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Energias renováveis respondem por 85% da matriz elétrica do Brasil, mas enfrentam “gargalos”

Este ano, o Brasil deve registrar a segunda maior oferta de energia da história, com crescimento de 10,1GW, avanço inferior apenas ao registrado em 2023, quando o aumento foi de 10,3GW, isso com base na série histórica iniciada em 1997. Atualmente, o Brasil tem uma capacidade em operação de 202,09 GW somando todas as fontes de energia. E desse total, as energias renováveis são responsáveis por 84,48% e as não renováveis por 15,52%.


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Os números, por si sós, mostram o quanto é promissor o mercado das energias renováveis no Brasil, sobretudo da eólica e solar. No entanto, existem desafios: muitos investimentos estão parados em função dos trâmites regulamentares e jurídicos para criação do Marco Legal que, embora prometido para início deste ano, ainda não está pronto. Outro gargalo diz respeito a conexão, a transmissão de energia. Também é citado a não elevação do consumo, o que impede o crescimento da produção.

Apesar dos gargalos, os destaques são para as energias eólica e fotovoltaica, que tem crescido a oferta a cada ano, muito embora a oriunda de hidrelétricas tenha a maior participação, com 103,21 GW dos 202,09 GW de potência fiscalizada no Brasil. É seguida pela energia termelétrica, com 46,21 GW. A eólica, com 30,43GW, e a fotovoltaica, com 13,71GW, respondem por 15,10% e 6,78%, respectivamente, da matriz energética nacional. Juntas, elas já são responsáveis por 44,26GW.

No Ceará, a matriz energética soma 5,56KW, sendo liderada pela eólica, com 2,57 KW, ou seja, 46,31% do total, seguida pela energia termelétrica, com 1,73KW, o equivalente a 31,21%. A fotovoltaica detém 22,28%, ou seja, 1,25KW. Mas juntas, a eólica e a fotovoltaica superam a termelétrica, com 3,82KW e 68,79% de participação de potência fiscalizada (considerada a partir da operação comercial realizada pela primeira unidade geradora. Essa potência pode aumentar gradativamente).

No que tange a potência outorgada (corresponde àquela considerada no Ato de Outorga, ou seja, é a potência que a usina foi autorizada a operar) no Ceará, a fotovoltaica lidera com 17,87KW, enquanto a eólica atinge 5,45KW. Já a termelétrica continua igual, ou seja, com 1,73KW. Os números cearenses para a fotovoltaica e eólica são promissores.

Picanço: energias renováveis vão ter crescimento acelerado

Na opinião do consultor de Energia da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Jurandir Picanço, com a transição energética, na qual devem ser eliminadas as formas de produção de energia que emitam Gases de Efeito Estufa (GEE), as energias renováveis, além de atenderem ao crescimento da demanda mundial, vão substituir a geração atual com combustíveis fósseis, portanto terão um crescimento acelerado.

Ele afirma que a produção de energia solar fotovoltaica é a que assumirá a maior importância dentre todas as renováveis, pois permite a geração distribuída (na qual o consumidor produz sua energia) e é a que mais gera empregos. No entanto, em regiões do mundo com baixa insolação, é possível que predominem as energias eólicas onshore (em terra) e offshore (no mar).

Jurandir Picanço, consultor de Energia da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec). (Foto: Divulgação)

“As energias renováveis serão as principais responsáveis pela da descarbonização do planeta, portanto contribuindo com o meio ambiente global. O maior desafio é de que essa grande expansão das energias renováveis ocorra sem promover impactos ambientais e sociais negativos em suas localidades. Não teria sentido promover um benefício global, comprometendo o meio ambiente e as populações locais.”

Jurandir Picanço, consultor de Energia da Fiec

Indagado sobre a oportunidade mais emergente no segmento das energias renováveis, Picanço foi enfático: há um grande potencial na exploração de geração eólica offshore. Sobre o futuro das renováveis no Ceará e no Nordeste, ele diz que a região tem uma condição privilegiada no mundo: detém enorme potencial de energia eólica e solar. Essa condição peculiar destaca o Nordeste num patamar elevado para contribuir com a transição energética e a descarbonização global.

