Basta acompanhar a participação do agronegócio nas exportações totais brasileiras nos últimos 10 anos para perceber o peso desse setor que gerou superávit de US$ 141,8 bilhões em 2022. Um segmento que nunca ficou abaixo de 40% das vendas externas nacionais desde 2012. Com produtividade crescente – sem avanço proporcional de área plantada – o agro dá a dimensão de quem já é o terceiro maior exportador mundial não só de produtos agrícolas, mas de produtos alimentícios.
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Ao exportar quase US$ 160 bilhões no último ano, representando 47,6% de todas as exportações brasileiras (US$ 334,4 bilhões), o Brasil levou alimentos para todos os continentes, notadamente China, União Europeia, Estados Unidos, Irã e Japão, destinos de 60% dos produtos agrícolas verde-amarelos. Entre outros, a pauta inclui soja, açúcar de cana, carne de frango in natura, farelo de soja, milho e carne bovina, além de celulose, café, fumo e açúcar. Somente as carnes de frango e bovina chegaram a 150 países e com projeção de ano recorde, segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal.
Apesar das guerras, embargos, gargalos na infraestrutura e na logística e das quedas dos preços médios e do câmbio, o cenário deve se manter favorável para o agronegócio brasileiro. Pelo menos na visão da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) ao estimar uma safra 2022/2023 de 322,8 milhões de toneladas de grãos (18,4% superior à anterior) adicionando mais de 50 milhões de toneladas colhidas. Especialistas projetam que, a manter o atual ritmo, a produção de grãos alcançará 390 milhões de toneladas até 2033 ou quase 80 milhões a mais. O risco é de faltar estrutura de armazenagem, como também alertam especialistas.
É muito grão, mas também é crescente a população mundial multiplicando a demanda. A pesquisadora associada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Lia Valls Pereira,diz que o interessante é que neste ano, o agronegócio continuou crescendo mesmo com queda de preços dos produtos no mercado internacional. A performance se deve ao volume maior e ao acesso a novos mercados.
Dados da Secretaria de Comércio e Relações Internacionais apontam a conquista recente de 51 novos mercados, entre os quais México, República Dominicana, Indonésia, China e Índia para onde foram embarcados produtos como carnes bovina e suína, algodão, soja, milho, frutas e legumes.
Para que a trajetória bem-sucedida se mantenha, entretanto, o Brasil tem que buscar alternativas. Lia Valls Pereira, que também é professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, diz que é preciso exportar mais produtos processados de maneira a também impactar a criação local de empregos para os brasileiros, já que a agricultura brasileira é altamente tecnificada e o País exporta mais commodities. Ela também defende a necessidade de ampliar a pauta aproveitando as oportunidades em aberto como açúcar, suco de laranja, milho e carnes para evitar a dependência excessiva da soja e da China.
De janeiro a setembro deste ano, por exemplo, o Brasil exportou US$ 32,2 bilhões de soja em grão para a China, o que representa 71% do total exportado para todos os países. “Já mostramos nosso potencial e podemos explorar nichos adicionando valor às exportações agrícolas”, afirmou, citando a necessidade de surgirem novas refinarias para o óleo de soja e de “gourmetizar” os negócios com café em grão, que encontra mercados lá fora com capacidade de pagamento.
Análise semelhante vem de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, que presta consultoria financeira para a Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG).Como centro dinâmico da economia há décadas, o agronegócio tende a continuar sua trajetória exportadora ascendente. Há desafios a serem enfrentados. “Um deles é diversificar mercados para neutralizar a dependência chinesa que também continuará crescendo, mas talvez não no mesmo ritmo, dada a enorme centralização política do Estado na economia”, comenta. E cita o Sudeste Asiático, o Oriente Médio e a África como países com interessante perfil demográfico e com população crescente que demandarão mais alimento.
O consultor da MB Associados aponta como outro entrave o custo logístico nacional,que dificulta o escoamento das safras e, ainda, a questão tributária. Embora o agro brasileiro tenha sido altamente poupado na reforma tributária, ele diz que é preciso atenção para blindar as commodities de impostos na exportação, evitando replicar o erro cometido na Argentina que desmantelou a economia.
Na sua avaliação, a questão climática tem que estar no radar dos produtores brasileiros que precisam olhar esta volatilidade com maior cuidado, protegendo-se com sistemas de irrigação e seguros agrícolas, porque as mudanças climáticas tendem a ser cada vez mais severas.
Também a especialista em investimentos para o segmento agro, Rafaela Debiasi está confiante no futuro das exportações brasileiras. Em duas décadas as vendas externas totalizaram US$ 2,1 trilhões, resultando em um avanço anual da ordem de 20%. No mesmo período alcançou liderança em nove mercados internacionais, com destaque para suco de laranja com 80% das importações globais e soja com quase 60%, além de açúcar, carne de frango, milho, café, carne bovina, celulose e fumo. Para ela, estão no mesmo caminho o algodão e o etanol, além da suinocultura, frutas, sucos, produtos hortícolas, castanhas e trigo.
O agro ajuda a controlar a taxa de câmbio, acumula reservas, gera empregos e fortalece os orçamentos governamentais. “Como fornecedor de alimentos essenciais para o mundo, o Brasil conquista respeito e reconhecimento internacional, consolidando sua posição como um parceiro comercial estratégico”, analisa.
A Confederação Nacional da Agricultura (CNA), maior representante do agronegócio, conjuga de todas estas preocupações, mas destaca a necessidade de compatibilizar as condições dos produtores brasileiros com o rigor da legislação antidesmatamento da União Europeia. “O Brasil já é destaque em boas práticas e conta com um Código Florestal ímpar”, diz Pedro Rodrigues, assessor de Relações Internacionais da CNA.
Para ele, além de abrir novos destinos e diversificar a pauta exportadora, o Brasil tem que manter os atuais mercados. É o caso da União Europeia, que responde por 16% das transações externas brasileiras do agronegócio. “Quem faz exigências tão elevadas, tem que remunerar adequadamente os produtores que não podem arcar com os ônus de tamanhos requisitos sanitários”, comenta, certo de que haverá um equacionamento como fruto da articulação de entidades de classe e autoridades brasileiras para evitar maiores perdas, notadamente dos produtores de pequeno e médio porte. Pelo último Censo Agropecuário, 85% dos produtores no Brasil integram a agricultura familiar.
Simultaneamente, Pedro Rodrigues recomenda que, sem deixar de exporta commodities, o Brasil explore a riqueza de culturas específicas regionais, especialmente para a União Europeia, como a uva do Sul, os cítricos do Sudeste, o exótico e bem aceito açaí do Norte e o melão do Nordeste.
Quarto maior exportador do Nordeste e décimo sétimo colocado na Balança Comercial brasileira, o Ceará conta com uma diversificada pauta exportadora que somou US$ 2,3 bilhões em 2022 (US$1,38 bilhão até agosto 2023), pelos dados do Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC).
Conforme o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, ferro e aço, calçados e combustíveis foram os setores mais bem colocados nas vendas para outros países no último ano, quando foram comercializados com parceiros como Estados Unidos, México, Espanha, Itália e Argentina.
As exportações agrícolas do Estado são lideradas por castanha de caju, ceras vegetais, suco de fruta/produto hortícola, melões frescos e lagosta congelada. O município de São Gonçalo do Amarante concentra mais de 50% dos negócios externos, seguido por Fortaleza, Maracanaú, Sobral e Icapuí, que integram as 59 cidades exportadoras.
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