O avanço acelerado das novas tecnologias tem causado mudanças profundas em vários setores da economia. E um deles é a área da saúde, sobretudo a partir da pandemia do coronavírus (Covid-19). O crescimento das chamadas healthtechs, ou seja, empresas de tecnologia voltadas para a área da saúde, tem sido observado em todo o mundo. Em alguns países com muita velocidade e em outros nem tanto. Mas, o mercado tem atraído cada vez mais investimentos e nos próximos anos sua expansão será ainda maior.
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Somente nos últimos cinco anos, o total de healthtechs no Brasil duplicou e hoje soma mais de mil, de acordo com pesquisa do Distrito Healthtech Report Brasil/2022. O levantamento revela que, entre 2016 e 2020, metade das startups de saúde foram abertas e que em 2015 eram 265. Como consequência da elevação, os investimentos também passaram por incremento.
O valor investido no setor, desde 2020, representa 72,3% do total na última década. A pesquisa mostra que, em 2019, foi registrado maior parte do investimento, isso em relação aos anos anteriores, mas durante a pandemia os aportes foram maiores em 5,1% em 2020 e de 37,1% em 2021.
E segundo estudo do Global Market Insights, o mercado, até 2025, deve alcançar o tamanho de US$ 504 bilhões. A área, no Brasil, ainda está na fase inicial, mas justamente por isso oferece grandes oportunidades para investimentos. É, sem dúvida, um dos segmentos mais promissores, ainda mais porque as healthtechs unem tecnologia e saúde.
A Startupi, tendo como base relatório da Liga Ventures, rede de inovação aberta que conecta startups e grandes empresas para geração de negócios, com apoio da PwC Brasil, mostra que as healthtechs brasileiras estão divididas em 35 categorias, sendo as principais: gestão de processos (6,92%); planos e financiamento (6,54%); bem-estar físico e mental (6,15%); buscadores e agendamentos (5,96%); exames e diagnósticos (5,77%); saúde no trabalho (4,23%); inteligência de dados (4,23%); capacitação, informação e educação (3,85%); infraestrutura para telemedicina (3,65%); prontuário, prescrição e triagem (3,46%); marketplace de medicamentos e equipamentos (3,46%).
Já com relação ao ano de fundação das startups, 36% foram criadas entre 2019 e 2022. Sobre os investimentos no setor, é possível ver que foram realizados 38 deals entre janeiro de 2022 e junho de 2023, que movimentaram R$ 1,3 bilhão. As startups de planos e financiamento (24%), infraestrutura para telemedicina (16%) e buscadores e agendamentos (14%) tiveram a maior participação no montante total investido no período.
O levantamento também aponta as regiões com maior distribuição de startups ativas. No primeiro lugar do ranking está São Paulo (50%), seguido de Rio de Janeiro (8%), Minas Gerais (8%), Rio Grande do Sul (7%), Santa Catarina (5%), Paraná (5%), Pernambuco (3%), Espírito Santo (3%), Goiás (2%) e Ceará (2%). Outro dado interessante se refere à análise da maturidade das startups mapeadas, onde 34% são emergentes, 30% estão estáveis, 24% são nascentes e 12% delas disruptivas.
O médico Rafael Kenji, CEO da FHE Ventures, diz que o uso de novas tecnologias na área da saúde permite a escala de soluções criadas para resolverem problemas latentes enfrentados pelo setor da saúde. Dentro do setor de equipamentos e tecnologias de ponta, a grande maioria do investimento é direcionada ao tratamento de condições clínicas e cirúrgicas, além do diagnóstico, liderado por grandes empresas como Philips, Siemens, GE Healthcare e mais recentemente com investimento das bigtechs Apple, Meta, Amazon e Microsoft.
“Já na área da inovação, as chamadas healthtechs, ou startups de saúde, ganharam escala, desenvolvendo softwares que permitem a resolução de problemas latentes na sociedade, divididas em grandes categorias, como a telessaúde, prontuário eletrônico, inteligência artificial e big data, marketplace em saúde, wellness e bem-estar, dentre outros.”
