A produção de cacau no Ceará ainda é tímida, sobretudo quando comparada com os grandes produtores nacionais, no caso Pará (com relação à produtividade) e Bahia. Mas tem crescido nos últimos anos, apesar da cultura cacaueira requerer investimentos mais pesados. No entanto, o preço do produto no mercado, nacional e internacional, tem servido de atração para os empresários do agronegócio cearense. Aliás, os números do Instituto Brasileiro de Geografia e estatística (IBGE) no Ceará atestam crescimento do cacau no estado.
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A produção de cacau em 2023 totalizou, segundo levantamento do IBGE, 22 toneladas, das quais nove de sequeiro e 13 irrigado. A estimativa para este ano, tendo outubro como parâmetro, é que vão ser produzidas 161 toneladas, sendo 12 de sequeiro e 149 irrigado, ou seja, 33,33% e 1.046,15% a mais, respectivamente, em relação desempenho do ano passado. Os números, por si sós, já demonstram o interesse pela cultura.
A área colhida em 2023 de cacau foi de sete hectares para o sequeiro e de 16 hectares para irrigado. Para este ano a estimativa é da mesma área para o sequeiro, mas de 57 hectares para irrigado, o que representa aumento de 256,25%. O rendimento por hectare também aumentou: de 1,28 mil quilos por hectare de cacau sequeiro em 2023 para 1,71 mil quilos/há, ou seja, 33,33% a mais. Já no irrigado são esperados 2,61 mil quilos por hectare, elevação de 100%.
O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec/CE), Amilcar Silveira (foto), afirma que a área destinada ao plantio e a produção de cacau no Ceará ainda é pequena. No entanto, ele acredita que existe uma boa perspectiva de o cultivo no estado vir a crescer nos próximos anos e a Federação vai procurar incentivar para que isso venha acontecer.
Silveira esteve há duas semanas, no Baixo Acaraú, no município de Marco, onde existem mais plantações de cacau irrigado (entre coqueiros). Ele acredita que o Ceará tem todas as condições de aumentar significativamente a produção de cacau. Ele afirma que existe umas uma perspectiva muito grande, e que a Faec, inclusive, vai incentivar o plantio de cacau, que passa por um momento muito bom, com preço em torno de R$ 60 reais por quilo de amêndoa.
“Nós queremos, nos perímetros irrigados no Ceará, agregar valor. Assim, quando você pode ter um produto que permite a pessoa faturar mais por hectare, é ótimo. E o cacau vem para suprir essa necessidade. Ainda são pequenas produções de cacau, mas espero que possa crescer e vamos fazer de tudo pra que isso ocorra. Nós queremos incentivar produtos e agregar valor. E o cacau pode ser uma dessas oportunidades.”
Amilcar Silveira, presidente da Faec/CE
Empresário investe no plantio de cacau
O empresário do agronegócio cearense Altamir Martins (foto), proprietário e CEO da AGM Crops, tem uma plantação de 15 hectares de cacau em Acaraú e está em outra área de plantio em curso de dez hectares. Na região de Acaraú está se desenvolvendo um dos polos de produção de cacau fora das áreas tradicionais. Ele explica que, tradicionalmente, o cacau era plantado em zonas úmidas, tanto no Brasil como em outros países, geralmente num sistema agroflorestal e consorciado com outras culturas e mesmo florestas.
No entanto, aquele modelo, devido à incidência de doenças e questões climáticas, tem mudado nos últimos cinco anos, pois se tem verificado uma tendência de migração pra zonas chamadas não tradicionais. No Brasil, por exemplo, o cacau vem sendo plantado em Mato Grosso, no Ceará, no Oeste baiano, na região do Serrado, e em São Paulo, fugindo exatamente desses modelos tradicionais, que tem se mostrado muito deficitários e com baixas produtividades.
“Aqui nós estamos trabalhando num modelo que a gente acredita ser muito adequado para cá. A gente está adotando um sistema adensado de plantio. Estou consorciando com coqueiros que já tem 25 anos ou mais de idade porque tem uma grande penetração de sol. É um engano, um erro, se pensar que cacau precisa de sombra. Não, de jeito nenhum. Nessas zonas não tradicionais o cacau está sendo plantado cada vez mais a pleno sol. E com excelentes performances. No meu caso aqui como eu já tenho a área com coqueiro e já está com a área bem avançada, a ideia é plantar dentro dos coqueiros e daqui provavelmente uns cinco anos faço a supressão do coqueiral e deixo o cacau a pleno sol. Esta é uma ideia.”
Altamir Martins, proprietário e CEO da AGM Crops
Ele adianta que o seu plantio de cacau ainda é novo, mas está começando a produzir este ano. “A gente aqui no Ceará teve muito problema com a qualidade de mudas compradas. Por essa razão, resolveu produzir as próprias. Então, hoje eu estou produzindo mudas tanto pra meu uso como também comercialmente. O viveiro é devidamente cadastrado no Ministério da Agricultura pra produção de mudas fiscalizadas, certificadas, com comprovação de origem do material genético fornecido. É um viveiro que está todo dentro dos padrões técnicos de aceitação normativas”.
