A redução das emissões de gases de efeito estufa na natureza, mais do que uma obrigação, pode oferecer oportunidades e benefícios para o Brasil. Ao buscar se alinhar às metas mundiais, o País pode se transformar em fornecedor mundial de produtos descarbonizados. É o caso do aço, do vidro, do cimento e químicos na indústria ampliando e dando maior valor agregado à pauta exportadora.
Quer receber os conteúdos da TrendsCE no seu smartphone?
Acesse o nosso Whatsapp e dê um oi para a gente
Projetos de bioeconomia também trarão ganhos econômicos e melhoria nas condições sociais com geração de emprego, em harmonia com o meio ambiente e evitando ou amenizando os desastres naturais.
Metas ousadas
Para Clauber Leite (foto), diretor de Energia Sustentável e Bioeconomia do Instituto E+ Transição Energética, instituição dedicada a estudar e difundir conhecimentos sobre o tema,é crucial que o Brasil se alinhe, dada a sua importância econômica e ambiental. O País é o maior emissor de gases de efeito estufa na América Latina.
Apesar da matriz energética limpa, o Brasil mantém uma pegada de carbono relativamente alta por conta da agropecuária e do desmatamento da Amazônia.“Boa parte dessa meta está ligada à redução do desmatamento, uma vez que as vastas florestas tropicais do País são essenciais para a captura de carbono e a regulação do clima”, observou.
Como signatário do Acordo de Paris, o Brasil assumiu compromissos significativos para a redução de suas emissões de gases de efeito estufa, comprometendo-se a reduzir as emissões em 48% até 2025 e em 53% até 2030 para chegar a zero até 2050. A ousada meta será revisada e ajustada em novembro do próximo ano, durante a 30ª Conferência do Clima da ONU (COP30), em Belém.
O Observatório do Clima propôs uma redução de 92% até 2035. Significa dizer que o Brasil, sexto maior emissor do mundo, precisará reduzir as 2.440 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente apurados em 2005 para 200 milhões de toneladas líquidas. É uma referência mundial para que os países reduzam suas emissões e o planeta limite o aquecimento global a 1,5ºC.
Políticas públicas e regulatórias
O Brasil já implementou ou está implementando políticas e iniciativas para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. Entre as iniciativas em andamento, Clauber Leite cita o RenovaBio, programa que visa promover a bioenergia por meio de um sistema de certificação de emissões evitadas e metas de redução de carbono para combustíveis fósseis.
Ele também aponta o Mercado de Carbono,em desenvolvimento no Brasil, com o objetivo de criar um sistema de negociação de créditos de carbono, permitindo que empresas compensem suas emissões investindo em projetos de redução de emissões de carbono. Igualmente inclui neste “pacote” de soluções os Combustíveis do Futuro, como o hidrogênio de baixas emissões, que pode substituir combustíveis fósseis e reduzir as emissões dos setores energético e de transporte.
Considerando que a indústria é listada entre as grandes atividades emissoras, o programa Nova Indústria Brasil (NIB) chega em boa hora paratornar a indústria nacional mais sustentável e eficiente, promovendo a inovação e a adoção de tecnologias de baixo carbono. E para o enfrentamento das emissões do campo, o Plano ABC propõe uma agricultura de baixo carbono, estabelecendo diretrizes para reduzir as emissões com práticas mais sustentáveis e tecnologias de baixo carbono. Da mesma forma que o compromisso conta com o Código Florestal, considerado como um dos mais rigorosos do mundo, aoestabelecer normas para a proteção e recuperação de áreas de vegetação nativa.
“Essas políticas e iniciativas contribuem de forma transversal para o país atingir a meta de redução de emissões, abordando diferentes setores e aspectos da economia e sociedade, e oferecendo ferramentas e incentivos para alcançar uma economia de baixo carbono”, acredita o diretor do Instituto E+.
Leite entende que os principais desafios para o cumprimento da meta incluem a necessidade de reduzir o desmatamento, melhorar a eficiência das práticas agrícolas e industriais, e promover uma transição energética eficaz.
Para isto, entretanto, será necessário enfrentar (e vencer) dificuldades como o fortalecimento das políticas ambientais, a implementação de medidas eficazes contra o desmatamento e a resistência de setores econômicos a mudanças que podem afetar seus interesses.
Descarbonização automotiva
A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) tenta fazer a sua parte em seu estudo de descarbonização, já entregue ao governo brasileiro como contribuição do setor automotivo para a COP neste ano no Azerbaijão e em 2025 em Belém (PA). Responsável por 13% das emissões totais do País, o segmento automotivo emite, atualmente, 242 milhões/ton de CO²/ano, podendo subir para 256 milhões até 2040, considerando o ritmo atual de crescimento.
O estudo, elaborado em conjunto com o BCG, promete uma redução de até 280 milhões/ton. nos próximos 15 anos com a intensificação do uso de novas tecnologias de propulsão combinadas com a maior utilização de biocombustíveis.
Caso sejam adotadas outras medidas como renovação da frota, inspeção veicular, programas de reciclagem veicular e aumento do poder calorífico dos biocombustíveis, a redução pode alcançar até 400 milhões/ton de CO². “O setor automotivo desempenha papel importante no desenvolvimento de tecnologias rumo à descarbonização, oferecendo soluções que não apenas atendem às necessidades de mobilidade, mas que também reforçam o compromisso em promover uma significativa redução das emissões de gases de efeito estufa, beneficiando a sociedade como um todo e as futuras gerações”, conclui o presidente da Anfavea, Márcio de Lima Leite (foto).
