A quem interessa o resultado das eleições nos Estados Unidos? A todos. Por quê? Porque se trata da maior economia global que compra do resto do mundo, é o maior mercado consumidor e detém capital e tecnologia, inclusive bélica. Um poder que dá aos EUA a supremacia nas relações comerciais e políticas. São dois séculos de parceria que culminaram com US$ 10 bilhões de investimentos diretos dos EUA somente em 2023 e que alcançam quase US$ 92 bilhões na última década, conforme dados do Banco Central. O comércio entre os dois países chegou a US$ 75 bilhões no último ano, segundo a Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Secex-MDIC) e a Câmara Americana de Comércio (Amcham).
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Não à toa, o Planeta acompanhou, passo a passo, a disputa mais acirrada e polarizada em projetos e ideias. A vitória a Donald Trump no voto popular e nos colégios eleitorais inclui maioria no Senado e na Câmara dos Representantes. E a Suprema Corte, com juízes que ele próprio indicou em sua gestão anterior pode, inclusive, livrá-lo de condenações em curso. Goste ou não, é o custo da democracia.
“Promessa feita é promessa cumprida”, afirmou, em alto e bom som, o novo inquilino da Casa Branca pelos próximos quatro anos, antes mesmo de ter o resultado oficial na madrugada da quarta-feira (06/11). Trump referia-se, entre outras ações, ao corte de impostos e desregulamentações na economia interna, a restrições maiores nas imigrações, especialmente mexicanas, e à taxação de produtos chineses. Analistas internacionais, entretanto, dizem que apesar da firmeza de Trump nos discursos, ele terá que tratar do pesado déficit público americano e encaminhar uma solução para os conflitos na Rússia e no Oriente Médio.
Para o professor e especialista em relações internacionais, Álvaro Martins Carvalho Filho (foto), a política comercial dos republicanos é mais protecionista e unilateralista, priorizando os interesses americanos e, muitas vezes, aplicando tarifas e barreiras para proteger indústrias locais. “Sob a gestão de Trump, o Brasil pode enfrentar um ambiente mais competitivo em setores como o agrícola”, alerta o economista do Corecon-CE. Ele acrescenta que alterações na política econômica norte-americana, como tarifas de importação e tratados comerciais, podem impactar diretamente a exportação de produtos brasileiros, especialmente commodities como soja, carne e produtos industriais.
Da mesma forma, mudanças nas políticas fiscal e monetária impactarão a atratividade de mercados emergentes, incluindo o Brasil, para investidores americanos. A saída vista por Álvaro Carvalhoé que se o Brasil conseguir manter a estabilidade econômica e política e adotar reformas que aumentem a segurança jurídica para investidores, o país pode atrair mais capital norte-americano, especialmente em um cenário de busca a por retornos maiores em comparação aos mercados desenvolvidos.
Álvaro entende que em se tratando de mudanças climáticas, o interesse é menor em relação aos democratas que poderiam exigir medidas de proteção da Amazônia que o Brasil poderia ter dificuldade de cumprir. Com Trump, a seu ver, a pressão deverá ser menor e, consequentemente, também será menor a cooperação ou assistência internacional para temas como o desmatamento.
“Sob a gestão de Trump, o Brasil pode enfrentar um ambiente mais competitivo em setores como o agrícola.” Álvaro Martins Carvalho Filho, especialista em relações internacionais
Álvaro Martins Carvalho Filho, especialista em relações internacionais
O economista Célio Fernando Melo (foto), membro da Academia Cearense de Economia e partner da Astor BFA IB, vê a vitória de Trump com a serenidade de quem já viu este filme antes. “Trump é a construção do pragmatismo de resultados”, afirma para explicar que é com esta postura que ele pretende governar. Nas questões econômicas maiores, a briga é com a China. Com o Brasil e outras nações emergentes, ele entende que o objetivo será favorecer a balança comercial no lado americano. Cabe ao Brasil, portanto, garantir maior competitividade para se manter no jogo. Entendida a competitividade como maior desoneração, inovação digital e de processos, avanço nos marcos regulatórios, qualificação da mão-de-obra e continuidade das reformas, como a tributária. “Estamos no caminho correto”, avalia Célio Fernando.