Rafael Kenji, CEO da FHE Ventures
Quanto ao número de healthtechs no Brasil, Rafael Kenji afirma que, segundo o último mapeamento, realizado em 2022, já são mais de mil, número que atualmente se aproxima das 1.500 startups de saúde mapeadas. Mas esse número – observa – pode ser bem maior, pois o mapeamento é feito por hubs de inovação e não por órgãos de registro das empresas, como as Juntas Comerciais, que fazem o registro dos CNPJs.
Sobre qual o ramo da saúde mais impactado pelas novas tecnologias no mundo e no Brasil, Kenji informa que, atualmente, o uso da Inteligência Artificial tem se destacado, com um ganho expressivo no ramo da medicina diagnóstica e preditiva, focada em identificar padrões de adoecimento e prevenir agravos em saúde. Dados da OMS demonstram que a cada R$ 1,00 gasto com prevenção, outros R$ 4,00 são economizados com tratamento, além do ganho imensurável de qualidade de vida, aumento da expectativa de vida e de produtividade dos indivíduos afetados.
Rafael Kenji observa que não existe limite para o avanço do uso das tecnologias, já que elas são criadas para resolver problemas enfrentados pelos setores, sempre com o foco em apoiar o setor e melhorar a qualidade do serviço. Sempre existirá um problema a ser resolvido, na área da saúde e em todas as áreas.
“As healthtechs tendem a crescer cada vez mais, com um volume ainda bem grande de investimento, mesmo que esse crescimento seja desacelerado, devido a diversos fatores como a inflação, a crise financeira internacional e conflitos como o da Ucrânia, Síria, Iêmen, Afeganistão e alguns outros conflitos que também interferem no desenvolvimento internacional, e como consequência, no direcionamento de recursos.”
Rafael Kenji, CEO da FHE Ventures
Ele ressalta que sempre que existe uma grande necessidade de investimento em algum setor, a inovação acontece. “Na saúde, essa inovação é – infelizmente – impulsionada por pandemias e guerras, que geram uma crise global e muitas vezes humanitária, que precisam ser resolvidas com urgência, gerando mais celeridade no setor para resolver esses grandes problemas, e com maior escala”.
Para concluir, Rafael Kenji frisa que o foco do desenvolvimento de soluções inovadoras na saúde precisa seguir três principais pontos: acesso, informação e equidade. Com esses três focos, é possível atingir o conceito do Triple Aim, melhorando a qualidade do serviço, evitando custos desnecessários e desperdícios, além de melhorar a saúde de forma global.
Perguntado se as novas tecnologias podem trazer desemprego no setor de saúde de forma geral, ele é categórico: Não. “As tecnologias são criadas para apoiar os setores, além de melhorar a qualidade do serviço e o acesso. O mercado precisa se adaptar, de modo a utilizar as novas tecnologias, não ter medo de uma substituição da força de trabalho”.
Gabriella Bruno, Gestora do ICC Biolabs, hub de inovação em saúde do Grupo ICC, entende que a saúde, dentre muitas outras das áreas, é a que mais causa preocupação, tanto para o indivíduo, que quer viver mais e melhor, como para as instituições que são provedoras de saúde, como hospitais e centros de saúde, sejam estes públicos ou privados. “Quando falamos de inovação nessa área, falamos de tornar mais fácil a vida do paciente e/ou facilitar a entrega da manutenção da saúde pelos provedores da mesma”.
“Trata-se de tecnologias para melhorar o acesso a serviços de saúde, melhoria de processos dentro de ambientes hospitalares, gestão de sistemas de saúde, gestão e segurança de dados de saúde, novas formas de próteses e órteses, redes de clínicas com modelos de negócios inovadores, pesquisa e desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas, digitalização da saúde, monitoramento de sinais vitais em tempo real, o cuidado remoto, medicina personalizada, predição genética de doenças hereditárias, medicina preventiva, terapias alternativas e acompanhamento da jornada do paciente.”
Gabriella Bruno, gestora do ICC Biolabs
Autoatendimento, Inteligência artificial, telemedicina, internet das coisas, biotecnologia, análise preditiva e plataformas digitais são as tecnologias mais encontradas na área da saúde a nível mundial. No Brasil – ressalta Gabriella Bruno – a transformação digital na saúde está caminhando a passos mais acelerados nos últimos três anos, com a regulamentação da telemedicina, além da comprovação que o surgimento rápido de novas tecnologias para a saúde pode ser eficaz, a exemplo da vacina nacional para a Covid-19.
