A reindustrialização do Brasil é uma necessidade premente. E ganha espaço em vários fóruns, especialmente os que conhecem o peso da indústria de transformação na geração de riquezas. Um setor que já respondeu por mais de 40% do PIB nos anos 80 e caiu para menos de 20%, num país que deve uma resposta à sociedade. Indústria fraca ocasiona menor criação de empregos, maior desigualdade social e queda de arrecadação de imposto. Sem falar na baixa produtividade que afeta a competitividade mundial.
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Especialistas garantem que, por deficiências estruturais, a desaceleração industrial já dura quatro décadas. Conforme o IBGE, somente entre 2011 a 2021, o setor da indústria caiu de uma participação no PIB de 23,1% para 18,9%. Os percentuais variam conforme os períodos analisados, mas todos são de queda, uma realidade vivida por quem atua no setor.
Interessado em alavancar o crescimento, o governo também não desconhece o fato e sabe que a indústria precisa retomar seu protagonismo para que o País alavanque o crescimento econômico de maneira sustentável e socialmente justa. Não desconhece, também, que é na indústria que estão os empregos mais qualificados, os melhores salários e o núcleo central da inovação. Por esta razão é que nasceu uma proposta que pode virar política industrial.
Entre os vilões que atuam nesta cena persistente estão o Custo Brasil, a burocracia, a falta de infraestrutura e de qualificação do pessoal, entre outros, que somam gastos adicionais na produção de R$1,7 trilhão anuais para as empresas. O valor é inaceitável quando comparado à média das despesas dos países da OCDE.
Sabe-se que, apesar da importância do comércio e dos serviços em qualquer economia, a robustez dos números vem do chão de fábrica, que abastece o mercado interno e gera divisas externas. Com indústria forte, o Brasil pode reduzir a dependência da alta performance do agronegócio que, de novo, garantiu parte relevante do crescimento de 1,9% da riqueza nacional somente no primeiro trimestre.
Na última década, o agronegócio cresceu 2,7% ao ano em média, os serviços avançaram próximo de 1% e a indústria encolheu mais de 1% ao ano, enquanto o PIB cresceu apenas 1,5% ao ano. Os dados evidenciam a importância da retomada do crescimento industrial para impactar com maior força a economia nacional.
A boa notícia é que há sinais de formatação de uma agenda de desenvolvimento industrial que chega em boa hora, aproveitando o ambiente de transformação digital e tecnologias disruptivas. O atual governo promete investir R$ 106,16 bilhões em recursos na reindustrialização. Metade do valor (R$ 65,1 bilhões) virá do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o restante da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii).
“Todo o empenho será focado na transição energética e na descarbonização”, avisou o ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin, certo de que haverá uma nova revolução industrial, como vem anunciando o presidente Lula.
A CNI entende que há convergência de visões e diretrizes entre o setor produtivo e o governo. A gerente de Política Industrial da CNI, Samantha Cunha, acredita ser possível retomar o protagonismo da indústria nacional a partir do plano de reindustrialização do governo, que conversa com as soluções apontadas pela entidade e apresentadas em maio. São ações voltadas à descarbonização, digitalização, saúde e segurança sanitária e, ainda, defesa e segurança nacionais propostas pela CNI que constam no plano do governo a ser apresentado até o final do ano. Além destes itens, o plano oficial acrescentou segurança alimentar e infraestrutura urbana.
Satisfeita com a recriação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), a CNI está otimista com criação de uma política industrial estruturante e de longo prazo, que ultrapassa um período de governo. Samantha Cunha cita o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado recentemente, como um exemplo de alinhamento com a retomada econômica. Isto por incluir temas relacionados à transporte sustentável, educação, ciência, tecnologia, transição e segurança energética, saúde, saneamento e inclusão digital.
“São questões que melhoram o ambiente de negócios e atraem investimentos”, comenta ela, em linha com o que defendem os empresários de que o Brasil precisa de políticas públicas afinadas com os conceitos de ESG, cada vez mais vinculados à liberação de financiamentos oficiais a projetos inovadores e de grande alcance.
Pelo acompanhamento do IBGE, as perdas foram mais drásticas. A indústria de transformação reduziu sua participação no PIB de 36% em 1985 para 11% em 2021. O professor Claudio Considera, coordenador de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (FGV/IBRE),diz que a perda de posição é um comportamento normal, como ocorreu nos países mais desenvolvidos.
“O que não é normal é a perda drástica de produtividade e do mercado interno para as importações”, avalia ele, que chega a falar em extinção da indústria, caso nada seja feito.
Conforme estudo elaborado por Claudio Considera com a pesquisadora Juliana Trece, também do IBRE, a recuperação será uma tarefa árdua e de longa duração, que exigirá iniciativas continuadas de vários governos para voltar a ocupar papel relevante na economia. “E longe de medidas protetoras de importação, nem subsídios dados no passado a uma indústria nascente”, alerta.
Ele entende que o Brasil já tem uma indústria instalada que precisa melhorar a produtividade, paralisada nos níveis de 1980. E citou como bons modelos a serem seguidos a criação da Embrapa com seus 700 técnicos pesquisando novas sementes e métodos de combate às pragas, o que elevou a agricultura à posição de excelência. Ou a Petrobras, que alcançou liderança mundial em exploração de águas profundas porque investiu em centros de pesquisa junto às universidades.
A proposta do MDIC, conforme o professor Claudio Considera, é um bom passo porque foca no financiamento à tecnologia envolvendo recursos da Finep e da Embrapii. “Existem tecnologias baratas disponíveis no mundo. Basta importá-las e melhorá-las, adaptando-as às particularidades brasileiras”, garante ele, enaltecendo o fato de os recursos estarem condicionados à produção verde.
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