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Pandemia acelerou saída de brasileiros para todos os continentes

Traveler in airport terminal. Young man with luggage waiting for airplane.

Quaisquer que sejam as razões, nunca tantos brasileiros foram viver no exterior. Conforme o Itamaraty, já somam 4,21 milhões de pessoas, número que representa um acréscimo de 35% em relação aos 3,12 milhões apurados há pouco mais de uma década. Num olhar mais atento enxerga-se esta realidade na pesquisa “Comunidade Brasileira no Exterior 2020” do Ministério das Relações Exteriores: em apenas dois anos (2018 a 2020), 625 mil brasileiros saíram do Brasil pela porta de embarque dos aeroportos.


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“Estamos colhendo os frutos da falta de oportunidades de empregos no Brasil e da mão-de-obra mais escassa no exterior”, analisa Eliane Ramos,presidente do Conselho Deliberativo da ABRH-Brasil. Ela lembra que além da legião de desempregados, estimada em 12 milhões de pessoas, há os desalentados, que desistiram de procurar colocação e, ainda, a geração que não trabalha e que não estuda, o que dá a dimensão do problema. A alternativa, segundo ela, é reverter a curva ascendente de saída, o que requer a atenção das empresas de recrutamento, valorizando as habilidades dos brasileiros especialmente as de adaptabilidade e elasticidade. “As pessoas querem ser respeitadas e o Brasil precisa de gente qualificada”, alerta.

O fato é que a comunidade brasileira no exterior é numerosa e crescente, com presença em todos os continentes em menor ou maior representatividade. Pela ordem, os destinos preferenciais são América do Norte (Estados Unidos e Canadá), Europa (Portugal, Reino Unido, Espanha, Itália e Alemanha), América do Sul (Paraguai e Argentina), Ásia (Japão e China), Oceania (Austrália), Oriente Médio (Líbano e Israel), África (África do Sul e Moçambique) e América Central e Caribe (Panamá e Costa Rica).

Escalada anual

É na América do Norte onde se concentra quase a metade dos brasileiros que estão fora (mais de 1,9 milhão nos EUA, Canadá e México). Os Estados Unidos, que respondem por 25% do PIB global, foi a terra que recebeu mais de 1,7 milhão, que vivem em Nova Iorque, Miami, Boston, Los Angeles, Atlanta e Houston.

Causas múltiplas

Para quem acompanha os anseios e planos de jovens que estão começando a caminhada profissional, a saída do país de origem tem diversas causas envolvendo novas oportunidades, espírito aventureiro, liberdade, falta de segurança e de perspectivas. Uma mistura que inclui também as cíclicas e prolongadas crises econômicas que subtraem empregos e o poder de compra das pessoas comprometendo ainda mais a qualidade de vida. A tudo isto, nos dois últimos anos, somou-se a pandemia, o combustível que faltava aos indecisos para cruzarem as fronteiras rumo a um novo desafio.

Os irmãos Felipe e Victória

É o caso de Felipe Swirsky, 21 anos, de Porto Alegre (RS), prestes a embarcar para Israel, onde vivem 15.000 brasileiros. Um lugar que ele adotou como sua casa desde a primeira visita e onde fez amigos de diferentes nacionalidades. A propósito, Felipe é o 14º do seu grupo de 16 estrangeiros que retorna para lá. Os outros dois estão cursando Medicina no Uruguai e no Panamá.

A decisão de sair do Brasil não é nova. A ideia começou aos 10 anos. Enquanto isso, Felipe iniciou e não concluiu os cursos de Engenharia de Alimentos, Engenharia de Automação Industrial e Educação Física. Trabalhou com fotografia e com cinema. Em 2019, quando morou lá, o estudo do judaísmo confirmou sua decisão. Mesmo com oportunidades locais, ele decidiu ir além. Chegando, vai participar do Programa Ulpam Kibutz durante cinco meses, onde aprenderá o hebraico, com ajuda financeira do governo até conseguir colocação no mercado de trabalho. Também terá suporte para pagar um curso superior. Depois, ingressará no Exército por três anos.

“Mudei mais pela paixão a Israel do que por desgosto com o Brasil”, esclarece ele, que se diz feliz. Mais feliz ainda porque encontrará, em Tel Aviv, a irmã Victória Swirsky, há 10 meses vivendo lá pela mesma razão: paixão pelo país. Aos 28 anos, Victória é formada em Cinema com Mestrado em Produção de Filmes. O plano de mudança era antigo e a pandemia acabou abrindo espaço para a realização. “Israel me passa segurança e muitas oportunidades”, diz ela, que cursou hebraico em Jerusalém por cinco meses antes de ir para Tel Aviv para trabalhar com atendimento ao consumidor para uma empresa da área de finanças. Sobre o Brasil visto de longe, ela só fez repetir que o futuro é muito incerto.

O certo é que quem tem planos de mudança tem que se preparar e planejar sua escolha. “Primeiro é preciso ter consciência dos reais motivadores da mudança (questões emocionais) e trabalhar as competências pensando não só no antes e no durante, mas no depois também, caso haja um retorno”, alerta a consultora e coaching Fernanda Godolfim, sócia-diretora da Negócios Humanizados. Para ela, são pontos para reflexão importantes para que a pessoa possa aproveitar a experiência, não só para obter conhecimento técnico ou estrutura financeira, mas que possa desenvolver, principalmente, as soft skills.

Para a psicóloga Simone Mussel, diretora de Desenvolvimento da Missel Capacitação Empresarial, a saída dos profissionais do Brasil, acelerada pela pandemia, também ganhou força com a “remotização” ou o formato híbrido de trabalho, favorecendo, principalmente, quem atua na área da tecnologia. É o modelo “anywhere office”, movimento global de profissionais de diversos lugares do mundo em busca de oportunidades nos mais diversos países.

Ao contrário da corrente de pensamento de “fuga de cérebros”, que a psicóloga não ignora, a globalização chegou como uma oportunidade na qualificação dos profissionais, inclusive podendo contribuir para que muitos deles retornem ao Brasil com maior nível cultural, influenciando no crescimento cultural do Brasil e, então, atraindo novos talentos.

“Uma das grandes motivações que percebo para a saída do Brasil é justamente a busca por maior aperfeiçoamento exigido pelo mercado de trabalho e outra é maior flexibilidade entre o modelo híbrido e remoto”, assegura ela, lembrando que para estes profissionais o salário é uma consequência citada como prioridade apenas por 16% dos entrevistados na pesquisa da Blue Management Institute, conforme apontou pesquisa.

Passividade

Diante de mais uma crise econômica que persiste sete anos, o Brasil assiste a esta movimentação sem esboçar reações efetivas. O fato se torna ainda mais grave quando se sabe que parte significativa dos brasileiros que saem do País (47%) está na faixa etária entre 15 a 29 anos, ou seja, exatamente o futuro da força de trabalho e de talento do Brasil.

Outra questão que preocupa os analistas é a tal “fuga de cérebros”. Um êxodo registrado não só entre os jovens talentosos, mas entre adultos já qualificados. São pesquisadores e cientistas que cursam fora especializações, mestrados e doutorados e não retornam atraídos por maior valorização e pelo acolhimento dos governos locais.

Conforme dados da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a Capes, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) perdeu metade do orçamento destinado ao financiamento de pesquisas nos últimos dez anos. Trata-se de uma realidade que compromete o futuro da comunidade científica nacional e a própria soberania de uma Nação.

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