“O sacrifício maior das mulheres é superar a insegurança e não demonstrar fragilidade para que não confundam com falta de competência”. (Foto: Envato Elements)

Mulheres ocupam 38% dos cargos de liderança no Brasil

Por: Gladis Berlato | Em:
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Institutos de pesquisa mostram que as mulheres são maioria da população brasileira e ocupam espaços até há pouco exclusivamente masculinos, mas ainda ganham em torno de 20% a 27% a menos em relação aos homens de mesma escolaridade. Também são as mais afetadas pelo desemprego.  Mesmo assim, pelas suas habilidades e características de resiliência, espírito de compartilhamento e olhar mais humano, já respondem por 38% dos cargos de liderança no País. O público feminino não tem limite no seu horizonte, o que confirma que a mulher pode chegar aonde ela quiser.


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Longe do estereótipo de sexo frágil, as mulheres caminham em direção a uma nova realidade que ainda precisa ser conquistada para reverter o quadro atual de desigualdades. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que mais da metade (6,5 milhões) do total de 12 milhões de desempregados brasileiros são mulheres e que a taxa de desocupação entre elas, no final de 2021, alcançou 13,9% contra 9% dos homens.

Da mesma forma, os salários são desiguais, conforme acompanhamento da iDados a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD). Mesmo diante das adversidades, estudo da Grant Thornton acende uma luz no fim do túnel mostrando que 38% dos cargos de liderança já são ocupados por mulheres. Sinal vermelho: o percentual foi maior em 2021 (39%). Sinal verde: subiu em relação a 2019, quando era de 25%.

Visão holística como diferencial feminino

Ex-secretária de Planejamento e Gestão do governo cearense, a economista Desirée Mota, que já trabalhou em plataforma de petróleo, passou pelo ramo automotivo e pelo mercado financeiro, tem experiência para apostar nas soft skills femininas, as habilidades como grandes diferenciais para reduzir a desigualdade histórica de gêneros no mundo corporativo.

Com outros cinco sócios, Desirée fundou o Instituto de Desenvolvimento Econômico, Social e Empreendedorismo (IDESE) há um ano, onde é diretora-presidente, aproveitando a experiência de todos e a sua própria de 29 anos no Sebrae.  O objetivo é oferecer consultoria e treinamento, independentemente de sexo.

“O mercado está buscando mulheres pela essência do seu comportamento e pela sua capacidade de contextualização nas relações humanas”.

Desirée Mota acrescenta outras habilidades femininas bem-vindas ao mundo dos negócios: maior poder de negociação, de entregas, de dedicação, espírito colaborativo, visão holística e, ainda, um maior comprometimento com questões ambientais. “Este perfil é, sem dúvida, o divisor de águas para que as mulheres alcancem posições mais altas nas empresas, como CEOs, sem que precisem desconsiderar o fator emocional e o envolvimento materno, que o home office mostrou que não é uma barreira”, sentencia.

Mulheres na transformação digital

Fundadora e CEO do Social Brasilis, que atua com programas sobre tecnologia e preparação para a transformação digital para a base da pirâmide e por intermédio de empresas e fundações, Manu Oliveira concorda que a sensibilidade feminina pode fazer a diferença no ainda longo caminho a ser trilhado.  No seu segmento de atuação, por exemplo, a representatividade de lideranças femininas é baixa porque envolve tecnologia, engenharias e base científica para fundamentar projetos.

Segundo a Unesco, apenas 30% das mulheres no mundo são cientistas. Nas carreiras do futuro como processamento de dados, tecnologia e inovação, a representatividade é também pequena.

“Me preocupa a falta de senso de futuro nas corporações em geral dominadas por homens sobre o impacto social da nova economia digital e que as mulheres podem contribuir muito”.

Mulheres no mercado de venture capital

Administradora de Empresas com especialização, mestrado e doutorado, e com experiência dentro e fora do Brasil, Robertta Mota tem uma bagagem maior do que sua idade (46 anos). No mundo corporativo atuou em cargos eminentemente masculinos, caso de Esso, Oracle e HP, que lhe deram o perfil mais pragmático focado em resultados, como é a característica de empresas multinacionais.

No Brasil, como consultora da Federação das Indústrias do Ceará (FIEC) e pesquisadora do CNPQ em projetos de cooperação internacional e intercâmbios, ingressou no universo das indústrias de base tecnológica, fato que a levou ao mercado de biocombustíveis, de domínio dos homens. “Não enfrentei nenhum empecilho ou preconceito”, garante, entendendo que o sacrifício maior das mulheres é superar a insegurança e não demonstrar fragilidade para que não confundam com falta de competência.

“Intuição e doçura não desqualificam, ao contrário, facilitam as relações e geram resultados”.

A paixão maior ainda estava por vir. É o mercado de “venture capital” (capital de risco). Robertta leu muito, pesquisou e descobriu o Fundo Criatec (BNDES e BNB) e que no Ceará o Fundo não tinha um gestor regional. “Na cara e na coragem fui atrás, me apresentei como preparada para assumir”, conta ela. E assumiu.

Para Robertta Mota, uma postura que independe de gênero é saber que com saúde se pode tudo. Basta ter disposição para aprender. E hoje, como fundadora e diretora da I-Ventures, multiplica riqueza, comprando e vendendo participações em empresas e projetos, numa trajetória empreendedora que não tem limites. “Trata-se de um verdadeiro campo de batalha que me estimula”, diz ela, que também é credenciada como gestora da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Mulheres no ar

Outro setor que abriu as portas para o sexo feminino foi a aviação. Há alguns anos, elas eram apenas quatro nas duas maiores companhias aéreas brasileiras: Varig e Vasp. Com o tempo, a figura feminina na recepção aos passageiros na entrada da aeronave foi se tornando mais comum, ainda que nem tanto. A comandante Gabriela Duarte ainda vê olhares de surpresa, mas favoráveis, dos passageiros que transporta, ao se depararem com uma mulher piloto.

