Desde o século XV, quando os países da Europa cruzaram os mares em busca de riquezas, os caminhos dos negócios começaram a ser encurtados até a chegada aos dias atuais com a nova ordem mundial conectada. O processo de globalização ganhou ainda maior fôlego com a expansão do capitalismo a partir da Segunda Guerra Mundial. As chamadas empresas transnacionais marcaram presença nos principais continentes, desenvolvidos ou não, ditando as regras do jogo com seu poder de influência, gerando impactos culturais e econômicos e, assim, confirmando Marshall McLuhan e sua Aldeia Global.
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O Brasil não ficou de fora. Com o surgimento dos blocos econômicos e a consequente redução nas barreiras comerciais, os brasileiros trataram de se fortalecer criando o Mercosul, em 1991. Nele, o Brasil lidera com folga, afinal, responde por quase metade das transações comerciais (44%), seguido pela Argentina (33%).
A iniciativa resultou em um expressivo crescimento industrial, ao mesmo tempo em que o País passou por um concentrado processo de privatizações dentro do neoliberalismo vigente, onde a intervenção do Estado deveria ser mínima.
A par de muitas vantagens dentro do ditado que diz “a união faz a força”, também surgiram desvantagens. Estudiosos apontam a exploração de matérias-primas locais pelas multinacionais como uma delas, o que explica em boa parte as atuais catástrofes climáticas originadas de desmatamento exacerbado.
Diferenciais brasileiros
Para o professor e especialista em relações internacionais, Álvaro Martins Carvalho Filho, aluno de doutorado em Administração da Universidade da Amazônia, o Brasil poderia avançar mais em termos de comércio internacional considerando sua posição de produtor mundial de alimentos (três safras anuais) e pela presença relevante como exportador para boa parte do globo terrestre. Também se destaca em disponibilidade e abundância de recursos naturais tais como energia limpa e insumos industriais importantes, como o aço.
Para isso, recomendaria a formação de mais blocos econômicos, que são mais sólidos do que acordos bilaterais. E cita o protecionismo dos países desenvolvidos como barreira para maiores negócios porque as grandes potências protegem o mercado doméstico, de diferentes maneiras, para garantir emprego à população.
“Mesmo tendo chegado à presidência do G20, o Brasil não avança mais porque falta eficiência na gestão”, afirma Álvaro Martins, que também foi ex-diretor do Corecon-CE, referindo-se a todas as áreas (monetária, cambial, fiscal e de renda) que requerem melhorias e eficácia nas políticas.
Fluxo de pessoas
O pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Leonardo Paz, concorda que o elevado Custo Brasil somado à corrupção distancia o País do resto do mundo. A seu ver, o Brasil não aproveita as vantagens competitivas e não tem uma estratégia internacional eficiente mantendo poucos acordos bilaterais (China, Israel e alguns países da América do Sul). Embora mantenha regulares superávits na balança comercial, não responde por mais de 1,5% do comércio mundial.
“Navegamos mal na globalização, dada a dificuldade de abertura econômica maior e de integração nas cadeias de fornecimento.”
Leonardo Paz, pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da Fundação Getúlio Vargas (FGV)
Leonardo Paz avalia que a globalização passa por um momento de turbulência no mundo e que os fluxos, sejam de negócios, sejam de pessoas, nunca estiveram tão abertos e acelerados. A propósito, ele observa que os “eurocéticos” na Europa atualmente estão preocupados com o fluxo de pessoas, os imigrantes, que disputam empregos. Da mesma forma, os Estados Unidos, desde 2016, com eleição de Donald Trump, combate a entrada de estrangeiros, ação que deve ser retomada, se reeleito.
E o futuro?
O economista Célio Fernando, sócio do Astor BFA IB, vê um futuro ainda mais desafiador para as nações na cooperação internacional diante das inovações cada vez mais aceleradas. “Será preciso muita consciência que leve a uma construção mais coletiva e menos individualista”, afirma ele. Sua visão também inclui o respeito às particularidades para evitar maiores desigualdades.
A propósito, a globalização, nestas três décadas e meia, no caso brasileiro, contribuiu muito para o crescimento econômico, mas também aumentou as desigualdades. Célio Fernando defende a necessidade de maiores regulações por parte dos organismos internacionais nos processos de transição para evitar conflitos. Na área energética, por exemplo, onde o Brasil se destaca com sua matriz limpa e com o hidrogênio verde, não se pode abandonar os modelos vigentes de maneira abrupta, caso do óleo e gás.
“Como em qualquer coletividade, é preciso ter diálogo e negociação permanentes entre todos os atores que levem ao equilíbrio e onde o homem seja a preocupação central.”
Célio Fernando, sócio do Astor BFA IB
Regionalização
Para Igor Lucena, presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon-CE), a globalização em seu conceito antigo está desgastada porque não levou em conta as especificidades de produtos e serviços, nem os hábitos culturais e nem os conflitos geopolíticos de seus membros, realidade escancarada pela pandemia. Houve falta de insumos concentrados em poucos fornecedores.
A seu ver, a onda agora é de regionalização dos negócios por critérios de proximidade e similaridade política. Para não paralisarem, os países deixaram a redução de custos em segundo plano em suas relações comerciais, privilegiando a segurança militar, alimentar, de informação e de tecnologia. “O mundo está vivendo uma guerra fria por questões geopolíticas já presentes na Ásia, Europa e Oriente Médio e chegando aqui perto na Venezuela”, ilustra.
Neste contexto, o Brasil, junto com o México, poderia se tornar o maior fornecedor dos Estados Unidos, mas o presidente do Corecon-CE teme que novamente o país perca esta oportunidade por falta de alinhamento, preferindo se manter fechado.
“A saída para ampliar os negócios internacionais começa pela máquina pública brasileira nas três esferas de governo com seus programas públicos ineficientes, à exceção do Bolsa Família e da independência do Banco Central”, afirma. E complementa dizendo que passa, também, por uma política externa mais aberta e clara e pela aceleração das Parcerias Público-Privadas capazes de gerar negócios inovadores.
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