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Resiliência e oportunidades na Construção Civil

É inegável que a pandemia de Covid-19 postergou muitos planos. Na construção civil, vimos cerca de 70% dos empresários adiarem lançamentos de imóveis novos devido à imprevisibilidade da economia e do país.


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No acumulado de janeiro a setembro de 2020, houve uma queda de 27,9% nos lançamentos de imóveis na comparação com o mesmo período de 2019. Isso significa que, neste período analisado, a oferta caiu de 118.886 novas unidades para apenas 85.755, segundo a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).

“O mercado vinha numa recuperação do difícil período de 2013 a 2018. No final de 2019 e 2020 sinalizava como um ano de plena recuperação e expansão para o mercado imobiliário. Então veio a catástrofe da pandemia”, foi o que confirmou o empresário e CEO da Viva Imóveis, Paulo Angelim.

A recessão foi totalmente atípica, no entanto, o mercado imobiliário e a construção civil são dois segmentos que conseguiram continuar em alta mesmo durante a pior fase da pandemia. A cadeia produtiva foi um dos primeiros a reagir e a mostrar a sua força.

“Houve um primeiro momento de perplexidade e adaptação ao novo cenário e modus operandi, imposto pelos lockdowns. Em menos de 3 meses, o mercado se adaptou e as vendas voltaram, principalmente no produto econômico, de alto padrão e de praia.”

Retomada da construção civil e cenário de boas expectativas

Novos desafios precisam ser superados para não impedir a construção civil de avançar. O setor fechou o ano de 2020 com 8% de crescimento em volume, o maior em dez anos. A performance da cadeia seguiu positiva em 2021 e a expansão atingiu 7,6%.

“Quando olhamos para as vendas os números são animadores. De janeiro a setembro de 2020, 128.849 unidades residenciais foram vendidas, isso representa uma alta de 8,4%. E o melhor: em todas as regiões do país o acumulado das vendas em 2020 está positivo.”

Clausens Duarte, CEO da CR Duarte Engenharia

Já em 2022, a indústria brasileira da construção elevou em abril a previsão de crescimento neste ano de 2% para 2,5%, segundo dados divulgados pela CBIC e Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O crescimento das vendas foi rapidamente refletido em novos empregos, 244.755 vagas abertas, um incremento de 11,62% segundo o Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) em relação ao ano anterior.

Esses resultados impulsionaram o setor da construção. O aumento dos financiamentos de imóveis e das contratações de mão de obra (+111%) e, ainda, a retomada de muitos projetos foram alguns dos pontos positivos, é o que confirma o engenheiro Clausens Duarte.

“Este avanço aliado aos indicadores de confiança e nível de atividade, também vieram positivos. O setor se destacou na geração de empregos, de janeiro até março de 2022, já foram criados mais de 100 mil novos postos de trabalho. Todos esses fatores impulsionam as estimativas de 2% para 2,5%”.

Em contrapartida, a alta dos preços dos materiais de construção chegou a 21,34% do Índice Nacional de Custo da Construção (INCC), sendo o principal desafio da construção civil. Os aumentos foram notados principalmente em tubos e conexões de PVC (91,8%), condutores elétricos (91,9%), eletrodutos de PVC (70,8%) e vergalhões e arames de aço carbono (81,5%).

“O impacto é enorme, pois não existe margem para os incorporadores absorverem este incremento de custos. Isso porque a demanda por materiais e suprimentos segue aquecida, mas a distribuição foi afetada, fator que impacta diretamente a disponibilidade e o preço das matérias-primas e dos equipamentos,” confirma o corretor Paulo Angelim.

O Produto Interno Bruto (PIB) do setor também foi impactado pelo aumento de gastos, gerando crescimento de 9,7% no Brasil e 4,8% no Ceará, em 2021. A projeção para 2022 é de crescimento de 2,5%.

Clausens Duarte afirma que no Ceará o mercado segue aquecido. “Dados do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Ceará (Sinduscon-CE) revelam que em 2020 foram vendidos 5052 imóveis. Um aumento de 5% se comparado ao ano de 2019, quando foram comercializados 4819 imóveis”, disse.

No entanto, o engenheiro afirma que nos próximos meses, o segmento deve perder velocidade de crescimento. “E as razões são múltiplas: alta das taxas de juros combinada com preços de materiais de construção ainda mais elevados; endividamento das famílias; menores níveis de desemprego, mas com redução de salários; inflação local e mundial.”

Soma-se a todos estes pontos o ano eleitoral em que eventuais novos fatos podem complicar ainda mais a economia. “O maior desafio mundial é inflação, gerando pressão nos custos. No caso brasileiro, a tensão eleitoral. As pesquisas de intenção de compra e poder aquisitivo mostram arrefecimento das curvas”, confirma Paulo Angelim. Neste cenário, a FGV e o CBIC estimam um crescimento de 2% para a cadeia.

Quando nem tudo sai como planejado

A quebra de contrato de compra de imóvel aumentou 33% no primeiro trimestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2021, segundo a Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc).

Para Luciana Gurgel, advogada no APSV Advogados, o setor imobiliário, por envolver projetos e empreendimentos de valores consideráveis, de médio e longo prazo, além de ser um dos principais empregadores do país, é um dos primeiros a serem afetados por altas taxas de inadimplência em períodos de crise.

“O distrato é a ação de encerrar um contrato, onde as partes devem estar de acordo. A resolução contratual ocorre por conta de uma condição pré-estabelecida que foi descumprida, como a falta de um pagamento, por exemplo.”