A carioca de 47 anos formada em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) recebeu propostas para estágios e emprego no mundo corporativo, mas preferiu perseguir o sonho de pilotar aviões desde a sua infância.  

Gabriela foi à luta em busca de cursos e horas de voo desde 1996, tendo passado pela experiência de ser instrutora em aeroclube para ficar mais perto do sonho do primeiro emprego em 2001. Começou na Nordeste (Varig), depois foi para a Ocean Air (Avianca) e desde 2004 está na GOL voando pelo Brasil. “Não vejo impedimento nenhum por ser mulher”, assegura ela, recomendando, entretanto, que é preciso sempre buscar aperfeiçoamento e atualização para garantir eficiência.

Eficiência e capacidade formam a condição básica profissional repetida pela Comandante Luciana Faria de Oliveira Lourenço Matos Vaz, de Campinas, que pilota os aviões da Azul, antes mesmo da fusão com a Trip Linhas Aéreas.  A motivação para a escolha da profissão veio da infância quando ia com os pais a Viracopos ver os pousos e decolagens. A decisão foi tomada aos 10 anos, após assistir a um show da Esquadrilha da Fumaça. “Um dia vou estar lá no céu”, anteviu.

Formada em Técnico em Contabilidade, não hesitou em buscar a formação de piloto com a ajuda financeira dos pais. “A escada da aviação é gradual e permite subir cada degrau a seu tempo”, diz ela. Luciana persistiu e se preparou para realizar outro sonho, o de ser mãe da Gabriela, de oito anos, cujos cuidados são divididos com o marido, também piloto, e com a mãe, diante das jornadas de trabalho de até 11 horas com 12 horas de folga, podendo ficar fora de casa até seis dias. E acomodando a rotina como instrutora no simulador, o que permite ficar mais na base.

“Ser mulher não pode ser usado como muleta”, afirma, declarando-se contra quaisquer sistemas de cotas por defender a necessidade de ser avaliada pela competência. Ela lembra que, no caso da Azul, a Companhia até incentiva a presença de mulheres em sua equipe.

Mulheres no mar

Isolada no mar de dois a três meses navegando na rota Manaus-Tramandaí (RS), a 2ª Oficial de Náutica, Amanda Pontes, é uma das ainda poucas mulheres em embarcações no Brasil. A sua própria tripulação, por exemplo, reflete esta realidade: dos 26 tripulantes, há duas Oficiais de Náutica, uma é ela e a outra é enfermeira.

Comandante de navio Amanda Pontes (Foto: Arquivo Pessoal)

A cearense, que ainda no Ensino Médio, aos 16 anos, já sabia o que queria fazer, cursou a Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante. Em sua turma de 147 alunos, havia apenas 32 meninas.

O barco que tripula ao longo da costa brasileira (navegação de cabotagem) transporta derivados de petróleo, o que, pela natureza do produto, reforça ainda mais a sua responsabilidade sobre os equipamentos de segurança (extintores, redes e sistemas). Também responde pela Salvatagem (botes, balsas, barcos e coletes de emergência), além de equipamentos, treinamento e a própria carga transportada.

“Atenção permanente é a preocupação de quem vive em ambiente confinado e em minoria”, alerta ela, acrescentando que “é necessário se manter ativa e altiva para garantir o respeito profissional”.

Mulheres na tribuna

A escassa representatividade feminina é expressa também no mundo político, embora as candidaturas femininas tenham batido recorde este ano, com 33,3% dos registros nas esferas federal, estadual e distrital. Segundo acompanhamento da Agência Senado, as mulheres são 53% do eleitorado brasileiro (82 milhões de votantes), mas ocupam somente 7,28% das cadeiras no Senado.

A legislação começa a avançar, ainda que lentamente, com a Lei 12.034/2009, assegurando um percentual mínimo de 30% e limitando a 70% as candidaturas de cada sexo, com destinação de, pelo menos, 30% dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, e do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV.  Na disputa pela presidência, igualmente, algo mudou e dos cinco candidatos com mais de 1% das intenções de votos, duas são mulheres: Simone Tebet e Soraya Thronicke.

Mulheres no setor público

À frente da Assessoria Especial de Acolhimento aos Movimentos Sociais (Asemov) da Casa Civil do governo cearense, Zelma Madeira é uma liderança negra no Ceará que tem um pensamento bastante crítico em relação à posição das mulheres no mundo do trabalho.

“Temos uma sociedade campeã em desigualdade de gênero e de raça que guarda um ranço patriarcal”.

Ela exemplifica com o fato de praticamente todas as profissões terem começado com cunho mais masculino e só posteriormente abriram espaço pela força e resistência dos movimentos femininos e também pela posição de homens que têm a consciência da igualdade.

Filha de um trabalhador da construção civil e de uma costureira, ela diz que venceu as barreiras pela inteligência dos pais, que apostaram no poder transformador da educação. Com boa formação, aperfeiçoamento constante, com mestrado e doutorado, ela acredita que vai impondo posição. “Vocês podem ocupar quaisquer postos”, dizia a mãe dela. Zelma confiou e seguiu a carreira de docente na Universidade Federal do Ceará. Agora integra a equipe de governo como gestora com status de secretária.

Ela entende que as mulheres avistam melhor os problemas e apontam soluções. “Basta termos oportunidades para assumirmos com competência qualquer desafio na sociedade contemporânea”, finaliza.

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