A adoção dos carros autônomos parece cada vez mais próxima. Nas primeiras semanas de dezembro, foram divulgadas ações que pretendem disseminar a fabricação e a utilização desses modelos. O Grupo Stellantis (que abrange marcas como Fiat, Peugeot e Jeep) anunciou uma parceria com a BMW para o desenvolvimento de tecnologias de autonomia. Por sua vez, a Uber divulgou que planeja iniciar um projeto de entregas que não demande a atuação de motoristas, em Santa Mônica, na Califórnia.
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São muitos os benefícios da adesão aos autônomos. É o que acredita o jornalista automotivo Fernando Naccari. Na publicação especializada Blog InstaCarro, ele defende que o uso dos carros autônomos pode otimizar o tempo, oferecer maior segurança e ajudar a reduzir os acidentes, já que boa parte dos imprevistos é causada por falha humana e, com a inteligência artificial, os automóveis poderiam interagir entre si e evitar danos.
No entanto, nem todos os carros autônomos podem tomar decisões sem intervenção humana. Na mesma publicação, Naccari traz os diferentes níveis de automação, de acordo com os critérios da Society of Automotive Engineers (SAE). Os níveis vão desde o 1, onde o veículo conta com elementos mais simples, como controle de velocidade e aceleração; passam pela automação parcial, onde o carro pode atuar de forma independente por determinados trechos, sem dispensar a tomada de decisão do motorista em algumas situações (níveis 2, 3 e 4); e chegam até o nível 5, onde o automóvel, que pode ser fabricado até sem pedais ou volante, está de forma integral no controle, podendo receber inclusive comandos por voz.
Infraestrutura das rodovias precisa melhorar
O automóvel e o condutor são dois de três fatores fundamentais quando se trata de mobilidade. O terceiro, igualmente importante, é a infraestrutura. “Esses três fatores devem trabalhar sempre em conjunto para que se tenha uma condução segura e eficiente, do ponto de vista de tempo de deslocamento, de consumo de combustível e de emissão de poluentes. Tudo isso deve ser pensado e beneficiado por qualquer tipo de inovação”, destaca Bruno Batista, diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte (CNT).
Segundo a 24ª edição da Pesquisa CNT de Rodovias, divulgada no início de dezembro, cerca de 62% da malha rodoviária brasileira tem problemas e é classificada como regular, ruim ou péssima, situação que afeta, de acordo com o próprio CNT, o desenvolvimento socioeconômico do país. O estudo levou em consideração características como condições do pavimento, sinalização e geometria, como as curvas presentes nas vias.
Bruno Batista acredita que a falta de modernização das rodovias brasileiras – muitas delas construídas nos anos 60 e 70 – pode ser um entrave para os carros autônomos no país. “Para identificar o limite de velocidade, um veículo autônomo precisa, por exemplo, fazer a leitura das placas, e a gente tem problemas severos de sinalização. Esses veículos costumam ser desenvolvidos na Europa, nos Estados Unidos, na Ásia, e rodam em infraestruturas que não têm os problemas que a gente tem aqui. Então é uma grande incógnita. O que vai acontecer com o veículo quando ele se deparar com um grande buraco ou com um trecho em erosão, casos comuns na malha brasileira? Esses são aspectos relacionados a problemas de infraestrutura que acabam gerando um fator complicador na adoção de veículos mais tecnológicos, sobretudo os veículos autônomos”.
Além disso, as novidades da automação devem ser regulamentadas pela legislação, como apontam os advogados e docentes Antônio Carlos Efing e Jailson Araújo, em artigo publicado pela Revista de Direito do Consumidor. “As montadoras de veículos automotores e empresas de tecnologia precisam de regras claras para atuar nesse mercado, investir e obter retorno financeiro. A sociedade quer usufruir de tecnologias que sejam úteis e confiáveis e espera-se poder desfrutar dos benefícios prometidos pelos carros autônomos, em especial, um deslocamento mais rápido, confortável e seguro, sem se sujeitar a riscos desnecessários e falhas que coloquem vidas em perigo. A regulamentação do setor deve ser precedida por audiências públicas, ser revista periodicamente e priorizar a segurança das pessoas em detrimento de qualquer outro objetivo, em especial, interesses meramente econômicos ou mercadológicos”.
Outras tecnologias já estão disponíveis
O desconhecido prazo para a disseminação do uso de carros autônomos no país não é sinônimo de ausência de tecnologia no setor automotivo. Algumas startups apostam na inteligência artificial e na análise de dados para incrementar o mercado.
“Nós fazemos uma inspeção veicular automatizada, realizando a detecção de danos externos em veículos. Ao recebermos a imagem de um veículo, é feita uma verificação completa nessa imagem para detectar possíveis danos, o tipo, a localização e a severidade do dano. Cem por cento dessa detecção é feita por inteligência artificial”, explica Paulo Moura, CEO da Eagol, sobre os serviços da startup, contratados, geralmente, por locadoras, seguradoras e frotistas.
Paulo comenta, ainda, que o período de pandemia foi aproveitado pela empresa para a melhoria da tecnologia utilizada. “Nós somos uma startup relativamente nova. Quando a gente começou, ativamente, no mercado, veio a pandemia. Nesse momento, a gente preferiu não direcionar os esforços para a captação de novos clientes, e sim dar atenção para o desenvolvimento da nossa tecnologia de precisão, identificando danos cada vez menores, por exemplo”. Ainda segundo Paulo Moura, a expectativa é de crescimento ainda maior a partir de 2022.
A tecnologia não precisa ser utilizada apenas no automóvel. O motorista, fator ainda essencial na direção, como visto, também pode ser acompanhado. É o que faz a Dersalis, startup que integra o setor automotivo e possui parceria com grandes montadoras.
“A nossa tecnologia atua de forma preditiva com objetivo de evitar situações de risco ao condutor. Nosso dispositivo vestível (uma pulseira) permite o acompanhamento do motorista em tempo real. Através dos nossos biomarcadores extraídos dos sinais vitais do operador, analisamos e trabalhamos esses dados para aumentar a saúde, a segurança e a performance do colaborador dentro da operação”, explica Betina Rezende, head de marketing da Dersalis.
“A pulseira não depende de conexão com a internet. Mesmo em locais mais inacessíveis, o sistema emite interações autônomas que orientam o colaborador a realizar atividades para evitar a chegada de um alerta crítico de fadiga, como fazer um alongamento ou até executar um teste de atenção”, continua Betina, que finaliza: “uma máquina precisa de uma manutenção preventiva para não acontecer um acidente, para não quebrar, e com o ser humano também pode ocorrer da mesma forma. Para evitar um acidente deve haver uma atuação preditiva. Assim conseguimos identificar, por exemplo, até uma predisposição para doenças cardiovasculares”.
A Eagol e a Dersalis foram duas startups selecionadas, em setembro de 2021, para um programa de desenvolvimento de soluções no setor automotivo realizado pela Mercedes-Benz, em parceria com a Liga Ventures.