O agronegócio brasileiro, que historicamente vem salvando o desempenho da economia brasileira, deverá crescer 4% neste ano alcançando 269 milhões de toneladas de grãos, conforme dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O dilema é saber a que preço e por quanto tempo. O volume previsto é inferior ao anteriormente projetado de 291 milhões de toneladas. As incertezas quanto a crédito, custos de produção e clima fazem com que a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) não arrisque prognósticos para a próxima safra, que resultará do comportamento e enfrentamento destas três variáveis.
Tirando o clima, que foge ao controle de quem semeia e colhe, os custos de produção e a disponibilidade de crédito serão determinantes para a continuidade ou não da resiliência do agronegócio brasileiro na próxima safra. É o que se depreende da análise feita pelo diretor técnico da CNA, Bruno Lucchi, ao olhar os cenários interno e externo. Com dois anos de pandemia, os setores exportadores conseguiram equalizar mais os prejuízos com as receitas externas. Ao contrário, as cadeias com foco interno (lácteos, carnes e frutas) foram diretamente impactadas pela perda de renda dos brasileiros e pelo desenfreado aumento dos custos, comuns a todos: em um ano os glifosatos tiveram os preços aumentados em 129% e o cloreto de potássio em 129%.
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Ainda em pandemia, o mundo começou a assistir on-line a guerra entre Rússia e Ucrânia (24 de fevereiro) e com ela vieram novos e maiores aumentos. Considerando os valores praticados em 18 de fevereiro, antes da guerra, até 1º de abril, foi contabilizada uma majoração de 78% na ureia, cuja tonelada passou de 607 dólares para 1.080. No cloreto de potássio, a elevação foi de 45,3% (de 857 dólares em fevereiro para 1.245 em abril). Isto em apenas 40 dias.
Para o diretor da CNA, “algo precisa ocorrer na área do crédito rural para trazer maior fôlego ao setor”. Para agravar a situação, foram suspensas as contratações de crédito desde 05 de fevereiro, sendo retomada apenas a opção do Pronaf, programa voltado à agricultura familiar. Os demais produtores permanecem sem capital de giro para tocar a safra. A não ser que arquem com empréstimos a custos entre 13% e 19%, fora do Plano Safra, bastante acima das taxas de 3,5% a 7,5% praticadas nas linhas oficiais.
Disponibilidade de crédito
A temática do aumento de preços tem dimensão mundial. O Índice de Preços de Alimentos da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) chegou a 159 pontos, o mais alto desde 1974, por ocasião da grande crise do petróleo. “O cenário é crítico e passa, necessariamente, pela disponibilidade de crédito a custos menores”, diz Bruno Lucchi, na torcida de que seja votada, ainda neste mês, a PLN1 que libera um crédito suplementar de R$ 868 milhões destravando, ainda, em torno de R$ 20 bilhões, o que daria fôlego e alívio para o término do plano agrícola.
“Se o dinheiro para a atual safra está interrompido, mais preocupante ainda é a discussão do Plano Safra 22/23 que começa a valer a partir de julho”, afirma. Para quem acompanha a performance do agronegócio, que responde por mais de 27% do PIB brasileiro, é natural pensar que mereceria tratamento vip por ser estratégico para a segurança alimentar do País e pelo seu Valor Bruto de Produção. No Brasil, o nível de auxílio governamental sobre a riqueza gerada é de apenas 1,4%, ao passo que nos Estados Unidos, Europa e China o subsídio aplicado é de 12% a 15%.
Os 3 V’s do agro
O agronegócio vive 3 V’s: Variáveis Variando Violentamente. O trocadilho é do especialista em planejamento estratégico no agronegócio, Marcos Fava Neves.O professor de Administração da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto, diz que para traçar cenários para o desempenho e preços dos grãos é preciso acompanhar um enorme conjunto de pontos, no Brasil e fora dele, a começar pela famosa safrinha brasileira (a segunda safra), além do plantio da safra de verão e do comportamento do clima no Brasil, Paraguai e Argentina.
No plano externo, há que se considerar se a Ucrânia vai conseguir plantar em função da guerra e a expectativa de área a ser cultivada nos Estados Unidos. A tudo, acrescenta-se, ainda, a disponibilidade de fertilizantes e a sempre presente questão cambial.