Líder em captura de carbono
Quem acredita no Brasil como player global em descarbonização é Felipe Vasconcellos (foto), sócio da Agricarbon. “O Brasil tem uma oportunidade única de liderar o mercado de carbono, não apenas pelo seu vasto potencial natural, mas também pelas recentes iniciativas voltadas à sustentabilidade, como diversas fontes de energia renovável”, diz. A seu ver, o Brasil possui um papel estratégico, com potencial para capturar 15% do carbono global através de fontes renováveis no mercado de créditos de carbono, em plena expansão, com previsão de movimentar US$ 50 bilhões até 2030.
A possibilidade anima o superintendente de Sustentabilidade da Bolsa de Valores do Brasil (B3),instituição que lidera o movimento de captura com o lançamento de uma plataforma para registro de crédito de carbono. “Podemos ser o coração do fluxo de capital sustentável oferecendo produtos e transparência para maximizar as oportunidades de descarbonização”, afirma Cesar Sanches, imaginando que este é o caminho para estabelecer um mercado regulado e ainda não formalizado no Brasil, o que poderá acontecer a partir da aprovação da Lei 2.248/2015.
A expectativa é que o Brasil integre o grupo dos 36 mercados de carbono regulados no mundo, que hoje cobre 17% das emissões globais de Gases do Efeito Estufa (GEE). “O mercado de carbono representa um dos principais pilares para um futuro sustentável no Brasil. Com nosso vasto potencial natural e a implementação de regulamentações apropriadas, estamos posicionados para assumir a liderança global nesse setor“, acredita Felipe Vasconcellos.
Medidas insuficientes de combate às emissões de gases do efeito estufa
Para Luana Gaspar (foto), head de Descarbonização na PSR,está clara a dificuldade para atender a meta de reduzir as emissões líquidas para 1,32 GtCO2 em 2025 porque ainda são insuficientes as medidas positivas aprovadas ou em tramitação. Segundo dados do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), as emissões líquidas brasileiras em 2022 foram de 1,7 GtCO2e, cerca de 30% acima da meta adotada para o ano de 2025.
A seu ver, há grandes desafios no curto, médio e longo prazos a serem vencidos. Considerando que 65% das emissões vêm da agropecuária, desmatamento e queimadas, está aí o primeiro ponto de ataque.
“Para atingir a meta de 2025, seria necessário reduzir em 78% o desmatamento, mas, ao contrário, o maior índice de queimadas neste ano pode afetar negativamente a redução de emissões desse setor”, exemplifica. E aponta outros desafios para que o Brasil consiga atender as metas de médio e longo prazos, que integram as políticas públicas implementadas ou em discussão para a redução da dependência de combustíveis fósseis.
É o caso do já aprovado Marco Legal do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono e do Projeto de Lei “Combustíveis do Futuro”, em tramitação, que cria programas nacionais de diesel verde, de combustível sustentável para aviação e de biometano, além de aumentar a mistura de etanol e de biodiesel à gasolina e ao diesel, respectivamente.
A executiva da PSR também cita o Projeto de Lei do Mercado de Carbono, em discussão no Congresso Nacional, e a aprovada Política Nacional de Transição Energética, que chega para integrar as políticas e ações do governo, visando reduzir as emissões de gases e contribuir com a sustentabilidade.
“Na contramão da transição energética, entretanto, estão medidas como a extensão dos subsídios para usinas a carvão no Sul do país, incentivo ao uso do gás natural e a instalação obrigatória de usinas térmicas a gás inflexíveis”, pondera ela, defendendo a necessidade de medidas mais rígidas.
Ações climáticas do Ceará
O Ceará, através da Secretaria do Meio Ambiente e Mudança Climática (Sema), mantém uma série de ações de mitigação às mudanças climáticas que já afetam a disponibilidade hídrica, a biodiversidade e a degradação dazona costeira. Em seu Plano Plurianual – PPA 2024-2027, o governo elaborou o programa específico “Ceará no Clima – descarbonizando e se adaptando com justiça climática” que visa propor ações de combate e contribui para o alcance das metas de emissões. As entregas estão sendo desenvolvidas em parceria com os pesquisadores do Programa Cientista Chefe Meio Ambiente. A equipe técnica da Sema e os pesquisadores estão em processo de elaboração do Plano de Biodiversidade e Adaptação.
Outro importante instrumento para prevenção e contenção das mudanças climáticas é o Zoneamento Ecológico e Econômico da Zona Costeira do Ceará (ZEEC), cujos estudos foram finalizados e estão publicados no portal da Sema.
Atualmente, a Sema busca parcerias para viabilizar a construção do Inventário Estadual de Gases de Efeito Estufa (GEE) do Ceará. Uma das parcerias firmadas com ICLEI – Governos Locais pela Sustentabilidade, rede global com extenso portfólio em solução de ações climáticas, sendo uma delas o apoio técnico para o desenvolvimento do inventário de GEE.
Saiba mais:
Acelerador de transição industrial lança chamada para projetos de descarbonização no Brasil
BNDES tem R$ 40 mi anuais para investir em projetos de descarbonização do setor automotivo