Transição energética está ligada ao consumo

Bernardo Viana, diretor Setorial de Regulação do Sindienergia-CE e sócio da BVS Energia, ao analisar se o ritmo atual da transição energética é suficiente para atender as metas estabelecidas na Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC COP 28), afirma que os investimentos ainda são muitos altos e é por isso que o ritmo, por mais que bilhões e bilhões de dólares sejam investido anualmente, está dentro do esperado. A transição energética, por mais que esteja acelerada, o consumo mundial não para, ou seja: é um trem em movimento.

É como entrar em um trem em movimento – observa –, acrescentando que não é simplesmente trocar um pelo outro. Por isso é que existe o termo “transição energética justa”. Se a mudança ocorrer de forma muito rápida, os preços vão ser altíssimos. Como exemplo, ele citou o carro elétrico, que tem preço elevado e o que hoje as baterias dão de autonomia ao veículo.

Bernardo Viana, diretor Setorial de Regulação do Sindienergia-CE e sócio da BVS Energia. (Foto: Sindienergia-CE)

Para Bernardo, ainda vai ter uma evolução tecnológica muito grande nas baterias, refletindo no preço. Ele cita outro exemplo: energia eólica, que na década de 90 tinha determinado preço, hoje inferior em mais de dez vezes, tornando mais acessível a tecnologia.

“Não é só simplesmente fazer investimento. O investimento tem que se pagar. É lindo e utópico dizer: vamos ser 100% renováveis. Mas qual é o preço disso? Qual o custo disso? Qual o retorno? Ninguém, empresário e governo nenhum, faz investimento às cegas. Os governos têm que puxar essa linha de investimento para estimular, como foi feito, mas quando chega na ponta final, no mundo empresariado, sempre vai olhar o risco e retorno”.

Bernardo Viana, diretor Sindienergia-CE

Indagado sobre a corrida para limpar a matriz energética mundial, o interesse crescente pelas fontes renováveis e os investimentos em diferentes regiões do mundo, Bernardo Viana analisa que foi a partir do Protocolo de Quioto, em 1992 (chamou atenção para o aquecimento global), que novos investimentos começaram a surgir em vários países, isso nos mais desenvolvidos e depois nos subdesenvolvidos, como o Brasil.

São décadas de investimentos, mas ainda são necessários décadas de esforços para que, de fato, a matriz energética mundial esteja bem mais limpa. O Brasil é um dos líderes mundiais na adoção dessas tecnologias renováveis, na produção de energia verde, como é chamado, mas de fato tem ainda muito a ser feito – garante o diretor do Sindienergia-CE.

Energias renováveis para produzir o H2V

Para produzir o hidrogênio verde (H2V), que é obtido por meio da eletrólise da água, é necessário utilizar energia limpa e renovável, sem emissões de CO2. Esse processo separa hidrogênio e oxigênio da água através de corrente elétrica, exigindo fontes limpas como solar, hídrica ou eólica. As energias renováveis têm que ser baratas. O Ceará já tem infraestrutura adequada, começando pelo Complexo do Porto do Pecém, para produzir e exportar H2V. Mas Viana chama a atenção para um fato: assim como o Brasil, outros países também querem o mesmo.

“Os países estão de olho nesse combustível, mas cada um tem uma peculiaridade logística muito atrelada à sua geopolítica. A própria guerra da Ucrânia tem tudo a ver com isso do Brasil ou Ceará produzir pra Europa. Porque os Estados Unidos não fariam isso. Estados Unidos tem um pensamento de autossuficiência primeiro, de se autoabastecer para depois olharem pra transportar pro mundo.”

Bernardo Viana, diretor Sindienergia-CE

Ele ressalta que o Brasil, o Chile e os países da América Latina se colocam numa posição privilegiada pra abastecer a Europa, já que a Austrália tem uma posição favorável para China. “E a gente concorre bastante com o norte da África, onde podem ser vistos projetos no Marrocos, na Mauritânia e em alguns outros países, onde tem projetos que podem até puxar gasodutos pra conectar pelo sul da Espanha. São projetos extremamente arrojados também, mas que existem empresas que estão estudando a viabilidade e quem sabe para elas façam mais sentido fazer investimento do que aqui. A gente concorre com essa geografia mundial, digamos assim”.

