Fortaleza completa 295 anos em meio a uma trajetória de muitas conquistas. A cidade chega a quase três séculos de existência ostentando o título de capital com a maior economia do Nordeste, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ao mesmo tempo, é a metrópole mais influente do Norte e Nordeste do Brasil, conforme a pesquisa Regiões de Influência das Cidades (REGIC) também do IBGE. Em 2020, foi reconhecida internacionalmente, na Suécia, por ações de mobilidade urbana, por meio da Iniciativa Visão Zero para Juventude, instituição liderada pelo Centro Nacional Caminhos Seguros para Escola, dos Estados Unidos, com o apoio da Fundação FIA. Porém, se há motivos para comemoração, também existe espaço para reflexão sobre os desafios e oportunidades que a cidade possui, a fim de que possa avançar cada vez mais.
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“Há muitas possibilidades de avanço, especialmente se considerarmos a Agenda 2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização Mundial das Nações Unidas (ONU) e os efeitos da pandemia pela Covid. Diria que os objetivos relacionados à saúde, trabalho decente e redução das desigualdades são essenciais para a sustentabilidade de qualquer cidade brasileira”
Gabriela Romero, especialista em sustentabilidade
Romero e mais três especialistas em suas respectivas áreas foram ouvidos pela TrendsCE com o intuito de traçar um panorama sobre Fortaleza no aniversário da cidade. Um olhar que contempla a condição não só de conhecedores das áreas em que atuam, mas também o fato de serem cidadãos e moradores da capital do Ceará.
“Fortaleza faz 295 anos em um momento em que a cidade experimenta uma trajetória de crescimento, tendo conseguido ter o maior Produto Interno Bruto (PIB) da região Nordeste em termos de cidade e com uma dinâmica muito interessante considerando que se tornou um hub de dados, sendo uma das capitais do mundo com mais fibra ótica, podendo desenvolver uma base de data center mundial. Ao mesmo tempo, se tornou um hub aéreo internacional, importante para o turismo, assim como sua Região Metropolitana tem incorporado um complexo industrial e portuário, no caso o Pecém, impulsionando a indústria e ainda o setor de comércio e serviços que faz o grande eixo econômico da capital do Ceará”, destaca o economista Lauro Chaves Neto, professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e conselheiro federal de Economia.
Ainda de acordo com ele, a cidade conta com uma vocação natural para se trabalhar e desenvolver as energias renováveis, notadamente a solar e a eólica. Assim como Fortaleza tem capacidade para ser bastante competitiva.
“Contudo, para isso, precisamos investir cada vez mais na formação do capital humano, desde o ensino fundamental ao ensino superior, passando pelo ensino técnico, formando mais mestres e doutores e desenvolvendo mais pesquisa e tecnologia. Enfim, é uma cidade que cresceu muito, porém os desafios e as expectativas para o futuro são ainda maiores”
Lauro Chaves Neto, economista e professor da Uece
No que se diz respeito a esses desafios, aponta Lauro Neto, “Fortaleza ainda conta com extrema desigualdade, pois tem bairros da periferia com qualidade de vida muito baixa, enquanto outros têm qualidade de vida quase europeia”. “Então esse quadro de desigualdade precisa ser equalizado em termos de oportunidades de educação, assistência médica e trabalho e tudo isso depende muito de políticas públicas e de incentivar o perfil empreendedor nato do cearense”, justifica.
Com o que concorda Mario Gurjão, cofundador Inova Mundo, plataforma de desenvolvimento de negócios. Para ele, é natural que, de uma forma geral, as cidades brasileiras, e aí Fortaleza não foge à regra, em consequência do próprio adensamento populacional, tragam consigo alguns problemas. “Temos questões muito relevantes em termos de concentração de riqueza, consequentemente desigualdade social, existem questões ligadas à degradação ambiental, outros desafios ligados à geração de emprego e renda e à mobilidade urbana. Temos questões também relacionadas a patrimônio e desafios na redução dos índices de violência”, acrescenta.
Quando se fala em sustentabilidade, tanto Mario Gurjão com Gabriela Romero destacam avanços importantes, principalmente no que tange à mobilidade na cidade.