Foram distratados nesse período 1.061 acordos de aquisição de imóveis de médio e alto padrão, contra 720 em 2021, informa a associação, que aponta a inflação e as altas taxas de juros como responsáveis pelo crescimento da taxa de desistência das compras.

Apesar da alta nacional, o Ceará se destaca pela redução do número de distratos, 63% entre 2019 e 2020. Em 2019, foram ao todo 1356 distratos. Em 2020, foram contabilizados 503.

A denominada Lei do Distrato (Lei nº 13.786/2018) altera artigos da Lei de Incorporação Imobiliária (Lei nº 4.591/64) e da Lei de Loteamentos (Lei nº 6.766/76), estabelecendo regramento para o inadimplemento desses contratos e atuando como marco legal para os contratos de alienação de imóveis “na planta”.

Com a lei, ficou estabelecida a retenção de 50% do valor pago pelo consumidor até o momento da rescisão. Também foi definido que não haverá devolução da taxa de corretagem, de cerca de 5% do valor do imóvel.

Outro ponto importante: as incorporadoras ficaram autorizadas a devolver o dinheiro só depois de entregarem o imóvel e receberem o habite-se, de modo a evitar que ficassem sem dinheiro para terminar a obra.

A principal expectativa desta lei é a diminuição das demandas judiciais, já que foram estabelecidos parâmetros em relação ao contrato de compra e venda entre incorporadora e adquirente.

“A referida Lei disciplinou a resolução do contrato por inadimplemento do adquirente de unidade imobiliária em incorporação imobiliária e em parcelamento de solo urbano, além de indicar elementos essenciais aos contratos, regras e obrigações entre as partes, tornando esta relação mais transparente, trazendo assim maior segurança jurídica nessas operações comerciais”, de acordo com a advogada.

Como reflexos econômicos em virtude da maior segurança jurídica, temos a redução do número de distratos em razão de uma melhor informação ao adquirente e uma menor judicialização das demandas. Consequentemente, melhora as chances de estabilidade e crescimento do setor.

“Com uma maior previsibilidade e diminuição dos riscos para as incorporadoras e/ou loteadoras em relação aos negócios, é possível uma redução no preço dos imóveis, já que houve diminuição de prejuízos.”

Luciana Gurgel, advogada no APSV Advogados

Segundo dados da pesquisa realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) em parceria com a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), os distratos responderam por 11,8% das vendas em 2019, 11,1% em 2020 e 11,6% em 2021. Ou seja, apesar do aumento nominal, não se trata de uma crise. Os números ainda estão longe do pico de 2015, quando foram distratadas 19.050 unidades, ou 35,1% das vendas.

No entanto, diante de um evento de força maior, como a pandemia de Covid-19, é normal questionar-se como fica a aplicabilidade da Lei do Distrato diante da nova realidade econômica. Para Luciana Gurgel, deve haver um acordo de entendimento entre as partes a fim de evitar as vias judiciais.

“Com o evento de força maior, muitos adquirentes ficaram impossibilitados de manter seus compromissos e, ao mesmo tempo, as incorporadoras/loteadoras também enfrentaram dificuldades, como o andamento das obras, problemas com o recebimento de equipamentos e materiais, entre outros. Assim, recomenda-se a análise e negociação do caso específico, devendo as partes observarem a boa-fé e evitarem a via judicial”, finaliza.

Todo desafio tem solução?

No mundo pós pandemia, a mobilidade, a flexibilidade, as tendências tecnológicas, o mundo digital e a sustentabilidade ganham cada vez mais projeções para o mercado do futuro da construção civil.

Para a geração millennial, também conhecida como geração Y, alugar um imóvel é considerada a melhor opção. Com pessoas nascidas entre 1981 e 1996, o grupo compreende principalmente jovens adultos, que cresceram e se desenvolveram em um período de avanço tecnológico e grandes mudanças no mercado de trabalho.

De acordo com uma pesquisa realizada pela agência Today, 80% das pessoas que fazem parte dessa geração preferem alugar ao invés de comprar um imóvel. O ambiente online tem um grande peso nisso, já que cerca de 90% dos compradores usam sites ou plataformas de ofertas pela internet no processo de aquisição de imóveis.

Paulo Angelim afirma que as gerações Y e Z valorizam mais o acesso facilitado aos bens do que a sua posse, porém ainda há muitos jovens que priorizam a segurança. “O foco na vida profissional e a busca por experiências pessoais deixam o imóvel próprio em segundo plano. Porém, algumas pesquisas apontam o inverso, com o jovem buscando a segurança do primeiro imóvel próprio.”

Além disso, a inovação e a transformação digital nessa área são uma realidade que tem feito a diferença para os profissionais e empresas do mundo inteiro. O CEO da Viva Imóveis afirma que as novas tecnologias permitem que as incorporadoras melhorem seus processos operacionais, otimizando tempo e recursos e, consequentemente, o aumento das vendas.

“Muita coisa vai migrar e já está migrando para o digital. A autoridade é construída com conselhos, com dicas e com posicionamentos. Em termos de tendência, os apartamentos compactos com alta tecnologia e conveniências vieram para ficar.”

Diante dos resultados, a cadeia produtiva deve permanecer como um dos principais motores da economia, e gerar empregos, bem como o crédito imobiliário deve seguir em alta.

“Sabemos que ainda há questões que, por muitas vezes, impactam fortemente o segmento. Mas vemos também um movimento crescente de otimismo entre os empresários, que estão revisando seus negócios e implementando novas estratégias com objetivo de beneficiar a todos os envolvidos e manter o setor aquecido mesmo diante das dificuldades”.

Paulo Angelim, CEO da Viva Imóveis

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