crédito de carbono na caatinga

Muitas empresas começam a estabelecer suas metas de redução, gerando um crescimento na demanda e no preço do crédito de carbono voluntário. (Foto: Envato Elements)

De olho no crédito de carbono, produtores da Caatinga criam cooperativa

Por: Pádua Martins | Em:
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Uma nova semente acaba de ser plantada na Caatinga: a Associação dos Produtores de Crédito de Carbono Social do Bioma Caatinga e a Cooperativa dos Produtores de Crédito de Carbono Social e Agricultura Familiar da Caatinga (localizada no município de Delmiro Gouveia, em Alagoas). Essa é a primeira iniciativa para negociação de créditos de carbono da região, especificamente do cânion do Rio São Francisco, nos estados de Alagoas, Sergipe, Bahia e Pernambuco.


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A “colheita” pode promover a mudança do perfil socioeconômico dos moradores desse importante bioma brasileiro, que corresponde a 70% do Nordeste, algo em torno de 734 mil quilômetros quadrados encravados em nove estados da região, isso sem contar o norte de Minas Gerias (o que elevaria para 844 mil km²). E, claro, preservar o meio ambiente. A Caatinga representa 11% do território brasileiro.

Sérgio Xavier, coordenador dos Labs de Economia Regenerativa do Centro Brasil no Clima (CBC) e ex-secretário de Meio Ambiente de Pernambuco, informa que a iniciativa faz parte do trabalho realizado pelo Laboratório (CBC) e o Instituto Clima e Sociedade (ICS). Ambos procuram desenvolver soluções econômicas adaptadas a realidade da Caatinga, objetivando sua preservação e recuperação do bioma.

A ideia de levantar o estoque de carbono das áreas preservadas e construir um modelo de gestão dos créditos surgiu depois da constatação de que o crédito de carbono precisa de grandes volumes de matas plantadas e preservadas, o que exclui os pequenos produtores rurais e beneficia apenas grandes proprietários de terras.

Ele ressalta que a iniciativa é pioneira e surge com o conceito de economia regenerativa. A inovação é criar cadeias produtivas que recomponham o ambiente natural enquanto criam um sistema de proteção não só para o bioma, mas para as pessoas que dependem dele. A ideia não é só entrar no mercado de carbono, mas reduzir as desigualdades sociais.

Além disso, o Integrante do CBC afirma que na Caatinga, um dos biomas mais vulneráveis ao aquecimento global, onde vivem 28 milhões de pessoas, na maioria de baixa renda, a legislação permite que sejam desmatadas até 80% das propriedades, sem qualquer incentivo aos agricultores que preservam áreas além dos limites mínimos legais.

“A ideia de criar cooperativas de carbono visa desenvolver modelos de negócios que possam, simultaneamente, beneficiar os pequenos proprietários, incentivar a preservação de áreas nativas, criar uma nova cultura de conservação da biodiversidade e impulsionar uma nova economia regenerativa para substituir o velho modelo degradador e desigual”.

Sérgio Xavier, coordenador dos Labs de Economia Regenerativa do CBC

Sérgio Xavier, coordenador dos Labs de Economia Regenerativa do Centro Brasil no Clima (CBC) (Foto: Luciana Nunes)

Sobre quais as vantagens principais que a iniciativa pode trazer para a região da Caatinga (tanto social como econômica, bem como ambiental), Sérgio Xavier é enfático: desenvolvimento de cadeias econômicas regenerativas, com energias renováveis, créditos de carbono, reciclagem, produtos naturais, agricultura de baixo carbono e etc. possibilita, simultaneamente, promover negócios sustentáveis, regenerar o meio ambiente, gerar empregos verdes e criar uma nova cultura de desenvolvimento. Este modelo está sendo desenvolvido na Caatinga, mas poderá ser aplicado em qualquer bioma.

Trabalho em andamento

A iniciativa – explica Xavier – está na fase de formulação de modelos, levantamento de áreas preservadas, estruturação de cooperativas, cálculo de créditos e articulação de investidores. Estão sendo estudadas formas de agregar ao crédito de carbono convencional valores adicionais, considerando preservação da biodiversidade, inclusão social e recursos para impulsionar projetos cooperativos de bioeconomia e de energias renováveis.

