Os negócios de impacto são aqueles que possuem a principal intenção de solucionar uma dificuldade social ou ambiental, de maneira complementar às políticas públicas e à atuação do terceiro setor. Esse impacto positivo é criado a partir do próprio centro da empresa, cuja principal atividade deve proporcionar benefícios diretos para as classes sociais menos favorecidas e para o meio ambiente.
Empresas de impacto atuam segundo as leis de mercado e são financeiramente autossustentáveis. Elas buscam gerar impacto positivo na mesma proporção em que almejam lucros. Além disso, a solução trabalhada pelo negócio deve estar no cerne da sua operação, e o impacto produzido deve ser monitorado e reportado. A empresária do ramo da inovação, Larissa Gurjão, fundadora e CEO da SIB Impact, explica sobre a necessidade do fortalecimento do ecossistema de impacto.
“Atualmente, vem se desmistificando a ideia equivocada que algumas pessoas ainda acreditam de que negócios de impacto socioambiental não geram tanto retorno financeiro. Cada vez mais, negócios de impacto estão sendo bem avaliados no mercado, alcançando níveis mais escaláveis dos problemas que eles estão solucionando”.
Larissa Gurjão, fundadora e CEO da SIB Impact
Os empreendedores de negócios de impacto precisam de diferentes tipos de apoio técnico e financeiro, até que cheguem a um modelo economicamente sustentável e entreguem impactos positivos, que possam ser mensurados. Um ecossistema estruturado com organizações dinamizadoras, dados e recursos para apoiá-los aumenta as chances de sucesso e conexões com investidores e clientes nos segmentos público e privado.
O número de negócios de impacto no Brasil tem crescido consideravelmente, sobretudo, a partir do pós-pandemia. De acordo com pesquisa divulgada pela Aspen Networks Development Entrepreneurs (Ande), os investimentos no setor feitos no país, superaram a soma de R$ 1 bilhão em 2020.
Como o Brasil apresenta uma problemática socioambiental muito particular pra ser resolvida, as corporações e os empreendedores brasileiros perceberam que existem papéis essenciais a serem cumpridos para avançar na solução desses problemas. Outra dificuldade enfrentada pelo setor de impacto no Brasil, diz respeito aos investimentos na área de ciência, tecnologia e inovação para solucionar os problemas sociais e ambientais, de forma sustentável e inovadora.
Dados divulgados em setembro de 2021, mostram que o Brasil ganhou cinco posições no Índice Global de Inovação (IGI) na comparação com o ranking de 2020 e agora ocupa o 57º lugar entre 132 países. No entanto, essa posição, é considerada ruim, pois o país está 10 colocações abaixo da obtida em 2011, quando atingiu sua melhor marca, a 47ª posição. Os países no topo da lista são a Suíça, seguida pela Suécia e pelos Estados Unidos.
Na comparação com os países da América Latina e do Caribe, o Brasil ocupa a 11ª posição entre as 34 economias do grupo de renda média alta e é o 4º colocado entre as 18 economias avaliadas, ficando atrás do Chile (53º), do México (55º) e da Costa Rica (56º).
O ranking foi publicado pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) em parceria com o Instituto Portulans, a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Confederação da Indústria Indiana (CII), a Ecopetro e a Assembleia de Exportadores Turcos (TIM), contando com o apoio do Conselho Consultivo do IGI e de sua Rede Acadêmica.
A colocação brasileira é considerada incompatível, segundo avaliação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) com o fato de o país ser a 12ª maior economia global, em 2020, e com a realidade de termos um setor empresarial sofisticado. Análise recente feita pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) aponta o Brasil em 13º lugar entre 45 países no ranking internacional para o desempenho da produção industrial. A conferencista Mel Oliveira, gerente de inovação na Ace Cortex avalia a importância da inovação para os negócios de impacto.
“Para inovar é necessária tecnologia, investimentos em ciência, facilidade na abertura de novas empresas e, muitas vezes, os empreendedores precisam lidar com um sistema burocrático. Mesmo assim, eu percebo uma maior abertura para discutir sobre inovação, capitalismo consciente e negócios de impacto, embora ainda seja necessário sair do discurso e passar à prática para obter resultados, pois as empresas estão famintas por inovação”.
Mel Oliveira, gerente de inovação na Ace Cortex
Uma pesquisa do grupo Catalyst 2030, divulgada pela Folha em março deste ano, apontou que houve um crescimento de 29,7% no número de negócios de impacto criados no País. Além dos novos empreendimentos, as empresas estão transformando seus modelos de negócio a fim de gerar impacto socioambiental positivo.
Apesar das diferenças de conceitos, outro fator que contribui para o aumento do número de negócios de impacto no País foi a popularização do ESG, termo que se refere à governança ambiental, social e corporativa.
O conceito ESG (sigla inglesa para Environmental, Social e Governance) representa a forma como as empresas estão estruturadas para atrair investimentos e aumentar a lucratividade, com foco no retorno positivo para a sociedade e para o meio ambiente.
