Com ganhos expressivos em área plantada, produção e valor, o Ceará fecha 2020 fortalecendo o renascimento da cultura algodoeira no Estado. De janeiro a outubro deste ano, mês em que começa o vazio sanitário e segue até dezembro, foram 3.237 hectares plantados, 5.475 toneladas colhidas e aproximadamente R$ 11,6 milhões em receita com o cultivo do algodão, contabilizando crescimento de 11% e surpreendentes 46% e 60,4%, respectivamente, na comparação com igual período do ano passado.
Os resultados são os melhores dos últimos dez anos nas três categorias e correspondem à terceira safra do insumo desde que começou o Programa de Implantação da Cultura do Algodão no Ceará, em 2018.
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A iniciativa é tocada pela Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico e Trabalho (Sedet). No entanto, é fruto de uma parceria entre o Governo do Ceará, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará (Ematerce), Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Ceará (Adagri), Instituto Centro de Ensino Tecnológico (Centec), Instituto Federal do Ceará (IFCE), secretarias municipais de agricultura, instituições financeiras, representantes dos produtores e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Na mira do Programa está recolocar o Estado entre os maiores produtores de algodão do País. Para se ter uma ideia, na década de 1970, chegou-se a 1.300.000 hectares cultivados em território cearense, revelando o potencial da cultura algodoeira para a economia estadual. Posição perdida há mais de três décadas, com a devastação que o bicudo provocou nas plantações, fazendo com que muitos produtores abandonassem o cultivo.
Porém, hoje, destaca Euvaldo Bringel, coordenador do Programa, “com sementes selecionadas desenvolvidas por meio da pesquisa, tecnologia, manejo moderno, assistência técnica, capacitação dos produtores, aproveitamento da infraestrutura de irrigação do Estado, apoio governamental e incentivo de grandes indústrias têxteis, foram lançados os novos alicerces para a retomada e o desenvolvimento sustentável da produção do algodão no Ceará ao longo dos próximos anos”.
“A vocação do Ceará para o cultivo do algodão é inquestionável. Temos clima e solo propícios, assim como não falta mercado para os produtores”, garante.
Conforme disse, embora a área plantada e a produção tenham diminuído drasticamente por conta do bicudo, as indústrias de fiação e tecelagem atraídas para o Ceará, quando do auge da cultura algodoeira, permaneceram em operação, demandando, até hoje, grandes quantidades da matéria-prima.
“Nesse sentido, o Ceará migrou de grande produtor nacional para um dos maiores importadores de algodão do país, a fim de abastecer a sua indústria têxtil. Dessa forma, mercado não falta. Obviamente que tendo o algodão produzido aqui, próximo a essas indústrias, com frete mais barato, torna-se mais vantajoso comprar dos produtores cearenses”, justifica Bringel, sempre reforçando a articulação, organização e apoio a esse mercado, abrindo, por sua vez, novos caminhos e oportunidades de investimento.
Avanço da área plantada: projeções para 2021
O cultivo do algodão no Estado nos últimos três anos, desde que o Programa de Implantação da Cultura do Algodão no Ceará foi implantado, tem avançado por vários municípios.
“No primeiro ano do Programa, em 2018, retomamos a produção de algodão no Ceará, iniciando os testes por Quixeramobim e Quixadá, na região Central. Já no ano seguinte, em 2019, entramos no Cariri, hoje a maior área plantada. Ao passo que em 2020, avançamos para a Chapada do Apodi, na divisa com o Rio Grande do Norte, onde pelo lado do Ceará temos os municípios de Alto Santo, Jaguaruana, Limoeiro do Norte, Quixeré e Tabuleiro do Norte”, relata Bringel.
No que diz respeito à Chapada do Apodi, grande produtora de melão, ele destaca que os testes e a introdução do algodão na região poderão representar a cultura ideal para ocupação do solo nos meses de julho a dezembro, quando não chove no local e ocorre a entressafra dessa fruta. “São terras irrigadas, capazes de cultivar algodão com alta produtividade e rentabilidade”, avalia.
