setor de Educação, como a startup do ano. Em 2020, recebeu o prêmio de comunidade do ano, demostrando que cada vez mais o Estado vem investindo em um ambiente preparado para inovar”, afirma.

Nesse sentido, ela destaca a rede de escolas profissionalizantes para jovens a partir do 1º ao 3º ano do ensino médio. “Também está sendo articulada uma parceria entre a Secitece e a Seduc (Secretaria de Educação do Ceará) para que esses jovens participem de uma jornada de conhecimento que os prepare para montar seu próprio negócio”, fala. Outra iniciativa que fomenta o crescimento das edtechs no Ceará, acrescenta Gabriella, são os Corredores Digitais, um programa de inovação voltado para o desenvolvimento de empresas, produtos e negócios em áreas estratégicas da economia do Estado. “E a educação é uma delas”.

“O programa apoia em conhecimento científico, tecnológico e de mercado, atendendo a projetos inovadores em diferentes fases, de ideação à tração, da pesquisa ao go to market e expansão de mercado. Além disso, oferece acesso a diversos benefícios, sejam eles benefícios de empresas parceiras, mentorias de profissionais consolidados ou contatos com grandes empresas, em um ambiente que promove conexões e impulsiona o ecossistema”

Gabriella Purcaru, coordenadora de empreendedorismo e inovação da Secitece

Ainda de acordo com a coordenadora de empreendedorismo e inovação da Secitece, também merece destaque o projeto Cientista Chefe, conduzido pela Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap). “Sua proposta é unir o meio acadêmico e a gestão pública para identificar soluções de ciência, tecnologia e inovação que possam ser implantadas para melhorar os serviços e, assim, dar mais qualidade de vida para a população, e uma das áreas prioritárias é a educação”, revela.

Como resultado de todos esses esforços, hoje, o Ceará tem quase duas dezenas de edtechs mapeadas pela Secitece. Empresas que, segundo Strauss Nassar, da Cordel Ventures, são destaque no Brasil e no mundo. “A Arco Educação, por exemplo, oferece conteúdo, tecnologia e serviços. É uma empresa com capital aberto na Bolsa de Nova York, a Nasdaq, avaliada em US$ 2,3 bilhões. Recentemente, outra grande startup cearense do segmento, a Agenda Edu, foi adquirida pela Eleva, companhia avaliada em mais de US$ 4 bilhões. Esta solução que conecta pais de alunos à jornada escolar dos filhos é uma das edtechs mais bem sucedidas do Brasil”, comemora.

E as possibilidades são as mais diversas, destaca Mário Alves, do Rapadura Valley. “Dentre elas podemos citar plataformas focadas em vídeo, como a Desenrolado, e outras focadas na metodologia, como a Eduqhub e a School King”, exemplifica. Na prática, explica o consultor, as edtechs desenvolvem aplicativo próprio ou entregam uma interface de programação de aplicações (API) que integra as suas soluções ao sistema existente na escola. Soluções “made in Ceará”. Ao lado das já consagradas Arco Educação e Agenda Edu, outras edtechs que nasceram no Ceará estão ganhando o mercado nacional. Um bom exemplo é a Desenrolado, que surgiu em fevereiro de 2014 e é uma produtora de conteúdo digital educacional que trabalha com educação básica.

“Produzimos principalmente vídeo, mas também temos outros conteúdos digitais como podcasts, e-books e objetos interativos. Todas as soluções têm como foco a educação básica, em conteúdo para alunos de ensino fundamental e médio”, conta Luise Castro, diretora de operações da Desenrolado. Segundo a empreendedora, atualmente a startup trabalha com empresas voltadas para a educação em todo o Brasil. “São empresas que produzem material e precisam desse conteúdo no formato digital. Elas nos contratam e produzimos conteúdo personalizado para cada uma delas e daí elas distribuem esse conteúdo junto com o restante do seu material para os seus clientes, no caso as escolas”, explica. No portfólio de clientes da Desenrolado estão nomes de peso do setor de ensino no país como as editoras FTD, Pearson, YDUQS, Positivo, Somos, entre outras.