A preocupação é com as questões humanas e ambientais com impactos mundiais, como a postura a ser adotada em temas delicados como os conflitos envolvendo Irã, Ucrânia, Venezuela, OTAN e ONU. “Ao decidir gastar menos, Trump vai eleger seus alvos e terminar com o financiamento”, acredita.
Em contraposição, a presidente do Conselho de Relações Internacionais da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC) emestre em Ciência Política, Ana Karina Frota (foto), entende que em se tratando de política externa, há temas inegociáveis em todo o mundo como o direcionamento dos recursos disponíveis para tecnologia e inovação, promovendo as agendas de sustentabilidade, transição energética e equidade de gênero.
No plano econômico, em sua análise, alguns eixos giram em torno do aumento das tarifas de importação entre 10% e 20% para todos os produtos de fora (e até 60% para a China). Enquanto isso, empresas estão buscando reduzir a dependência da China, combinando a realocação da produção para países amigos próximos (friendshoring e nearshoring) e integração vertical.
O Ceará, que tem nos Estados Unidos seu principal parceiro comercial, mantém uma pauta exportadora envolvendo produtos siderúrgicos, calçados, peixes, frutas e a tradicional cera de carnaúba. Para continuar avançando, o Estado busca desenvolver uma política de atração de investimentos, colocando-se em evidência no cenário econômico nacional e internacional. “Estruturamos uma competitiva política pública de incentivos à implantação, ampliação, diversificação, recuperação e modernização industrial”, assegura Ana Karina.
Pela perspectiva de investimentos estrangeiros e focado no campo das energias, Igor Maia Gonçalves (foto), presidente da Câmara Setorial de Comércio Exterior e Investimento Estrangeiro, lembra que os setores econômicos de energias renováveis no Brasil, mercados consolidados e em ascensão, têm uma posição bastante estratégica dentro das projeções de desenvolvimento.
Sua expectativa se concentra mais num elemento-chave que é o futuro das políticas de créditos e incentivos fiscais nos Estados Unidos relativamente a essas atividades econômicas. Neste ponto, Igor cita o Inflation Reduction Act que trata exatamente sobre direcionamento de subsídios e incentivos. Para ele, dada a relevância dos Estados Unidos nesse contexto, todos os movimentos têm implicações importantes no cenário internacional, tanto envolvendo direcionamento como aceleração ou não do desenvolvimento desses setores que não se restringem à geração energética, mas tipos de combustível e toda a indústria de mobilidade.
Por conta disto, Igor Gonçalves entende que é muito improvável que haja uma mudança abrupta no cenário atual com a eliminação completa do que já foi feito até agora. Outro olhar atento é sobre a relação dos Estados Unidos com a China, que pode atingir o Brasil a depender do rumo que essa questão tome. “Qualquer possibilidade de conflito ou de embargos de mercado pode nos atingir de uma forma indireta”, disse, classificando como incertezas que só serão confirmadas com o que venha a se concretizar no futuro.
“Por se tratar de um tema de interesse mundial, ainda que tenhamos uma mudança de rota na visão sobre transição energética a partir de uma análise de cenário dos Estados Unidos, a preocupação deve ser muito mais sobre ritmo do que sobre continuidade.”
Igor Maia Gonçalves, presidente da Câmara Setorial de Comércio Exterior e Investimento Estrangeiro
A preocupação maior do advogado Edson Santana (foto) com relação ao segundo maior parceiro comercial do Brasil frente à volta de Trump é com a influência americana sobre o fluxo de investimentos. “Se o governo americano sinalizar um aumento de juros e políticas econômicas voltadas para o mercado interno, podemos ver uma redução dos investimentos diretos no Brasil”, sentencia.
Para ele, o setor agrícola e o de mineração, por exemplo, são sensíveis a políticas americanas, pois estão entre os maiores produtos exportados para os EUA e um viés protecionista trará desafios adicionais.
Na área das energias renováveis, onde o Brasil é um grande player, Edson Santana entende que caso os EUA mantenham ou ampliem o apoio às energias limpas, as parcerias e investimentos no Brasil serão crescentes para promover fontes de energia verde, como o hidrogênio, o etanol e a energia eólica e solar.
Para o advogado de Direito Internacional Privado, George Cunha (foto), que acompanha o movimento de imigração desde 2013, o visto EB-5 não está ameaçado com a vitória de Donald Trump. E por razões bem claras: trata-se de imigração absolutamente legal e que envolve negócios e empregos locais. “O sistema de imigração americano é altamente completo e constantemente aperfeiçoado que permite filtrar os objetivos dos interessados nos mais de 100 diferentes tipos de vistos”, comenta.