“Os investidores estão cada vez mais preocupados em gerar impacto positivo por meio dos seus empreendimentos, então a demanda está muito crescente no setor dos negócios de impacto, voltados para as boas práticas ambientais, sociais e de governança”, explica Larissa Gurjão.
Em busca da regulamentação e criação de espaço para negócios de impacto social, a Política Estadual de Negócios de Impacto no Ceará aprovou uma proposta em setembro de 2021, durante sessão plenária na Assembleia Legislativa do Ceará. A Mensagem número 118/21, do Poder Executivo, acatou o Projeto de Indicação número 19/2020.
A proposta tem como objetivo articular os órgãos do setor público, da iniciativa privada, o Terceiro Setor, as universidades e a sociedade civil para promover um ambiente benéfico e propício ao desenvolvimento de investimentos para negócios de impacto.
Mais do que produzir lucro, a nova geração de empreendedores brasileiros também deseja gerar impacto social positivo para o mundo. Apesar da busca por essa combinação vir crescendo nos últimos anos, esses empresários ainda se deparam com muitas dúvidas na hora de executar seus projetos.
Para ajudá-los nessa jornada, diversos atores vêm lutando para garantir no mercado as condições favoráveis ao surgimento e manutenção desses negócios, dentro de um contexto regulamentado.
O mais recente Mapa de Negócios de Impacto, lançado em 2021 pela Pipe.Social, analisou um total de 1.272 negócios de impacto operacionais no Brasil. A maioria está localizada na região Sudeste, com 58% das iniciativas, porém o Nordeste já ocupa o segundo lugar com 16%, caracterizando uma descentralização regional.
A pesquisa revelou ainda que 71% destes negócios já estão formalizados e que 60% têm até cinco anos de existência e se encontram nas etapas iniciais de desenvolvimento. Enquanto isso, 80% estão entre as etapas de desenvolvimento da solução e de organização do negócio. Esse mercado vem evoluindo e iniciativas como a da Política Estadual de Negócios de Impacto no Ceará são maneiras de acelerar o crescimento desse ecossistema.
A nível nacional, o Sistema B Brasil vem conduzindo esse debate e a disseminação desse conceito de economia mais equitativa, inclusiva e regenerativa para as pessoas e para o planeta, presente nos negócios de impacto.
Como resultado, foi criada uma Estratégia Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto pelo Governo Federal, com a definição dos negócios, investimentos de impacto e organizações intermediárias por meio do Decreto nº 9.244, de 17 de dezembro de 2017, substituído posteriormente pelo Decreto nº 9.977/2019.
No Ceará, o tema ganhou relevância com o surgimento, em 2017, em Fortaleza, da Somos Um, criada pela empresária Ticiana Rolim Queiroz, com o propósito de proporcionar o empoderamento das pessoas a partir do empreendedorismo.
“A iniciativa se baseia num modelo de fazer negócios com a finalidade de resolver problemas sociais e não apenas maximizar o lucro. Quem não incluir impacto no seu modelo de negócio por consciência, vai precisar fazer por sobrevivência, das pessoas e dos negócios”, alerta a empresária.
Os negócios de impacto apresentam muitas possibilidades de parcerias e vínculos com todo o ecossistema. Esse modelo de ecossistema envolve governo, startups ONGs, empresas privadas, investidores, universidades, escolas, entre outros. Na prática, os negócios de impacto fomentam o desenvolvimento de novas soluções e novos negócios, por meio de parcerias com esses setores, e cada um deles possui um objetivo diferente.
“A importância de todos esses setores estarem se mobilizando é uma forma de descentralizar da iniciativa governamental a responsabilidade de resolver os problemas da sociedade. Inclusive, as empresas exercem um papel fundamental nesse processo de parcerias com os negócios de impacto, destinando parte da monetização e dos lucros para solucionar as questões socioambientais”.
Larissa Gurjão, fundadora e CEO da SIB Impact
O governo se preocupa em resolver os problemas dentro do território local e, muitas vezes, fazem essa fomentação para obter novos negócios, voltados para solução das questões sociais. As startups, por exemplo, já estão nascendo com o propósito de solucionar algum problema socioambiental que está ocorrendo na atualidade. As universidades também estão investindo e criando hubs de inovação, com a finalidade de desenvolver novas soluções que impactem positivamente a esfera social e ambiental.
“Qualquer negócio regularizado no Brasil é relevante para o mercado. Os negócios de impacto têm suas características específicas por serem negócios que possuem seu core business no desenvolvimento social ou ambiental do planeta. Hoje, uma das melhores formas de se escalar e acelerar a evolução no cuidado com nosso planeta é por meio do empreendedorismo. Os empreendimentos de impacto ajudam a escalar soluções que muitas vezes são de responsabilidade governamental, mas que atualmente não podem mais esperar. Gerar economia, renda, emprego e ajudar a melhorar o mundo é uma das grandes formas de termos uma sociedade mais justa”.
