O avanço ainda é acanhado e o desafio de explorar o enorme potencial tem como aliado o perfil criativo e empreendedor dos brasileiros por se tratar de um conjunto de atividades econômicas que utilizam a criatividade como matéria-prima básica para a produção de bens e serviços, insumo abundante no País.
Em ascensão em todo o mundo, a chamada Economia Criativa já responde por 7% do PIB mundial e pode crescer entre 10% e 20% nos próximos anos, conforme projeções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Estima-se que o faturamento global já ultrapassou os US$ 500 bilhões. No Brasil, esta economia representa em torno de 2,6% do PIB, percentual ainda tímido – apesar do enorme potencial a ser explorado – e que vem se mantendo estável apesar de fortemente impactada pela pandemia. Exceção para o segmento de tecnologia da informação, comunicação e games, atividades que ganharam maior relevância econômica. No entanto, em termos de geração de empregos, a área de eventos e espetáculos se destaca por ter uma cadeia de fornecimento ampla com vastas subcontratações mobilizando muita gente, conforme pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV), referente ao período 2019/2020.
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O acompanhamento da FGV é reforçado pelo estudo mais recente do Observatório Itaú Cultural, apontando que entre o terceiro trimestre de 2020 e o terceiro trimestre de 2021 mais de 868 mil empregos foram criados na Economia Criativa no Brasil, dos quais 91,3 mil somente na cultura. Assim, o total estimado de ocupação na Economia Criativa passou de 6,3 milhões para 7,1 milhões de pessoas empregadas.
Na visão de Marcel Levi,gerente da FGV Projetos,a partir da pandemia se vislumbrou a possibilidade de crescimento no que se chama ambiente figital (simbiose entre o físico e o digital) para acelerar o processo de inovação em setores como o de eventos, permitindo o acesso a mais pessoas e envolvendo maior número de profissionais. Ele lembra que o Brasil tem um ecossistema de inovação robusto com mais de 20 parques tecnológicos, inclusive fora das capitais, caso de São Paulo, Pernambuco e Santa Catarina. O fato possibilita a criação de infraestrutura para acolher o ambiente figital podendo ser usado pela economia criativa em outras áreas como as da Publicidade e Propaganda, Consumo, Moda e Tecnologia, além de Cultura.
Marcel Levi alerta que os profissionais desta nova economia precisam saber lidar com as ferramentas transformadoras no ambiente figital tais como divulgação de campanhas, arrecadação de fundos e financiamentos coletivos, entre outros, capazes de oferecer serviços ao mercado como tours digitais, a exemplo do que fizeram os museus em pleno lockdown. “Trata-se de uma imersão para transformar o ambiente físico em digital chegando ao figital e como fazer chegar o resultado disto ao consumidor com geração de receita ao negócio”, afirma. E observa que a Economia Criativa é uma realidade que não conta com uma política governamental própria de promoção. É recomendável, então, ficar atento às possibilidades existentes nas políticas de inovação que financiam projetos específicos.
Como é de imaginar, o movimento de startups está fortemente representado na Economia Criativa. Com formação em Stanford, o especialista no assunto, Leandro Piazza, CEO da 49 Educação, criou a Startup University para ser instrumento de formação de super founders, os empreendedores que sabem como fazer uma startup crescer e captar investimentos. Em dois anos, mais de 1300 startups viraram realidade e já receberam mais de R$ 200 milhões em valorização.
Para Leandro Piazza, a nova economia cresce no mundo cada vez mais baseada em demandas ligadas a startups e à escalabilidade de maneira produtiva, sem estar necessariamente em ambientes físicos isolados. “Caminhamos para o universo totalmente virtual, no qual é possível trabalhar em qualquer lugar com apenas um computador e acesso à internet, gerando riqueza para o mundo físico”, afirma ele, garantindo que já se configura um “apagão” de mão-de-obra envolvendo desenvolvedores e profissionais ligados à tecnologia, altamente requisitados no mundo todo. Mas acrescenta que além do domínio da tecnologia, estes profissionais precisam ter a cabeça de empreendedores. “Capital e metodologia empreendedora estão disponíveis como nunca antes”, disse, acreditando que o desafio é preparar a atual geração para este novo cenário macroeconômico.