“Donald Trump recebe este tipo de imigração de braços abertos”, comenta porque são pessoas com poder aquisitivo elevado e que buscam instalar ou expandir suas operações comerciais no país das oportunidades e que oferece ambiente propício ao crescimento.
A escolha de políticas econômicas na Casa Branca pode ser traduzida em oportunidades e enormes desafios para o Brasil que terá que ter capacidade estratégica de enfrentar os entraves e aproveitar as chances abertas.
“Os impactos da vitória de Trump ja estão se refletindo na depreciação das moedas emergentes, especialmente nos casos das economias abertas com alta dependência de exportações para os EUA. Não é exatamente o caso do Brasil, dado que somos uma economia relativamente fechada, e com déficit comercial com os EUA. A apreciação do dólar frente ao real se deve, na maior parte, às expectativas de maiores juros na gestão Trump, especialmente pelo lado fiscal expansionista de seu governo, com os ambiciosos cortes de impostos. O plano de Trump tem um viés bastante inflacionário, que deve ser combatido com maiores taxas de juros, aumentando a atratividade do dólar e dos ativos norte-americanos frente aos pares emergentes. As políticas protecionistas, a expulsão dos imigrantes ilegais e os cortes significativos de impostos, são medidas que devem trazer maiores pressões nos preços ao longo do mandato. Ainda, com o Senado garantido, e a Câmara também encaminhando para maioria republicana, o cenário de ‘republican-sweep’ proporciona a Trump maior poder de aprovação de suas medidas.”
José Alfaix, Economista Da Rio Bravo
“A vitória de Donald Trump traz potenciais impactos para o Brasil e para o cenário econômico global. Sua postura crítica em relação a políticas ambientais e comerciais pode gerar incertezas, especialmente para economias emergentes. No Brasil, uma possível retomada de políticas protecionistas e a revisão de acordos comerciais dos EUA podem dificultar as exportações brasileiras, aumentando a pressão sobre o câmbio. Com isso, o dólar pode avançar, possivelmente atingindo os R$ 6,00, o que aumentaria os custos de importação e a inflação. Para o Brasil, é crucial adotar uma postura diplomática e pragmática para minimizar impactos negativos na relação bilateral e no mercado econômico global.”
Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio
“A vitória de Trump nas eleições americanas pode gerar impactos significativos para a economia global, com um fortalecimento do dólar e um possível aumento das tensões comerciais, especialmente com a China. Suas políticas protecionistas e de incentivo à indústria interna tendem a valorizar o dólar, o que pode pressionar ainda mais as economias emergentes, incluindo o Brasil. Com o dólar mais forte, os custos de importação aumentam e a inflação tende a subir, o que poderia levar o Banco Central a ajustar suas taxas de juros. Para o Brasil, isso representa tanto oportunidades no aumento das exportações, especialmente de commodities, como desafios, com um possível enfraquecimento do real e uma maior pressão sobre a política monetária interna.”
João Kepler, CEO da Equity Fund Group
“A vitória de Donald Trump nas eleições americanas pode trazer uma série de implicações econômicas globais e oportunidades para o Brasil. Um dólar mais forte pode impactar diretamente economias emergentes, mas também fortalecer as exportações brasileiras, especialmente no agronegócio. Com a postura de Trump em adotar medidas protecionistas e restringir importações da China, o Brasil poderia ganhar competitividade no mercado americano, aumentando suas exportações de commodities e produtos agrícolas. Além disso, a firmeza nas relações com a China pode gerar oportunidades para o Brasil substituir produtos chineses, embora a política econômica americana também possa influenciar a inflação e os juros brasileiros, o que exigirá atenção na condução da política econômica do país.”
Juliana Tescaro, sócia e diretora do hub de soluções financeiras Grupo Studio
“A vitória de Trump nas eleições pode causar grandes transformações na economia global, principalmente com o fortalecimento do dólar e o fortalecimento de políticas protecionistas. Isso tende a aumentar a pressão sobre economias emergentes, como o Brasil, elevando o custo das importações e intensificando a inflação.”
Milton Badan, sócio e diretor da Swiss Capital Invest
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