Em apenas dez anos, o número de empreendedores (entre 18 e 29 anos) no Brasil cresceu 23%. No último trimestre do ano passado, os jovens representavam 16,5% do total de quase 30 milhões de donos de negócios no país. A maioria atuava no setor de Serviços e residia nas regiões Sudeste (41,3%) e Nordeste (23,6%). Outro fato impactante: 91,4% eram empreendedores por “conta própria” (à frente de um empreendimento com ou sem CNPJ, sozinhos ou com sócio, mas não possuem empregados) – e apenas 8,6% são empregadores.
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Os dados são de levantamento realizado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O estudo também revela as principais características do perfil do jovem empreendedor: a maioria é homem, 62,6%,contra 37,4% de mulheres no último trimestre de 2023; A maioria (57,7%) se autodeclara negro (pretos ou pardos) contra 41,3% de brancos.
Quanto ao grau de instrução, 45,5% tinham o Ensino Médio Completo, um incremento de 20 pontos percentuais (p.p) em dez anos; e 25,9% possuem o Ensino Superior Incompleto ou mais, uma alta de 10,7 p.p. na última década. Algo que representa uma forte evolução da escolaridade nessa faixa etária; dedicaram, em média, 37 horas semanais ao seu negócio, contra 40 horas semanais dos adultos (30 a 59 anos), o que pode ser reflexo de contextos mais amplos como a entrada no mercado de trabalho e a divisão do tempo com os estudos. O rendimento médio atingiu o recorde histórico da série no último trimestre de 2023: R$ 2.376.
Para Machidovel Trigueiro Filho (foto), vice-diretor da Faculdade de Direito da UFC, coordenador do Centro de Referência em Inteligência Artificial da UFC (Cria) e eleito o “Empreendedor Digital do Ano no Brasil” pela Associação Brasileira de Startups e a Startup Brasil – existe, de fato, crescimento do empreendedorismo entre jovens e os dados confirmam essa tendência. Cada vez mais os jovens enxergam o empreendedorismo como uma alternativa viável de carreira, impulsionados por mudanças no mercado de trabalho e pelo desejo de maior independência financeira.
No Ceará, programas como o Corredores Digitais têm desempenhado um papel relevante ao capacitar jovens para desenvolverem soluções inovadoras, resultando em startups que enfrentam desafios locais com criatividade e eficiência. A participação de jovens em eventos e premiações nacionais tem crescido, demonstrando seu protagonismo no cenário empreendedor – informa Machidovel Trigueiro.
Entre os jovens empreendedores cearenses, destacam-se setores como tecnologia, educação, sustentabilidade, marketing digital e economia criativa. As edtechs (startups voltadas para a educação) têm se destacado nacionalmente, ao oferecerem soluções inovadoras para a aprendizagem. Além disso, áreas como moda, gastronomia regional e turismo têm atraído considerável interesse, refletindo o potencial cultural e econômico do estado.
Indagado sobre os casos de sucessos entre jovens empreendedores no Ceará, o coordenador do Cria cita, como “exemplo notável”, a startup Lovel, reconhecida entre as 10 melhores do Brasil no setor de Recursos Humanos em 2023. Outra iniciativa de destaque é a startup Mememoria, vencedora do prêmio de Ideia Inovadora do Ano em 2020, promovido pela Associação Brasileira de Startups (ABStartups). Além disso, startups como Urbis e Eduvem figuraram como finalistas do Startup Awards, evidenciando a capacidade inovadora dos empreendedores cearenses.
Machidovel Trigueiro entende que as perspectivas para os jovens empreendedores cearenses são promissoras. Muitos estão alinhados às tendências globais, como a transição digital e o desenvolvimento de negócios sustentáveis. O crescente apoio de programas de aceleração, premiações e o fortalecimento do ecossistema de inovação no estado criam oportunidades robustas para o desenvolvimento de iniciativas inovadoras – ressalta.
A participação em eventos nacionais e internacionais, como o Web Summit Lisboa, é um exemplo do potencial de internacionalização das startups cearenses. No entanto, ele afirma que há necessidade de maior apoio em capacitação e acesso ao crédito, fatores fundamentais para consolidar um ambiente competitivo e inovador.
“Os jovens enfrentam diversos desafios, entre os quais destacam-se o acesso limitado a capital inicial, a burocracia em projetos de captação de investimento e a falta de experiência em gestão. Embora haja programas de apoio, muitos encontram dificuldades para obter financiamento e navegar emprocessos regulatórios. A construção de uma rede de contatos e a obtenção de mentoria são outros obstáculos significativos, que podem ser superados por meio de iniciativas de incubação e aceleração. Equilibrar a inexperiência com a necessidade de tomar decisões estratégicas rápidas é um dos desafios mais comuns.”