A produção de mudas tem dado tão certo, que Itamar Martins está comercializando até pra fora do Ceará. A muda é mais aclimatada na região, com algumas técnicas para se contrapor aos ventos (a cultura não tolera ventos fortes). “Não dá para a gente fazer um cultivo de cacau com mudas das regiões úmidas, do Sul da Bahia, da Amazônia, e plantar no Ceará sem fazer adaptações necessárias. E isso aprendemos ao longo dos últimos três anos aqui” – ressalta.
O principal desafio da cultura do cacau diz respeito aos custos, que são elevados, algo em torno de R$ 35 mil por hectare, mas, mesmo assim, o Ceará já tem entre 180 mil e 200 mil mudas plantadas. O potencial do Ceará para a cultura é enorme, como também de outros estados no Nordeste e no Centro-Oeste. Isso devido a uma demanda por cacau insatisfeita.
Cacau é uma commodity cotada em bolsa de valores e os maiores produtores são países da África (Costa do Marfim e Gana, que respondem por cerca de 60% da produção mundial). No entanto, essas plantações estão em franco declínio, quer seja pelo modelo de produção ou pela questão climática. Com isso, novas frentes foram abertas e o Brasil está plantando muito acelerado, sobretudo na região Centro-Oeste. “Brasil está caminhando a passos largos para, em breve, recuperar o posto que conquistou no passado: de maior produtor mundial”.
O Ceará tem um “potencial muito grande” para produzir cacau, principalmente na região litorânea, que tem clima seco, ventilado, chuvoso, mas bem drenado (solos), condições adversas para agentes patogênicos causadores das principais doenças do cacau. “Aqui temos uma logística muito boa. E temos essa possibilidade de plantar inicialmente entre coqueiros mais antigos, que é também uma vantagem econômica que pode ser explorada no primeiro momento. Mas o cacau de pleno sol já está sendo testado e com excelente performance”, afirma Altamir.
Para concluir, ele frisa que o Ceará só precisa para crescer na produção de cacau do apoio com tecnologia, o que “temos solicitado das autoridades do Governo do Estado, bem como o treinamento na cadeia do cacau. Precisamos de apoio institucional para que tragam consultores de renome para treinamento, fábricas escolas de beneficiamento. A partir daí as empresas âncoras vão crescendo, gerando autoconhecimento interno e as coisas tomam rumo. Mas precisamos ter uma ação inicial mais forte das autoridades governamentais, com apoio, sobretudo aos médios produtores que querem entrar no segmento. O cacau não é uma atividade fácil, pois requer muita tecnologia”.
Setor no Brasil representa R$ 23 bilhões
O mercado do cacau vem ganhando novo fôlego nos últimos anos, segundo a Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC) que foi formada pelas empresas Barry Callebaut, Cargill e Olam, mas que este ano passou por ampliação com uma nova associada, a IBC. Essas empresas, juntas, representam aproximadamente entre 93% e 95% da compra e moagem de cacau no Brasil, respectivamente. O setor responde por mais de 4.000 empregos diretos e indiretos e é um dos elos de uma cadeia de mais de 120 mil pessoas, incluindo produtores rurais e indústrias de chocolate. No total, é estimado que esse setor represente R$ 23 bilhões anuais de valor gerado ao país.
A Associação Nacional dos Produtores de Cacau (ANPC), em publicação recente, garante que o Brasil já produz o suficiente para o consumo interno. Em 2023 foram colhidas 290 mil toneladas, segundo o IBGE. O Pará é o maior produtor (em relação à produtividade), junto com a Bahia. Mas existe produção também em Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Tocantins e São Paulo. Já a entidade que representa as indústrias afirma que elas receberam 220 mil toneladas de cacau brasileiro em 2023 e, por isso, 40 mil toneladas foram importadas.
Governo Federal lança plano Inova Cacau 2030
Para consolidar o Brasil como uma referência de origem de cacau sustentável para o mundo, com foco na conservação produtiva e garantindo a melhoria das condições de vida e trabalho em toda a cadeia, o Governo Federal, por intermédio do Ministério da Agricultura e Pecuária, através da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira, juntamente com a iniciativa privada representada pelo CocoaAction Brasil, elaborou de forma participativa e colaborativa o Plano Inova Cacau 2030. Vale observar que o Brasil já esteve no topo dos países com a maior produção de cacau do mundo, com volume médio de 400 mil toneladas/ano, respondendo por 25% da produção mundial.
O Plano tem como base quatro eixos: Econômico-produtivo, que objetiva aumentar a eficiência produtiva da cacauicultura brasileira e a renda dos produtores; Social, como melhorar as condições de trabalho e a organização social dos produtores; Ambiental, para promover a cultura com alternativa de recuperação das áreas antropizadas e modelos de conservação produtiva e coibir o desmatamento ilegal; e Governança, para garantir a gestão e o monitoramento do plano, engajando os diferentes elos da cadeia e maximizando o alcance das metas propostas.
Segundo o Plano, o aumento da produção de cacau é estratégico para o País, único entre os países produtores que possuem todos os setores da cadeia de valor do cacau e chocolate, que engloba as unidades produtoras, as moageiras e as chocolateiras, possibilitando a geração de divisas pela ampliação da exportação de chocolates e derivados, bem como a retomada das exportações de amêndoas.
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