“A pecuária do Brasil, nos próximos 10 anos, vai vir para o Nordeste. E nós temos que estar preparados para receber esses animais, esse grande mercado”. É o que prevê o presidente Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (FAEC), José Amílcar de Araújo Silveira. Em entrevista exclusiva para a Plataforma TrendsCE no encerramento da PEC Nordeste 2023, realizada de 15 a 17 de junho no Centro de Eventos, em Fortaleza, o empresário disse acreditar que o setor, assim como agronegócio cearense, vai passar por crescimento nos próximos anos.
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Amílcar Silveira é categórico ao afirmar que as regiões mais nobres para o agronegócio, como Sudeste e Sul, por exemplo, não “suportam mais gado porque tem atividades mais lucrativas. E esse é um movimento natural. E diante dessa realidade é chegada a hora do Nordeste”. Ele explica que a pecuária de corte, historicamente no mundo inteiro, está nas áreas mais hostis, como o Nordeste. “É o caso da região do Texas, nos Estados Unidos, onde aliás tem o cowboy americano, o texano. E aqui, na nossa região, temos o vaqueiro”.
No caso específico da pecuária cearense, o presidente da FAEC analisa o setor sob dois ângulos: a atividade voltada para a produção de leite e a de corte. O Estado atualmente é o terceiro maior produtor de leite do Nordeste e, em 2017, de cada dez maiores produtores do Brasil, três estavam no Ceará, mas “infelizmente perdemos a posição porque não evoluímos”.
FAEC confiante na recuperação da pecuária
Amílcar está confiante na recuperação desse e de outros setores do agronegócio, sobretudo pelos acordos fechados, inclusive com o Governo Estadual, na PEC 2023. Amílcar Silveira adiantou que Governador do Estado se comprometeu com o setor pecuário a assinar a desoneração da cadeia produtiva do lacto, o que é importante, pois vai permitir atrair investimentos para o Ceará.
Depois de considerar 2023 como um ano muito bom para o setor agropecuário cearense e que espera crescimento de 5% este ano, Amílcar garantiu que o que falta para alavancar o agronegócio no Estado são políticas públicas, uma vez que “fomos deixados no segundo plano por décadas, pois a prioridade estava na industrialização e outras coisas e nada com relação ao setor primário. E isso é um erro, pois setor primário é um gerador de energia”.
“O que você gera no setor primário tem consequência no terciário. Agora, nós estamos acreditando na sensibilidade do governador Elmano de Freitas, que é produtor rural, inclusive. Por isso, acreditamos que teremos um bom ano, fruto de uma parceria com o Governo.”
Amílcar Silveira, presidente da FAEC
Durante a PEC 2023, o governador Elmano de Freitas, o secretário do Desenvolvimento Econômico do Ceará, Salmito Filho, o presidente da Agência de Defesa Agropecuária do Ceará (Adagri), Elmo Aguiar, e o presidente da FAEC, Amílcar Silveira, assinaram ainda um acordo para a implantação do programa Sim Mais, que permitirá aos municípios emitir o selo de inspeção agrícola. Na ocasião, o governador defendeu a integração de ações para ampliar a capacidade das cadeias produtivas, melhorar a infraestrutura e tecnologia no campo e a segurança alimentar.
O presidente da FAEC e a superintendente estadual do Banco do Nordeste (BNB), Eliane Brasil, assinaram um termo de compromisso que irá promover capacitação para 100 técnicos do Senar, além do atendimento de 628 produtores com vocação empreendedora. Também foi celebrada a contratação de R$ 7 milhões por meio do Cartão BNB Agro para investimento e custeio. Amílcar Silveira e a chefe-geral da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), Ana Clara Rodrigues Cavalcante, assinaram um acordo com a finalidade de capacitar técnicos cearenses.
Aliás, em março deste ano, Amílcar Silveira esteve reunido com o secretário do Desenvolvimento Econômico do Ceará, Salmito Filho, onde apresentou propostas para o Plano de Desenvolvimento da Agropecuária Cearense. Na oportunidade, ele afirmou que uma das metas do plano é gerar 90 mil empregos e dobrar a produção do agronegócio cearense. O plano propõe o fortalecimento e o crescimento da agricultura e agropecuária por meio de assistência técnica e inovação.