“Nós chegamos nesses sete anos basicamente com capital próprio, com o dinheiro dos próprios projetos. Nunca nos interessamos em atrair capital em rodadas de investimentos. Claro que no início tivemos aceleração que nos ajudou bastante com o aprendizado, mas sempre foi uma escolha muita nossa”, celebra Luise, que já conta com 60 pessoas na sua equipe. Para ela, o mercado de edtechs é bem desenvolvido e atrativo. “As grandes empresas estão olhando para o novo. Existem muitos investimentos que estão vindo dessas empresas que já são bem estabelecidas no mercado. Agora, elas começam a olhar para as startups que estão surgindo com novas soluções e começam a investir nelas também”, fala. Nesse contexto, frisa a empreendedora, o setor de edtechs no Ceará vem ganhado espaço e é destaque nacional.

“Historicamente o Estado é muito reconhecido no mercado de educação, pela qualidade dos professores, dos alunos e pelo porte das escolas. Então, quando o Ceará começou a lançar suas edtechs, o Estado já tinha um respaldo por sempre olhar para a educação com muita qualidade. Dessa forma, o que a gente vê hoje é que temos empresas que já são referência nacional”

Luise Castro, diretora de operações da Desenrolado

“Vivemos um grande momento”, avalia Marília Teófilo, fundadora da Eduqhub, outra edtech cearense que vem se destacando no mercado.

“Acreditamos demais que a educação e o empreendedorismo podem transformar vidas e é esse o nosso propósito. E com a pandemia a necessidade de novas metodologias de ensino e plataformas são de extrema necessidade. Já não é de agora que o ensino tradicional vem necessitando ser transformado para atender às demandas das novas gerações”

Marília Teófilo, fundadora da Eduqhub

Fundada em 2019, a Eduqhub é uma empresa que transforma a experiência de ensino e aprendizagem por meio da tecnologia, materiais criativos e metodologia inovadora. Na verdade, o embrião da startup foi o programa Mini Empreendedor, lançado por ela em 2018, que começou em casa, a partir de um problema real de uma mãe, que foi crescendo, amadurecendo e virou um negócio de educação empreendedora. Atualmente, a Eduqhub é uma plataforma desenvolvida em nuvem e a forma de distribuição do conteúdo é no modelo de acesso por aluno no aplicativo. De acordo com Marília, a cada fase, as crianças vivenciam uma temática e aprendem sobre diversos temas construindo projetos.

Apesar do pouco tempo, a empresa já coleciona alguns destaques. Já são 1.200 alunos no Programa Eduqhub, na fase Mini Empreendedor, ao passo que a empresa mantém parceria com grandes grupos educacionais cearenses como Farias Brito, Christus e Unifor. Segundo Marília, a expectativa é de que em 2021 a plataforma seja lançada a nível nacional, com sua expansão pelo país se consolidando já em 2022.

Desafios e oportunidades do setor

Para Nassar, da Cordel Ventures, ainda existem muitos desafios para o mercado de edtechs, “mas essa transformação é um caminho sem volta”. “As lacunas que existem hoje serão paulatinamente preenchidas e as falhas na entrega serão sanadas e teremos cada vez mais profissionais formados remotamente por meio de plataformas digitais de conteúdo”, expõe.

Ainda de acordo com ele, a personalização da educação, incluindo as soft skills (habilidades comportamentais e competências) e a sensação de estar em sala de aula ainda que remotamente serão as grandes tendências para o setor. “Há oportunidades para todos. Tanto em startups nascentes que lidam com metodologia inovadora e para startups estabelecidas que já estão expandindo para o mercado nacional”, reforça Mário Alves, do Rapadura Valley.

E trazendo para a realidade do Ceará, um grande desafio é a contratação de pessoal qualificado e a retenção de talentos frente a mercados como São Paulo e Recife, mais expressivos neste setor no Brasil. “Mas não é só ter um conteúdo digital, ele precisa ser bom, a fim de que o aluno que está em casa queira sentar-se, estudar e aprender com esse conteúdo”, pontua Luise Castro, da Desenrolado. Ao mesmo tempo que surgiram oportunidades de aliar tecnologia e educação, Luise pontua que há também o desafio de fazer com que cada vez mais as empresas de educação olhem para o digital. “Dessa forma, precisamos estar atentos para cada vez mais ter um conteúdo estratégico para o nosso cliente. As escolas precisam se ajustar e isso vai exigir que nós, desenvolvedores, preparemos novas abordagens. Esse momento é de muitas tendências no sentido de entregar o melhor para os alunos”, conclui.

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