Mel Oliveira, gerente de inovação da Ace Cortex
A Coalizão pelo Impacto, iniciativa nacional por mais e melhores negócios de impacto, foi lançada na última terça-feira (26) no Salão Aberto da Casa da Indústria da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC), em Fortaleza. O evento tem o intuito de potencializar o ecossistema de investimentos e negócios de impacto da capital cearense.
A programação trouxe a apresentação da iniciativa feita por Fernanda Bombardi, gerente executiva do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE) e coordenadora da Coalizão. Além disso, aconteceram exposições sobre o ecossistema de impacto no Brasil, que foram feitas por Célia Cruz e Beto Scretas, também do ICE, e a participação de empreendedores, empresários e personalidades com atuação no setor dos negócios de impacto no Ceará, com projetos já consolidados e com resultados práticos, como o Banco Palmas e a Catarina Mina.
O trabalho foi realizado de forma conjunta com organizações que apoiam empreendedores: incubadoras, aceleradoras, parques tecnológicos, hubs de negócios, instituições de Ensino Superior, entre outros.
A Coalizão pelo Impacto foi correalizada pelo Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), Instituto Helda Gerdau, Instituto humanize e Somos Um, com a parceria estratégica da Cosan, Fundação FEAC, Fundação Grupo Boticário, Instituto Sabin e Raia Drogasil. Sobre a proposta do evento, a gerente executiva do ICE, Fernanda Bombardi, responsável pela coordenadoria da Coalizão explicou:
“O campo dos investimentos e negócios de impacto tem crescido de forma significativa nos últimos anos na região Nordeste. Fortaleza é a cidade da região em que a Coalizão pelo Impacto atuará. O estado do Ceará já possui uma política estadual de fomento ao tema, o que favorece o macro ambiente para o ecossistema local se tornar mais estruturado e dinâmico. Por outro lado, vemos a necessidade de crescer o número e a diversidade de organizações nesse ecossistema, de forma a garantir um suporte adequado ao empreendedor que deseje empreender com impacto e performance. A Coalizão irá justamente atuar com este propósito, de fortalecer as organizações dinamizadoras deste ecossistema”, salientou a gerente executiva.
A projeção inicial é aportar R$ 29 milhões para alavancar simultaneamente ecossistemas de impacto em seis cidades do Brasil até 2026, em parceria com organizações locais, ecossistemas de investimentos e negócios de impacto em cidades das cinco regiões do Brasil.
Além de Fortaleza, fazem parte do projeto as cidades de Brasília (DF), Porto Alegre (RS), Belém (PA), Campinas (SP) e Paranaguá (PR). A meta é apoiar até 600 negócios que movimentarão os PIBs locais com produtos e serviços voltados para a solução de problemas socioambientais.
No Ceará, a estratégia da Coalizão pelo Impacto é somar forças a iniciativas com capilaridade como a da ‘Somos Um‘, organização dinamizadora que apoia empreendimentos de impacto por meio de ciclos de aceleração, cursos, consultorias e que realiza um trabalho de fortalecimento do ambiente empreendedor de impacto. Já foram acelerados pela Somos Um negócios como o Bom Viver Reformas, Giardino Buffet, Faz Carreira, Corre Aqui e Troqueiro.
Dezenas de mulheres já foram também capacitadas por meio da Trilha Florescer, projeto de empoderamento feminino e capacitação empreendedora que busca ajudar mulheres a estruturarem seus negócios.
“É uma alegria imensa para nós estar correalizando a Coalizão pelo Impacto, um projeto de grande relevância no País, fundamental para propagar e fomentar o ecossistema de negócios de impacto, propósito esse que também é o da Somos Um. A Coalizão vem para somar conosco e ampliar o impacto que a Somos Um já faz aqui no Ceará. Essa troca é muito rica, tanto com ICE, que é uma organização que tem essa missão há mais de 10 anos aqui no Brasil, como com os outros parceiros. Isso é o que a gente acredita: unir forças para criar o setor dois e meio, para ampliar as possibilidades dos empreendedores sociais e apoiá-los nesta jornada desafiadora” [….] explica Ticiana Rolim Queiroz, presidente da ‘Somos Um‘, parceira local da Coalizão pelo Impacto.
De acordo com a diretora executiva da ‘Somos Um‘, Bia Fiuza, a vinda da Coalizão pelo Impacto para o Ceará não apenas é uma demonstração do grau de avanço do tema na realidade local, mas fortalece o ecossistema de negócios de impacto, abrindo espaço para mais pessoas descobrirem como empreender com um foco conectado com as novas economias.
“Para podermos multiplicar o número de negócios que nascem com intenção de resolver um problema social ou ambiental, é preciso construirmos toda uma infraestrutura de apoio para estes negócios e para aqueles que fazem parte dele. É preciso formar os empreendedores, ampliar as fontes de capital acessível, gerar dados, desenvolver políticas públicas de fomento, sensibilizar a sociedade para o tema, e capacitar toda uma rede técnica de apoio aos negócios. Sem um ecossistema maduro, é difícil se ter um setor robusto”, reforça Bia Fiuza.
Cenários desta quinta (21) aborda inovação em empresas de impacto
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