Gabriella explica que a inovação em saúde no País está em ênfase juntamente com o setor de educação. Ela cita que o relatório Healthtech Report 2022 da Distrito revela que, entre 2016 e 2022, foram criadas 60% das 1.023 startups de saúde, o que indica que o cenário nacional é de empresas jovens que tem muito a amadurecer e um mercado que ainda tem muitas oportunidades de crescimento e surgimento de novas startups. A criação de hubs de inovação especializados da área da saúde, como ICC Biolabs, Eretz Bio, confirma um olhar das grandes instituições de saúde mais voltado para investimentos em inovação e anuncia que o setor no Brasil tem a crescer mais ainda nos próximos anos.
“No Ceará, segundo mapeamento de 2022 realizado pelo Sebrae, temos 58 startups da área da saúde. No ecossistema de inovação cearense a saúde é sempre uma pauta muito observada e, além do ICC, outras corporações como Unimed e Pague Menos estão olhando para a área da inovação, sobretudo para o Venture Building (organizações que criam, validam e aceleram diversas startups simultaneamente).”
Gabriella Bruno, gestora do ICC Biolabs
As novas tecnologias para o setor da saúde – afirma Gabriella – tendem a encurtar o processo de diagnóstico, tratamento e jornada do paciente quando precisa de um cuidado mais próximo com a saúde. Além de incentivar a predição e prevenção de doenças. “Hoje vemos operadoras de saúde, como a Liv Saúde, voltadas para o cuidado integrado, personalizado e preventivo”.
Como um case sobre saúde digital, ela cita a parceria entre a Liv Saúde e a Pague Menos, na qual o convênio oferece o Pronto Atendimento Digital, utilizando a teleconsulta, dentro das farmácias Pague Menos do Ceará, possibilitando ao paciente um cuidado mais próximo, mais prático e tecnológico, sem perder a humanização.
“Outra tecnologia que chama muita atenção e que é aplicada no Hospital Haroldo Juaçaba é a predição de doenças hereditárias, principalmente a oncogenética, que consegue dar uma previsão sobre a existência de cânceres hereditários, de forma que o paciente pode realizar um protocolo de prevenção e detecção da doença de uma forma precoce” – informa.
Hoje, no Ceará e no Brasil, segundo a gestora do ICC Biolabs, dentre as áreas que mais têm impacto (com as novas tecnologias) são gestão de hospitais e clínicas, o diagnóstico personalizado, a gestão de dados de saúde, abordagens de prevenção e tratamento de doenças, engajamento do paciente ao tratamento, assistência remota e monitoramento de pacientes.
Sobre as vantagens das novas tecnologias, ela afirma que, para o cliente, é possível observar, de uma forma geral, a melhoria da sua saúde e bem-estar. Para o fornecedor do serviço pode-se destacar visibilidade, aumento da porção do mercado que a solução abrange e o próprio valor financeiro que se paga pela solução.
A pandemia trouxe sérios prejuízos inenarráveis, muitas vezes insuperáveis, em escala global – analisa Gabriella. Para o cenário da inovação em saúde houve pontos que favoreceram alguns processos, a exemplo da regulamentação da telemedicina, que veio com a pandemia e acelerou a entrada dessa modalidade de atendimento nos sistemas de saúde. Afinal, até 2020, a possibilidade de telemedicina direta médico-paciente não era permitida por lei.
A situação extraordinária obrigou o governo a emitir um decreto temporário para permitir esse tipo de serviço. Outra inovação oriunda da pandemia foi a regulamentação das assinaturas médicas eletrônicas, introduzida pela Medida Provisória nº 983/2020, que possibilitou as prescrições eletrônicas para a compra de medicamentos controlados.
Em cenários de crise, a inovação acaba sendo uma grande aliada – opina. “Então, o foco em gerar soluções rápidas e eficazes em saúde foi agregador para as startups da área. Analisando os outros setores, identifica-se uma desaceleração no número de startups sendo fundadas, porém, por conta das circunstâncias impostas pela Covid-19 no setor da saúde, o número de healthtechs aumentou e a expectativa é de que aumente ainda mais” – acredita.
Healthtechs: inovação para resolver problemas da saúde
Segmento de healthtechs movimentou US$ 344 milhões em 2021