“Queremos promover, com apoio do Estado, uma agropecuária sustentável, aumentando a capacidade empreendedora e a competitividade do setor, por meio de assistência financeira para a realização de projetos no campo.”
Amílcar Silveira, presidente da FAEC
Participação no PIB Cearense
A participação do agronegócio cearense (agropecuária e agroindústria) no Produto Interno Bruto (PIB) é de 19%, segundo dados do Centro de Inteligência e Inovação da Agropecuária (Ciiagro) da FAEC. “Se considerarmos o PIB da agropecuária e o da agroindústria, temos quase 20% de participação na riqueza produzida pelo Ceará”, diz o presidente da FAEC, Amílcar Silveira.
“Os grandes e pequenos laticínios, por exemplo, processam o leite que a pecuária produz para fazer queijo, requeijão, iogurte e uma variada lista de produtos. E toda essa produção faz parte do agronegócio” – ressalta. De acordo com o Ciiagro, com a parceria entre FAEC e Ministério da Agricultura (Mapa), a tendência é de que a participação do agronegócio na economia do Ceará continue em trajetória de crescimento.
A importância do agronegócio
Para o consultor e economista rural Mavignier França, Doutor em Desenvolvimento e Meio Ambiente e aposentado do BNB, ao analisar a importância do agronegócio, observa que o Brasil está nos trópicos e o Nordeste/Ceará mais ainda. “Essa é uma grande vantagem competitiva para produção de alimentos por conta dos menores custos de produção e da melhor qualidade e produtividades da produção”.
Dos quatro grandes negócios do Brasil (agronegócios, mineração/petróleo, turismo e energia limpa) três são decorrentes da condição tropical do Brasil. A importância do agronegócio decorre dos menores custos de produção em relação ao mundo, do uso de terras baratas, do emprego de mão de obra, da demanda pela nossa produção e por promover o desenvolvimento do interior do Brasil – explica.
Mavignier: carne do Nordeste é mais saborosa, competitiva
Especificamente sobre o setor pecuário, Mavignier França frisa que o Brasil produz o chamado “Boi Verde” enquanto os concorrentes produzem o boi de confinamento, que tem um elevado custo. Além disso, “nossa carne é mais saborosa, mais competitiva. Por isso é mais demandada. Ele ressalta que todos os segmentos pecuários do Brasil tiveram grande desenvolvimento tecnológico e na produção.
“Das atividades pecuárias (bovino de corte, bovino de leite, suíno, aves, ovinocaprinocultura), apenas a última ainda não alcançou a produção demandada pelo mercado, sendo esta atividade um grande potencial para o Nordeste e o Ceará. A pecuária leiteira do Ceará é moderna e competitiva, enquanto a de corte é de baixa competitividade”.
Mavignier França, Doutor em Desenvolvimento e Meio Ambiente
Sobre as vantagens e desvantagens do Nordeste para a pecuária, Mavignier ressalta, como vantagens: a melhor sanidade dos animais; a proximidade do mercado consumidor regional; a tradição das explorações pecuárias; a oferta de alimento diversificado e abundante (pastagem nativa) durante a quadra invernosa e linhas de financiamento do BNB/FNE a custos baixos. Como desvantagens: as frequentes secas e invernos irregulares, capacidade empresarial limitada e estrutura fundiária limitadora (minifúndios) para expansão da pecuária de corte.
Transnordestina vai elevar competitividade da pecuária
Ele acredita, no entanto, que a conclusão da Ferrovia Transnordestina tornará mais competitiva a avicultura, a pecuária de leite e a suinocultura do Nordeste e do Ceará para os mercados interno e externo. Lembra que o Nordeste é a região da América Latina mais próxima dos Estados Unidos, Europa e Ásia, via novo Canal do Panamá.
Sobre o que falta para incrementar o crescimento da pecuária da região, ele foi taxativo: conclusão da Transnordestina; construção de açudes de médio e grande portes para irrigação de pastagem, formação de conglomerados empresariais, alianças internacionais com compradores e apoio governamental na dotação de infraestrutura e de suporte.