Já em 2021, emenda o coordenador do Programa, a expectativa é de avançar plantando algodão em Solonópole, Iguatu, Crateús e na região da Ibiapaba. De acordo com Bringel, esse aumento no cultivo em mais localidades do Ceará deverá gerar um acréscimo próximo a 70% na área plantada se comparado a 2020, alcançando 5.500 hectares, e um aumento de 12% a 15% na produtividade.
Vazio sanitário como defesa
Ao lado das condições naturais favoráveis, uso intensivo de tecnologia, fortalecimento da logística e capacitação dos produtores, o Ceará também vem apostando na adoção do vazio sanitário, no sentido de voltar a ser um dos protagonistas da cultura algodoeira no Brasil. Esse procedimento agronômico proíbe a existência de plantas vivas de algodão em campo, quer sejam cultivadas ou de germinação espontânea, no período em que é adotado.
A iniciativa tem como objetivo reduzir a população do bicudo-do-algodoeiro, principal praga de importância econômica para a lavoura e acontece anualmente de 1º de outubro a 31 de dezembro, o que limita o cultivo do algodão aos meses de janeiro a setembro.
A sua adoção foi estabelecida pela Adagri por atos normativos através da Portaria n°22, de 27 de Fevereiro de 2020, estabelecendo medidas fitossanitárias para prevenção e o controle da praga bicudo-do-algodoeiro, fixando os critérios para o cultivo de algodão no Ceará.
Garantia de comercialização
Outro ponto que favorece a retomada da produção de algodão no Estado, frisa Euvaldo Bringel, é a garantia de comercialização da matéria-prima pelas grandes indústrias têxteis aqui instaladas. De acordo com ele, com o intuito de estimular a expansão da produção no Ceará, algumas empresas, a exemplo da Santana Textiles, com sede em Horizonte, fornecem o serviço de colheita mecanizada e garantem a compra de toda a produção por um preço fixo durante todo o ano. “O que hoje seria de R$ 2,15, o quilo do algodão em caroço. Em 2019, o valor era de R$ 2”, fala.
O que pensa o produtor
Raimundo dos Santos, mais conhecido como Alemão, baseado em Limoeiro do Norte, é um dos 324 produtores da região do Baixo Jaguaribe, que apostaram no Programa de Implantação da Cultura do Algodão no Ceará. Em 2020, ele perdeu o medo do bicudo e resolveu plantar 50 hectares de algodão, o que lhe rendeu uma produção, na primeira safra, de 3.150 kg da matéria-prima.
“A produção de algodão na região do Baixo Jaguaribe estava parada. A plantação havia sido devastada pelo bicudo. Porém, ao participar do Programa de Implantação da Cultura do Algodão, hoje sabemos os controles, temos acompanhamento, contamos com sementes selecionadas, máquinas para a colheita e a garantia de comercialização da produção”, comemora.
Conforme disse, “plantar algodão voltou a ser vantajoso no Ceará, tanto que em 2021, provavelmente, vamos repetir no mínimo a mesma área plantada. Mas ainda estamos aguardando as previsões de chuvas para o próximo ano”. Na sua avaliação, com o Programa de Implantação da Cultura do Algodão, a tendência é que, em mais alguns anos, o Ceará volte a produzir como antes.
Novos negócios para o Ceará
Entretanto, as oportunidades proporcionadas pelo renascimento da cultura algodoeira na economia cearense não se limitam à crescente demanda da pluma de algodão, matéria-prima para a indústria têxtil. Ainda segundo Bringel, o aproveitamento do caroço do algodão abre espaço para novos negócios no Estado.
“O resíduo do caroço de algodão serve de alimentação para o gado. Atualmente, somos uma das maiores bacias leiteiras do país, resultando em um mercado em potencial para o beneficiamento desse subproduto a ser aplicado na nutrição animal. Ao mesmo tempo, a partir do caroço da oleaginosa também é possível produzir o óleo de algodão”, explica.
A saber, o óleo de algodão surge como alternativa aos óleos tradicionais, como de soja, milho, girassol e canola. Dessa forma, poderia atrair indústrias interessadas na sua fabricação no Ceará, mediante o avanço da cultura algodoeira. “A revitalização do plantio de algodão no Ceará poderá trazer muitos reflexos positivos para a economia estadual”, conclui.