“Gargalos” impedem maior desenvolvimento das renováveis

Mesmo reconhecendo que o Brasil – e em especial o Nordeste – tem muita área para investimentos em energias renováveis, Viana lamenta que ainda não existe uma única eólica offshore, que é o futuro e que vai se tornar uma realidade no País. “Não existe gargalo de área, projeto ou vento, como já existe uma saturação em outros países. Um problema muito grande diz respeito a transmissão de energia, a conexão. Recentemente houve um leilão no Brasil que vai possibilitar que novos investimentos em renováveis sejam feitos no interior, tanto eólico como fotovoltaico”.

Hoje em dia – opina – o que está travando, além do gargalo da conexão, é a necessidade do País crescer mais para aumentar o consumo de energia. Se de fato isso ocorrer, com os veículos elétricos, por exemplo, o mercado será gigantesco, pois passará a existir energia para abastecer os veículos.

Para concluir, Bernardo Viana garante que muitos investimentos estão parados em função dos trâmites regulamentares e jurídicos para criação do Marco Legal para as novas energias que estão sendo desenvolvidas no Brasil. “O pessoal de Brasília precisa caminhar mais rápido com isso. Na COP do ano passado foi dito que o marco legal estaria aprovado no início de 2024, mas ainda não foi. O investimento, que na sua maioria é estrangeiro, somente vai chegar no Brasil quando tiver uma lei e que esteja dentro dos parâmetros internacionais”.

Mercado de renováveis deve atingir 5,98 terawatts até 2029

De acordo com a Mordor Intelligence, o tamanho do Mercado de Energia Renovável é estimado em 4,24 terawatts em 2024, e deverá atingir 5,98 terawatts até 2029, crescendo a um CAGR de 7,09% durante o período de previsão (2024-2029). O mercado foi impactado negativamente pelo COVID-19 em 2020. Atualmente, o mercado atingiu níveis pré-pandêmicos.

O estudo analisa as principais tendências, como, por exemplo, no longo prazo: os principais fatores impulsionadores do mercado são as políticas governamentais favoráveis, aumentando a adoção de energias renováveis ​​com o declínio do preço dos painéis solares e das instalações de turbinas eólicas.

Já a crescente adoção de fontes alternativas de energia limpa, como usinas a gás e projetos de energia nuclear, provavelmente desacelerará o crescimento do mercado. Os avanços tecnológicos na fabricação de energia solar fotovoltaica e na solução de problemas de intermitência usando sistemas de armazenamento de energia provavelmente proporcionarão enormes oportunidades para o mercado.

Cresce 70% investimentos em renováveis no mundo

Relatório da Agência Internacional de Energia (IEA) revela que, em 2023, os aportes na fabricação de tecnologias de energia limpa totalizaram US$ 200 bilhões, o equivalente a 4% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, o que representa elevação de 70% sobre o ano anterior. De acordo com a Agência, os aportes na fabricação de equipamentos de energia solar, por exemplo, aumentaram mais que o dobro em 2023 e os investimentos na manufatura de baterias aumentaram 60%.

Cerca de 40% dos investimentos na indústria de energia renovável, no ano passado, foram para as linhas que vão entrar em operação este ano. Essa parcela, para baterias, sobe para 70%. E constata que a capacidade de painéis solares já está em linha com o que vai ser necessário para atender a meta de descarbonização projetada. O trabalho também mostra que a China continua respondendo por mais de 80% da capacidade produtiva de módulos fotovoltaicos.

O Brasil tem um grande potencial para geração de energia renovável. O país possui um grande território com áreas com alto índice de radiação solar, ventos fortes e recursos hídricos abundantes. Além disso, o setor tem investido em pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias de geração de energia limpa. De acordo com dados do relatório de investimentos da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), o Brasil recebeu 114,8 bilhões de dólares em investimentos no setor entre 2015 e 2022.

A utilização de energia renovável é importante para o meio ambiente, para a saúde pública e para a economia, ajudando a reduzir a emissão de gases de efeito estufa, que contribuem para o aquecimento global. Além disso, a energia limpa pode gerar novos empregos e estimular a economia.

O Brasil se destaca no cenário global pela expressiva participação de fontes renováveis em sua matriz energética. Em 2023, o estudo da Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) apresentado pela CNN mostrou que as energias renováveis representaram 93,1% do total da eletricidade gerada no país, posicionando o Brasil como um líder na transição para um futuro energético mais sustentável.

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