Machidovel Trigueiro Filho, vice-diretor da Faculdade de Direito da UFC e coordenador do Cria
Sobre qual avaliação fazia do empreendedorismo, ela afirma que no Brasil tem demonstrado grande resiliência e capacidade de inovação, mesmo em um cenário de desafios econômicos. No Ceará, o crescimento do empreendedorismo é expressivo: em 2023, foram registradas 104.640 novas empresas, sendo 78% delas abertas por Microempreendedores Individuais (MEIs). O estado consolidou-se como o quinto com mais registros de empresas no país, apresentando um aumento de 5,3% no número de registros no segundo quadrimestre de 2023 em relação ao primeiro. Em 2024, os números preliminares indicam um crescimento ainda maior.
É possível observar que existe também uma crescente mobilização de jovens e pequenas empresas em setores como tecnologia, educação, turismo, moda, marketing digital, sustentabilidade e, em menor escala, agronegócio. Fortaleza desponta como um polo de inovação, mas outras regiões, como Cariri, Sertão do Inhamuns, Centro Sul, Sertão de Crateús, Quixadá, Maracanaú, Sobral e Caucaia, também têm apresentado avanços significativos – frisa.
Mas Machidovelalerta que muitas cidades apontam graves deficiências até no acesso à internet por parte da população, sem políticas de inclusão digital e, dessa forma, prejudicando bastante o desenvolvimento econômico da localidade, o que é inadmissível nesses tempos, onde a internet pode vir até via satélite, conectando toda uma cidade e facilitando o EAD (Ensino a Distância), a telemedicina, a gestão pública digital, a eficiência dos processos em geral, beneficiando à população, entre outros.
Para finalizar, ela garante que diversos fatores têm contribuído para o avanço do empreendedorismo, como a simplificação de processos de formalização de empresas e o fortalecimento de programas governamentais e privados de incentivo. No Ceará, o programa Empresa Mais Simples tem sido um exemplo de eficiência, permitindo a abertura de empresas em até cinco minutos. Além disso, o acesso ampliado à tecnologia e o aumento de programas de capacitação têm incentivado novos empreendedores. As ferramentas digitais desempenham papel crucial, ao permitir que pequenos negócios atinjam mercados mais amplos. Programas como incubadoras, aceleradoras e iniciativas educacionais também têm transformado ideias inovadoras em negócios sustentáveis – conclui.
O superintendente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae/CE), Joaquim Cartaxo (foto), está convicto de que o empreendedorismo se inseriu fortemente na agenda da sociedade após a pandemia da Covid-19. Com base na Receita Federal do Brasil, até outubro de 2024 foram abertas mais de 3,7 milhões de empresas no país. Desse total, aproximadamente 96%, ou seja, cerca de 3,5 milhões, são microempreendedores individuais (MEI), microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP).
“Destaco os pequenos negócios como os principais geradores de empregos no Ceará. Segundo o Caged, de janeiro a setembro de 2024, os pequenos negócios geraram 40.408 postos de trabalho, o que corresponde a 73,83% dos empregos criados neste período. Estes números, sempre acompanhados pelo Sebrae, indicam o quanto os pequenos negócios são estratégicos para a economia do nosso estado e do país”.
Joaquim Cartaxo, superintendente do Sebrae/CE
Ele acredita que o empreendedorismo foi impulsionado pela melhoria das condições socioeconômicas, no Brasil e no Ceará, decorrentes do crescimento da economia, da geração de empregos e do aumento do poder de compra das pessoas. Essa melhoria estimula o consumo e gera novas oportunidades para os empreendedores. Os programas governamentais, como o Acredita, do Governo Federal, o Ceará Credi e o Ceará Sem Fome, do Governo do Estado, e o Fortaleza Capacita, da Prefeitura de Fortaleza, todos executados em parceria com o Sebrae, também contribuem para incentivar o empreendedorismo.
Joaquim Cartaxo também cita a desburocratização, a simplificação de processos e a melhoria do ambiente de negócios nos municípios cearenses, a partir da ação integrada do Sebrae/CE, da Junta Comercial e das prefeituras municipais têm favorecido o empreendedorismo em nosso estado. Além disso, há o acesso mais fácil à orientação e ao conhecimento. Ano a ano, o Sebrae/CE amplia suas ações de atendimento, orientações e capacitações, fazendo com que os empreendedores estejam mais preparados para desenvolver a atividade empresarial nas diferentes regiões do Ceará.