Para ele, é possível melhorar a competitividade da pecuária de leite, ovinocaprinocultura e avicultura no semiárido nordestino. “A piscicultura e a carcinicultura são duas atividades do Nordeste ainda muito tímidas, mas com grande potencial de crescimento”. Sobre se o Nordeste pode vir a exportar produtos da pecuária, o consultor e economista rural adianta “que não exporta porque o mercado interno compra tudo. Tem demanda forte por camarão e tilápia. Outros produtos pecuários poderão ser exportados (os canais já existem), mas não temos produção suficiente para isso”.
Sobre o setor de frutas, ele diz que o grande limitador é a segurança hídrica. “Muitos empresários não querem correr esse risco. Equacionado a oferta de água, poderemos ser o maior ofertador de frutas, hortaliças e flores para o mundo. Nossa fruta é exótica e saborosa, produz o ano inteiro. Há grande diversificação de produtos e grande competitividade. Têm que ser feitas transposições, açudes e adoção de tecnologias de uso racional de água” – conclui.
BNB e a bovinocultura de corte
De acordo com avaliação do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene), do Banco do Nordeste (BNB), os preços da carne bovina devem permanecer elevados ao longo de 2023 e gerar bons negócios aos produtores. A estimativa é que a demanda global pelo produto cresça puxada, principalmente, pela China, que deve aumentar seu consumo em 5,9%, chegando a 10,85 milhões de toneladas.
O BNB, para apoiar a atividade na retomada das vendas, estima contratar mais de R$ 3,5 bilhões para bovinocultura de corte, valor equivalente ao registrado em 2022. Na comparação com 2021, o banco aumentou em 10% o volume de contratações.
“A bovinocultura de corte tem agregado tecnologia e inovações ao processo de produção com melhoria de produtividade e da rentabilidade atendendo, ainda, requisitos relacionados à sustentabilidade ambiental. Damos atenção especial aos mini e pequenos produtores priorizando investimentos que permitam melhoria da genética dos animais, manejo alimentar e sanitário e reserva estratégica alimentar, notadamente no Semiárido.”
Luiz Sérgio Farias Machado, superintendente de Agronegócio e Microfinança Rural do BNB
A China continua sendo o principal destino da carne brasileira e, ainda, aumentou sua participação de 39,22% em 2021 (723 mil toneladas) para 54,72% em 2022 (1,24 milhão de toneladas). No acumulado anual de 2022 em comparação com o mesmo período de 2021, o Brasil aumentou as vendas de carne em 40,88% (US$) e 22,66% (Kg) e exportou carne bovina para 153 países.
Dos R$ 892 milhões contratados em 2022, a pecuária teve maior participação
De acordo com a Assessoria do BNB, todos os estados atendidos pela Instituição apresentaram crescimento acima de 20% nas contratações de agronegócio e agricultura familiar em 2022. No caso do Ceará, o aumento foi de 42%. Ao todo, houve contratação de R$ 892 milhões em mais de 77 mil operações, entre janeiro e dezembro do ano passado. O resultado foi puxado pela pecuária, que respondeu por R$ 674 milhões. O restante ficou com agricultura.
As contratações do Banco do Nordeste (BNB) destinadas ao agronegócio e agricultura familiar, realizadas em 2022, somaram quase R$ 15 bilhões em toda área de atuação da Instituição. Os valores correspondem às mais de 626 mil operações com recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE), que beneficiaram clientes de todos os portes, inclusive agricultores familiares. Os financiamentos realizados entre janeiro e dezembro de 2022 representam um acréscimo de 43% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Os produtores rurais, pessoas físicas e jurídicas, contrataram R$ 10,2 bilhões em 12.714 operações. Em relação à agricultura familiar, foi contratado o montante de R$ 4,7 bilhões, distribuídos em 613.548 operações. Do valor total contratado, 56% foi com agricultores familiares, mini e pequenos produtores rurais, demonstrando a prioridade do banco no atendimento a esse público. O BNB é hoje o principal agente financeiro do agronegócio em sua área de atuação, respondendo por 51,6% do crédito rural da região.
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