Fonte de prevenção de doenças e sinônimo de vida saudável, os alimentos classificados como funcionais e saudáveis geraram enormes oportunidades de negócios, especialmente a partir da pandemia. Trata-se de um mercado que vem crescendo em média 12% ao ano no Brasil, conforme dados da Brasil Food Trends, incluindo desde os produtos sem glúten até os orgânicos. São nichos que começam a ser explorados com maior força porque passaram a ser consumidos não só pelo público denominado como intolerante. Levantamento da consultoria Euromonitor Internacional estima um crescimento de 27% até o fim de 2025.
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Os intolerantes ao glúten, conhecidos como celíacos, são os que mais demandam alimentos especiais em função da proteína encontrada no trigo, no centeio, na aveia, na cevada e no malte. A doença, segundo estudos, acomete de 1 em cada 50 até 1 em cada 300 pessoas na população ocidental. A intolerância à lactose é outra condição que afeta quase 70% da população mundial, o que abre enormes oportunidades para os agentes deste segmento.
Os vegetarianos (14% da população, segundo o Ibope Inteligência), é outro negócio em expansão, porque alcança também o público não vegetariano. Já segmento vegano é um nicho especial porque engloba pessoas com restrições alimentares ainda maiores, com dietas que transcendem a carne e inclui todos os produtos de origem animal. Dados do The Good Food Instituto apontam que quase 60% dos brasileiros já consomem alternativas vegetais aos produtos de origem animal.
Há, também, os produtos orgânicos consumidos por aqueles que querem preservar a biodiversidade e, por isto, evitam qualquer tipo de agrotóxico, fertilizante sintético ou organismos geneticamente modificados. Parece que há avanços. Basta saber que o número de produtores orgânicos cadastrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) passou de 5,9 mil em 2012 para 25,4 mil produtores no último ano.
E tem, ainda, o mercado fitness, onde a dieta saudável se associa à prática de alguma atividade física em busca de mais saúde e corpo perfeito. Além disto, há que se considerar que a tendência de consumo começa a alcançar outros setores, tais como cosméticos, produtos de limpeza e maquilagens. Qualquer que seja a classificação, o jeito saudável de se alimentar está virando um hábito que transcende as restrições alimentares.
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Mais do que eventuais modismos, os hábitos alimentares sinalizam mudanças. Para Danielle Costenaro (foto), gerente de Biotecnologia e Germoplasma na CropLife Brasil, a biotecnologia desempenha um papel fundamental no desenvolvimento de alimentos funcionais, que oferecem benefícios à saúde além da função nutricional básica. Entre os benefícios, ela cita a fortificação e enriquecimento. Por meio da engenharia genética, é possível aumentar os níveis de nutrientes essenciais, como vitaminas e minerais, em cultivos básicos, como os do arroz dourado, rico em vitamina A, e variedades de soja enriquecidas com ácidos graxos e ômega-3.
Ela acrescenta que a biotecnologia permite a criação de plantas que produzem compostos com propriedades antioxidantes, antiinflamatórias ou até mesmo terapêuticas, e que culturas geneticamente modificadas podem ser ajustadas para atender a necessidades de saúde, como redução de alérgenos ou menor teor de glúten, ampliando o acesso a dietas especiais.
Desafios e limitações
Embora a biotecnologia seja promissora, há desafios a serem vencidos, conforme a Croplife Brasil, a começar pela aceitação pública, dada a resistência de consumidores a alimentos biotecnológicos, embora a regulamentação seja complexa e demorada para garantir segurança, exigindo décadas de pesquisa para serem comercialmente viáveis e integradas aos sistemas agrícolas. “No Brasil, o uso de transgênicos evitou a necessidade do plantio de 21,4 milhões de hectares adicionais nos últimos 25 anos”, ilustra Danielle. Neste mesmo período, por conta da biotecnologia, a redução de emissões de gases do efeito estufa chegou a 70,4 milhões de toneladas de CO², o que equivale ao plantio de 504 milhões de árvores nativas.
A mesma biotecnologia, segundo a Croplife, atua sobre o controle de pragas e doenças, eficiência hídrica e energética e uso mais eficiente de herbicidas menos tóxicos, reduzindo a quantidade necessária e o impacto ambiental.
Funcionais protagonistas
Em um mundo cada vez mais focado em saúde e bem-estar, os alimentos funcionais emergem como protagonistas no cenário da nutrição moderna. E encontram um consumidor em busca de produtos que ofereçam benefícios específicos para sua saúde digestiva, imunológica ou de controle de peso. Para o especialista Ary Bucione (foto), líder da consultoria NutriConnection, que acompanha este mercado e produz um relatório anual sobre tendências alimentares, a personalização é cada vez mais forte, o que leva as grandes marcas a adotarem ingredientes focados em funções como prebióticos, probióticos e fibras flexíveis.
E as inovações não são apenas globais, mas a partir de ingredientes regionais. Segundo Bucione, no Brasil, produtos alavancam superalimentos locais, ricos em antioxidantes e fibras, enquanto marcas internacionais estão focadas em ampliar o portfólio de produtos funcionais com ingredientes inovadores e reconhecidos globalmente.
Engenheiro de Alimentos com mais de 40 anos de atividades em grandes corporações, Ary Bucione diz que a biotecnologia, como sugere o nome, é a “tecnologia da vida”. Ele lembra que desde a década de 80, inúmeros avanços científicos foram registrados na produção de alimentos funcionais, incluindo ingredientes com princípios ativos que, além de contribuir para uma melhor nutrição e fisiologia, propiciam uma vida mais saudável e equilibrada. “Além de melhorar a produção agrícola, seu transporte e vida mais longa, vem contribuindo para garantir a segurança alimentar”, afirma.
Criação de consciência
Para Edmar Mothé, CEO da Bio Mundo, rede de franquias de produtos naturais e alimentação saudável, de alguns anos para cá, o público criou e permanece criando consciência dos impactos positivos que uma alimentação equilibrada exerce em sua vida. “Isso alavancou o mercado, refletiu no país como um todo e diretamente no meio das franquias que trabalham com alimentação”, declara. Com mais de 150 lojas em 19 estados do Brasil, a Bio Mundo vendeu mais de R$225 milhões em 2023, um crescimento de mais de 20% em relação ao ano anterior, superando as metas.
Outra sinalização que remete à busca de alimentos saudáveis vem da International Fresh Produce Association (IFPA). Segundo Valeska de Oliveira Ciré, country manager da IFPA, a expectativa para 2025 é fortalecer a cadeia produtiva e explorar novas oportunidades para atender às demandas do mercado e dos consumidores. Para 2025, a entidade planeja intensificar ações voltadas à redução de desperdício, aumento do consumo e combate à fome. “Nosso papel como observadores da ONU para impactos climáticos no setor reforça a responsabilidade com o meio ambiente”, disse, lembrando que 94% dos produtores relataram queda na produtividade devido às condições extremas.