Sobre os principais desafios para o jovem empreendedor, Cartaxo afirma que toda pessoa que inicia uma atividade empreendedora enfrenta dificuldades. Porém, os jovens têm a desvantagem no quesito experiência na atividade. De forma geral, o empreendedor mais maduro já trabalhou anteriormente no ramo no qual busca empreender e traz essa experiência acumulada para o negócio. Outra dificuldade é o crédito. Normalmente, o acesso desses empreendedores mais jovens é mais limitado junto às instituições de crédito, talvez pela inexperiência de gestão da empresa.
No entanto, ele chama a atenção para o fato dos jovens, em geral, se mostrarem mais abertos a aprender e têm mais facilidade de buscar informações e orientações, o que são qualidades importantes para quem quer ser um empreendedor. “Para ajudá-los nesta tarefa, o Sebrae/CE tem atuado fortemente com programas de educação empreendedora, desde o ensino fundamental até o nível superior. Assim, buscamos estimular no jovem, desde cedo, o desenvolvimento de comportamentos e atitudes empreendedoras que serão importantes para as suas vidas, seja como empresários, seja em sua profissão, ou mesmo em sua vida pessoal. Estamos formando uma geração de futuros empreendedores”.
A pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM 2023) revela que “Ter o próprio negócio” é o terceiro maior sonho dos brasileiros e que o Brasil tem 42 milhões de Empreendedores (“Iniciais”/“Estabelecidos”) e 48 milhões de “Empreendedores Potenciais”. A pesquisa é um produto da Unidade de Gestão Estratégica e Inteligência do Sebrae Nacional, com apoio da Associação Nacional de Estudos em Empreendedorismo e Gestão de Pequenas Empresas (Anegepe).
O levantamento também mostra que aumentou a proporção de “Empreendedores Nascentes” e que caiu a proporção de “Empreendedores Novos” (parte migrou para “Estabelecidos”). O Brasil continua com a segunda maior estimativa absoluta de “Empreendedores Potenciais” (com 48 milhões), atrás apenas da Índia (com 106 milhões) e se manteve na oitava maior Taxa de Empreendedorismo total (30%). Também constata que entre os Empreendedores “Iniciais” caiu a proporção de mulheres, baixa renda e quem abre “por necessidade”. Aumentou a proporção de homens, pessoas com nível superior, maior renda, os que abrem “por oportunidade” e os que são motivados “para fazer a diferença no mundo”.
Desde sua criação, em 1999, o Global Entrepreneurship Monitor (GEM) tem se destacado como a principal pesquisa global sobre empreendedorismo, revelando tendências, desafios e oportunidades em mais de 110 países. O Brasil, que participa dessa pesquisa desde 2000, continua a ser um dos grandes destaques no cenário internacional.
A pesquisa GEM foi lançada com o objetivo de compreender o papel do empreendedorismo no desenvolvimento econômico e social, mapeando desde as motivações que levam as pessoas a empreender até as condições do ambiente de negócios em cada país. O estudo é realizado anualmente, permitindo uma análise detalhada e comparativa ao longo do tempo. No Brasil, para o ciclo de 2023, a pesquisa entrevistou 2.000 indivíduos da população adulta e 54 especialistas.
De janeiro a setembro de 2024 foram abertas 86.129 empresas no Ceará, das quais 85.096 (98,80%) são micro e pequenas empresas (MPEs). O número representa um crescimento de 4,5% em comparação ao mesmo período de 2023, quando 81.428 MPEs foram registradas, segundo a Junta Comercial do Estado do Ceará (Jucec).
A composição dessas novas MPEs registradas em 2024 revela um panorama diversificado do empreendedorismo cearense. O setor de serviços lidera a abertura de novas empresas, com 54.577 registros, seguido pelo comércio, com 23.484. A indústria contabiliza 7.035 novos negócios.
Para o presidente da Jucec, Eduardo Jereissati, as micro e pequenas empresas não apenas geram emprego e renda, mas também fomentam a inovação e o desenvolvimento social nas comunidades. O crescimento contínuo desses empreendimentos reflete a resiliência e o espírito empreendedor do cearense.
Ele observa que o crescimento expressivo das MPEs é um indicativo não apenas do dinamismo do setor, mas também da confiança dos empreendedores em um ambiente de negócios que, apesar dos desafios, continua a oferecer oportunidades. “As MPEs desempenham um papel vital na economia, contribuindo para a diversidade do mercado e a inclusão social” – ressalta.
E acrescenta que a expectativa é que esse cenário continue a se expandir, com iniciativas de apoio ao empreendedorismo e a promoção de um ambiente favorável para a abertura e manutenção de pequenos negócios, fundamentais para o desenvolvimento econômico do Ceará.
Empreendedorismo: Potencial de transformação além dos negócios