“Entre esses avanços podemos falar de quando a administração municipal lançou os carros elétricos e as bicicletas compartilhadas, permitindo o deslocamento ponto a ponto. Isto foi uma contribuição importante. Porém, é algo que precisa ser contínuo, envolvendo mais a sociedade”
Mario Gurjão, CEO e cofundador da Inova Mundo
“Fortaleza teve um avanço considerável nos últimos anos em relação a reorganização de sua malha viária, não apenas para o deslocamento por transporte público ou privado, mas também para pedestres, com espaços voltados a sua permanência, como os parklets. Além disso, as ciclovias possibilitam deslocamentos mais seguros para quem precisa ou para quem prefere deixar o carro em casa. A ocupação desses espaços públicos gera senso de pertencimento, o que é essencial para o desenvolvimento da cidade”, emenda Gabriela.
Já quando o assunto é inovação, Gurjão lembra que a capital cearense possui hoje um dos ecossistemas de inovação mais pujantes do país. “Temos muitas startups e a cultura de inovação tem sido bem mais propagada nos últimos anos, tanto que a gente verifica uma série de espaços de coworking, embora, neste momento, com a pandemia, eles não possam ser utilizados”, fala. Gabriela Romero destaca ainda a transformação digital da cidade.
“O ambiente gerado através da digitalização de processos e procedimentos no âmbito na emissão de licenças e autorizações pelo município têm sido muito importantes para a atração de atividades econômicas. Para quem quer investir em Fortaleza, ter um sistema transparente e parametrizado de emissão de documentos, juntamente com amplo acesso à legislação, é um diferencial e neste aspecto Fortaleza está à frente”
Gabriela Romero, especialista em sustentabilidade
Contudo, nem tudo que está bom não quer dizer que não possa melhorar. Segundo Gurjão, muito ainda pode ser feito na agenda de inovação e sustentabilidade na cidade. “No uso correto da água, por exemplo, na questão no tratamento, dos resíduos sólidos e na intensificação do uso das fontes de energias renováveis. Dessa forma, acredito que essas são as maiores contribuições e oportunidades que enxergamos para Fortaleza fomentar uma agenda positiva, mais concreta e robusta para resolver os tantos desafios que a cidade oferece”, aponta.
Para ele, isso é positivo no sentido de que a inovação vive predominantemente de desafios. “Se não houver problemas a resolver não temos muito o que falar em inovação e a gente pode olhar para a inovação sem ser só pelo viés tecnológico ou corporativo, mas a inovação que traz ganhos coletivos”, destaca Mario Gurjão.
Dessa forma, orienta o especialista, Fortaleza pode usar a inovação para preservar o meio ambiente, intensificar o uso de energias renováveis, reduzir os níveis de violência, gerar mais emprego e renda, preservar o patrimônio histórico e cultural, reduzir a desigualdade social e, por fim, desenvolver a economia criativa.
Para o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Ceará (Sinduscon-CE), Patriolino Dias, apesar de todos seus anos de vida, Fortaleza ainda é um território em construção.
“Enxergamos no construir um caminho de transformação social, capaz de empregar milhares de trabalhadores, gerar renda, fomentar o urbanismo, impulsionar a economia e criar desenvolvimento. É justamente isso o que o setor da construção civil tem feito por Fortaleza e pelo fortalezense. Precisamos continuar trabalhando, de maneira perene e incessante, pelo resgate da construção civil como mola condutora da economia, criando empregos, gerando renda, atraindo capital estrangeiro, promovendo o desenvolvimento urbano e social”
Patriolino Dias, presidente do Sinduscon-CE
De acordo com ele, a questão da moradia tem melhorado na cidade, mas em um ritmo ainda lento, tendo em vista a baixa velocidade em que se diminui o déficit habitacional, principalmente em meio as classes menos favorecidas da cidade. Contudo, Patriolino aposta na representatividade da construção civil a fim de fortalecer a qualidade de vida e a inclusão social. “Temos a expectativa de o setor gerar dez mil empregos em 2021. Ano em que o mercado receberá o aporte dos lançamentos que já começaram a ser feitos pelas construtoras”, afirma.
Vale lembrar, emenda Dias, que dos 18,5 mil empregos com carteira assinada gerados no Ceará no ano passado, 5.997 foram registrados na construção civil. “É o que apontam os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que mostram o setor como vice-líder de geração de vagas no Estado, contribuindo diretamente para o cenário de recuperação dos empregos formais”, fala.