Se, por um lado, os países emergentes como o Brasil podem se tornar atraentes aos investidores internacionais que fogem do risco decorrente de uma guerra, por outro também podem sofrer com problemas de elevação de custos e de abastecimento. Economistas anteveem esta possibilidade, caso o confronto se prolongue e, principalmente, se os Estados Unidos e a União Europeia impuserem sanções aos apoiadores da Rússia, o que amplificará as consequências alcançando os parceiros comerciais espalhados pelo mapa mundial.
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Para o ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega, por exemplo, a repercussão imediata será no preço do petróleo e, por decorrência, no aumento do preço dos combustíveis, notadamente no Brasil, que segue a cotação internacional. Estimativas apontam que o barril deverá chegar a US$ 120 (hoje na faixa dos US$ 100). A Rússia, convém lembrar, tem uma capacidade de produção de mais de 10 milhões de barris/dia. E mais: é a maior fornecedora de gás natural da Europa, respondendo por 40% de todo o consumo deste combustível transportado por gasodutos russos. E a Ucrânia é poderosa na produção de trigo e milho, amplamente utilizados pela indústria de proteína animal (ração).
Gildemir da Silva, professor de Economia dos Transportes e Regulação da Universidade Federal do Ceará, aponta que a perspectiva no curto prazo é de um desajuste no comércio internacional. “Mas, por enquanto, a questão é militar”, limita. Seu temor será maior na medida em que a China vier a sofrer sanções por parte dos Estados Unidos e da União Europeia por conta do apoio declarado à Rússia. Nesse caso afetará diretamente a âncora verde-amarela brasileira.
O agronegócio, protagonista em produtividade e salvador do crescimento econômico nacional nos últimos anos, poderá ter o fornecimento de fertilizante ameaçado, insumo do qual o Brasil tem uma perigosa dependência de 80 a 85%, conforme dados da ANDA – Associação Nacional para Difusão de Adubos. “A guerra já prejudica o agronegócio brasileiro”, afirmou o professor deEconomiada Universidade de São Paulo, Celso Grisi. O até agora conflito bélico já fez subir o preço do trigo, que teve alta de 10% na Bolsa de Chicago, enquanto o milho e a soja avançaram 4% nas negociações.
Diplomacia brasileira
As consequências maiores para o Brasil, na visão de Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, dependerão da posição que o Brasil tomar, agora como recente membro do Conselho das Nações Unidas, o que determinará o nível de pressão dos Estados Unidos, seu mais importante parceiro comercial. Em nota oficial, o governo brasileiro manteve a tradição de neutralidade e se declarou “engajado nas discussões multilaterais com vistas a uma solução pacífica, em linha com a tradição diplomática brasileira e na defesa de soluções orientadas pela Carta das Nações Unidas pelo Direito Internacional”.
Na análise da Federação das Indústrias do Ceará,não há dúvida de que, historicamente, os conflitos geopolíticos têm potencial para afetar a economia principalmente por meio do preço de ativos. A extensão dos prejuízos, entretanto, depende da relevância das Nações envolvidas no contexto da economia global. A vice-presidente da Câmara Setorial de Comércio Exterior e gerente do Centro Internacional de Negócios da FIEC, Karina Frota, no caso específico Ucrânia-Rússia merece atenção especial porque envolve diretamente exportadores de energia, commodities agrícolas e algumas industriais, especialmente as relacionadas à Europa.
“Sabemos que em se tratando de preços de energia, as exportações russas de petróleo e gás podem cair por conta das sanções e que as duas Nações juntas representam quase 30% das vendas mundiais externas de trigo, além do peso da Rússia nos embarques de metais industriais, o que repercutem nos custos, preços e nos mercados financeiros”, prevê Karina Frota, acreditando que o Brasil já vive um momento de instabilidade e de insegurança.