A propósito, o professor Fava recomenda aos produtores que repensem as estratégias e se movimentem em direção à produção local de adubos visando a produção local ou busca de fontes adicionais. “Muitos países estão buscando alternativas”, garante ele, dizendo que por conta disto a normalização virá antes do esperado.
O planejamento estratégico setorial recomendado por Fava inclui o fortalecimento das energias renováveis como bioetanol, biodiesel e biometano para que o Brasil se credencie cada vez mais a se consolidar como plataforma produtiva sustentável liderando o fornecimento mundial de alimentos, bioenergia e agroprodutos.
“O momento é de potencializar os diferenciais e aglutinar forças”.
Marcos Fava Neves, professor de Administração da Universidade de São Paulo (USP).
A tecnologia também é citada como aliada permanente. Neste sentido, quem chegou em boa hora no mercado foi a Fertsan, que há quatro anos desenvolveu uma solução tecnológica exclusiva voltada ao aumento da produtividade. Trata-se do biomodulador fisiológico que funciona como um potencializador do fertilizante. Ao ser aplicado, cria uma camada invisível integrada por nanopartículas que liberam, de maneira equilibrada, somente os micronutrientes necessários.
“A solução disruptiva biomoduladora promete atuar forte na absorção e assimilação de cada cultura, exatamente dentro da necessidade de cada uma, gerando economia de fertilizantes e resultando em aumento de produtividade da ordem de 10%”, garante Luiz Roberto Barcelos. Para ele, o propósito da Fertasan com esta tecnologia “não é só ter uma empresa inovadora, mas contribuir para tirar o Planeta da fome ajudando a aumentar a produção de alimentos, de maneira sustentável.”
Gigante em vitamina C
Seja no campo, na lavoura ou na fazenda, a pandemia e a guerra, isoladas e/ou juntas repercutiram em maior ou menor grau nos diferentes segmentos que integram o agribusiness e deixaram lições. Não foi diferente na Agroindústria de Frutas Tropicais Diógenes Ltda, que atende pelo nome fantasia de Frutã, sediada em Jaguaribe, no semiárido nordestino. A empresa do sócio proprietário Benício Jr. e dosirmãos Ana Patrícia e Leandro, transforma 650 toneladas mensais de uma infinidade de frutas em alimentos saudáveis, atesta que a tarefa de se equilibrar entre uma crise e outra não é fácil, mas comprovou a resistência e teimosia no negócio.
Com 20 anos de atuação, a Frutã marca presença em países como Alemanha, Porto Rico, Emirados Árabes e Estados Unidos. “A pandemia ensinou o consumidor brasileiro a ter hábitos mais saudáveis, a exemplo de outros países que já tinham esta consciência, e onde as frutas se incluem. E a guerra deixou a lição de que é preciso ampliar o domínio sobre as matérias-primas para garantir segurança alimentar nos períodos críticos”, sentencia. Para Benício Jr., viver na globalização obriga as Nações a terem estratégias de longo alcance como proteção porque os percalços sempre virão.
Otimista, ele acredita que o Brasil que planta continuará colhendo resultados e desempenhando sua missão de celeiro do mundo porque conta com os insumos básicos que são o solo, o clima e gente qualificada. E aposta que o Brasil poderá ser um gigante mundial em vitamina C, dada a variedade de frutas, como já aconteceu, em escala, com os citrus, especialmente a laranja. E na pecuária de corte e de leite também, como já é em grãos.
Diretor da Associação Brasileira de Produtores e Exportadores de Frutas (Abrafrutas), Luiz Roberto Barcelos, comemora o fato de o setor da fruticultura brasileira ter passado de US$ 1,0 bilhão em exportações em 2021, apesar da pandemia e graças ao câmbio valorizado. As vendas externas aumentaram mais de 10% e no mercado interno o crescimento também foi positivo em 5%.
Tambémsócio fundador da Agrícola Famosa, com unidades no Rio Grande do Norte, Ceará, Pernambuco e Piauí, exportadora de melão e melancia para a Europa, diz que o desafio é administrar custos para não afugentar o consumidor, já que as frutas tiveram seu preço triplicado em dois anos. Apesar de preocupado com pandemia, guerra, falta de crédito e com a questão do fertilizante, ele se diz otimista e entende que o Brasil tem que transformar a crise em oportunidade.