Para a analista de Competitividade do Sebrae nacional, Jane Blandina da Costa, programas de apoio à Economia Criativa não faltam. Há editais de fomento, de instituições representativas, Fundos de Amparo à Pesquisa, leis e editais da Secretaria de Cultura, como por exemplo a Lei Rouanet, Lei Aldir Blanc e editais da Ancine. Simultaneamente, o Sebrae conta com ações e programas que contribuem com os setores da economia criativa, caso dos programas Sebraetec, Catalisa, de Startups. E também editais de inovação e fomento, principalmente nas regiões Nordeste e Sudeste, além de eventos como Hakatons e rodadas de negócios e, ainda, cursos de capacitação em gestão para os setores de música, audiovisual e de economia criativa de forma geral.
A analista destaca o avanço do setor de jogos eletrônicos tanto em faturamento como em inovação. No Brasil este mercado movimentou US$ 1,6 bilhão em 2019, em uma média de crescimento maior do que a global, aumentando 11% em relação ao ano anterior. A taxa se manteve em 2020, com 350 empreendimentos formalizados estimados em atividade no setor. Já no mercado formal, o Sebrae nacional confirma a presença ativa de organizadores de feiras e eventos, fotografia, produção audiovisual e produção musical, com elevada demanda de profissionais, notadamente no Sudeste – São Paulo em especial –, mas também no Nordeste.
O superintendente do Sebrae Ceará, Joaquim Cartaxo, não tem dúvidas de que o Nordeste já está inserido na Economia Criativa, seja pelas atividades mais tradicionais como o artesanato e as festas populares, como o São João e as festas religiosas, até áreas mais inovadoras como games e as relacionadas à tecnologia da informação, que vem crescendo muito nos últimos anos. Cita, também, o turismo, carro-chefe da economia da região.
“Eu costumo dizer que a Economia Criativa é a economia do Século XXI, por ter como matéria-prima um bem infinito que é a capacidade humana de criar. E o Nordeste se destaca por ser este grande celeiro de criatividade, que abriga inúmeras manifestações artístico-culturais e uma grande gama de profissionais que atuam em atividades relacionadas”, observa ele.
O Ceará, em particular, igualmente se integra ao circuito criativo pela moda, um dos segmentos que mais empregam, e, mais recentemente, o design de Fortaleza, que em 2019 conquistou o título “Cidade Criativa do Design”, da Unesco, com um trabalho envolvendo instituições como o Sebrae/CE e a Prefeitura de Fortaleza.
“Embora tenhamos pessoal criativo na região, o que nos falta é transformar este potencial e esta criatividade em iniciativas inovadoras, porque quando falamos de Economia Criativa, estamos falando necessariamente da geração de negócios. E é aí que o Sebrae entra, tentando ajudar estes profissionais a se verem também como empreendedores, capazes de transformar o seu ofício em um empreendimento competitivo e economicamente sustentável”, comenta Cartaxo.
Percebendo a importância desta economia, as unidades estaduais do Sebrae dos nove estados nordestinos, em parceria com o Sebrae Nacional e Associação dos Sebraes estaduais/Nordeste (Abase Nordeste), há dois anos, realizam o Projeto Regional Nordeste da Cadeia de Valor da Economia Criativa para desenvolver os negócios criativos, de modo a gerar emprego e renda na região.
Ao mesmo tempo em que convive com mais de 11 milhões de desempregados, o Brasil precisa preparar, somente para a indústria, nada menos do que 9,6 milhões de pessoas nos próximos três anos, 7,6 milhões dos quais precisam de atualização e 2,0 milhões requerem formação inicial mesmo. Os dados do Mapa do Trabalho Industrial 2022-2025, publicado pelo Observatório Nacional da Indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostram que a aparente contradição está na falta de qualificação de trabalhadores para acompanhar os avanços. A tecnologia gerou demanda por profissionais das chamadas ocupações transversais, que exigem atuação em diferentes áreas, como técnicos em Segurança do Trabalho ou de apoio à Pesquisa e Desenvolvimento.
Nos segmentos específicos, despontam o setor metalmecânico, logística, construção e alimentos, portanto, fazendo do aperfeiçoamento e da requalificação ações estratégicas para o crescimento industrial do País. Um desafio enorme que as instituições terão que enfrentar e vencer. Caso do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). Por ocasião da divulgação do estudo, o diretor-geral, Rafael Lucchesi, reconheceu que será lenta a recuperação do mercado formal de trabalho, acompanhando o ritmo de retomada da economia e que será preciso dar prioridade ao aperfeiçoamento dos já empregados e de quem está buscando novas oportunidades.
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