“A ideia é que os investidores possam impulsionar negócios socioambientais e recebam dividendos em créditos de carbono. Com a urgência climática e a regulamentação do mercado de carbono no Brasil e no mundo, serão abertas imensas oportunidades para modelos econômicos de descarbono, visando reduzir os gases de efeito estufa e reverter as mudanças climáticas. Essa experiência pioneira visa criar referências para aproveitar esses novos horizontes”.

Ele acrescenta que a criação da Associação e da Cooperativa visa desenvolver um modelo econômico inédito que possa recuperar o bioma, conter processos de desertificação, conservar bacias hidrográficas, impulsionar energias renováveis e, sobretudo, reduzir desigualdades. Sobre como os pequenos produtores podem participar, ele diz ser bem simples: basta se cada um participar de “uma cooperativa que esteja estruturada para somar créditos dos participantes, obter certificações aceitas internacionalmente, remunerar proporcionalmente os cooperados e desenvolver empreendimentos que gerem novos créditos e dividendos para os investidores”.

Em termos de recursos, Xavier acredita que as “potencialidades são enormes”. Após a consolidação, o modelo em desenvolvimento poderá ser implantado em larga escala, com inúmeras cooperativas e projetos associados. Todos os estados nordestinos e das demais regiões podem ser beneficiados, pois o modelo poderá ser replicado em todos os biomas do Brasil. Para concluir, ela informa que a ideia engloba outras iniciativas, como energia solar e de biomassa.

Potencial brasileiro

De acordo com artigos publicados pela consultoria McKinsey, o Brasil concentra 15% do potencial global de captura de carbono por meios naturais e que mercado de créditos deve saltar de US$ 1 bilhão (atual) para US$ 50 bilhões em 2030. Empresas que já estão engajadas em compensar suas emissões de carbono enfrentam cada vez mais dificuldade para garantir a mesma quantidade de créditos de anos anteriores.

A demanda por créditos de carbono voluntários – segundo a consultoria – vem crescendo junto com a relevância da agenda Environment, Social and Governance (ESG), mas a oferta de créditos ainda é baixa e seu preço tem aumentado brutalmente. E para ajudar a limitar o aquecimento global a 1,5°C até 2050, empresas do mundo inteiro estão estabelecendo metas de carbono zero ou neutralidade de carbono (net zero), ou seja, zerar as emissões líquidas de carbono de suas operações.

Existem duas maneiras de precificar o carbono: via órgãos reguladores, por meio de um imposto de carbono ou de um sistema de comércio de emissões, ou voluntariamente, com uma precificação interna de carbono ou um mercado voluntário de carbono – explica a consultoria McKinsey. Ela chama a atenção para o fato do Brasil ter iniciado a regulamentação do seu mercado de carbono com o Decreto Presidencial nº 11.075, de 19 de maio de 2022. No entanto, o mercado voluntário já vem dando seus passos iniciais, porém com múltiplos desafios.

A oferta de créditos de carbono no mercado brasileiro ainda é baixa: são emitidos atualmente menos de 1% do potencial anual do país, majoritariamente com créditos de projetos de conservação e geração de energia a partir de resíduos. Enquanto isso, muitas empresas começam a estabelecer suas metas de redução, gerando um crescimento acelerado na demanda e uma escalada do preço do crédito de carbono voluntário, com tendência contínua de alta para os próximos anos.

“No cenário global, é estimado que a demanda por créditos de carbono possa aumentar 15 vezes ou mais até 2030, e até 100 vezes até 2050. O mercado de créditos de carbono deve saltar de aproximadamente US$ 1 bilhão em 2021 para um mercado de pelo menos US$ 50 bilhões em 2030”.

Das 80 principais empresas que atuam no Brasil, a consultoria estima que 77% já publicaram alguma meta de redução de emissões e 56% ainda não estão alinhadas às recomendações da comunidade científica para atingir o limite de 1,5°C. Além disso, 41% ainda não se comprometeram a se tornarem neutras em carbono.

Caso seja considerado apenas os atuais compromissos das empresas mapeadas, a demanda por crédito de carbono voluntário no Brasil deve chegar a 7 milhões de toneladas de CO2eq (carbono equivalente) em 2030, o que representaria aproximadamente US$ 200 milhões. Porém, conforme novos compromissos são anunciados, ademanda total pode chegar a 90-220 milhões de toneladas de CO2eq de acordo com o estudo realizado, o que, dentro dos diferentes cenários de oferta e preço, pode representar um mercado de US$1,5 a 6 bilhões.

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